O economista Filipe Charters de Azevedo, recém-nomeado presidente da Associação Portuguesa de Contribuintes (APC), classifica o Orçamento do Estado para o próximo ano (OE2025) como “um orçamento stop loss“, desenhado para “parar as dificuldades” do país.
“Estávamos numa rota de degradação de serviços públicos. A ideia é que haja uma paragem dessa tendência”, analisou, numa conversa com o Jornal Económico (JE) sobre o OE2025 e, também, sobre o cargo que agora ocupa, em substituição de Paulo Carmona.
Entre os “vários” problemas em torno do OE, Filipe Charters de Azevedo destaca um: “Discutimos sempre as pequenas medidas, as pequenas reduções fiscais e a imensa virtude doutrinária que está por detrás de cada uma das opções”.
Ao JE, o economista distingue o que “espera” do que “sonha” no campo da carga fiscal que recai sobre famílias e empresas. “O que espero é a discussão de pequenos números que acabam por não permitir uma reforma”, disse. “Há uns anos, em Covid e com a aviação parada, um dos partidos sugeriu uma penalização sobre a aviação. Outro, após a ruptura dos stocks das bicicletas, propôs um apoio municipal para a promoção das bicicletas”, recordou.
Mas o que sonha, como quem diz o que seria o desejável para o país, aponta para outra visão. “Em primeiro lugar, discutir os impostos como o preço a pagar pelos serviços públicos e pelos serviços públicos que podemos ter. Qual a taxa de esforço que queremos enquanto sociedade. Essa visão serviria para balizar a receita e promover a ação. Em segundo lugar, debater quais os impostos que podemos suportar e quais estão a penalizar o crescimento e a aumentar a desigualdade”, defendeu o sócio fundador da Agência de Subscrição e Modelização de riscos agrícolas Safe-Crop.
“Um orçamento é uma medida de controlo de gestão. Mas podia e devia ser de planeamento sobre o Estado que queremos e das reformas que vamos empreender para lá chegar. Vamos ver se é desta”, acrescentou.
Sobre o incontornável tema do IRS Jovem, numa conversa sobre questões fiscais, Filipe Charters de Azevedo entende que “uma forma eficiente de beneficiar os jovens” – que não têm grandes despesas de saúde ou educação e, nesse sentido, pagam mais IRS por não poderem fazer essas deduções em pleno – “seria propor uma baixa generalizada do IRS para a taxa efetiva (algo que a direita aprovaria), eliminando ao mesmo tempo as deduções e outras reduções de IRS (o que a esquerda desejaria, dado que acredita que as deduções promovem os serviços privados)”. “Ou seja, tirávamos uma parte do dirigismo fiscal ou focávamos esse dirigismo para os mais novos”, explica.
“As contas são fáceis de fazer e já estão feitas pela autoridade tributária. Era apenas aplicar as taxas efetivas que o próprio Governo coloca nos diferentes escalões de rendimento. Não haveria também perda de receita”, continuou.
Mas também haveria “perdedores”, atirou. “Quando falamos de médias, há quem esteja acima da média e quem está abaixo. Mas com a progressividade existente, os ganhos e as perdas far-se-iam dentro do mesmo escalão de rendimento. Eventualmente alguns dos mais velhos e alguns doentes, que passariam a pagar mais, necessitariam de um apoio especial. No entanto, seria mais simples acudir a esses casos específicos do que manter um sistema de deduções como temos atualmente. Os serviços privados também podem perder, mas teriam de competir menos pelas deduções e mais pelo serviço. Não perderão necessariamente. Há também a excepção sobre a venda de empresas de PME. Mas essa reforma tem de ser compatível com a reforma de IRC. Pelo que deixaria a margem desta questão”, analisou.
“O que saliento é que é possível beneficiar os jovens sem saltos de idade e usando a mesma filosofia atual”, afirmou, retirando esta questão, contudo, das lista de prioridades.
A terminar a análise, Filipe Charters de Azevedo diz que “há, no entanto, uma coisa boa em relação a esta discussão”. “Até agora a única discussão sobre a equidade recaía sobre como apoiar os mais velhos e numa política de redistribuição dos ativos para os inativos. Com esta discussão, chegamos à conclusão de que se calhar estamos a abusar dos mais novos. E isso é de alguma forma refrescante”, afirmou.
Sobre a Associação Portuguesa de Contribuintes, nascida no ano passado para “ser a representante dos contribuintes portugueses na sua relação com o Estado”, Filipe Charters de Azevedo debruçou-se sobre o papel da mesma.
“O objetivo é tornar a associação ainda mais virada para fora. Queremos trabalhar para, a prazo, estarmos em três frentes: na Assembleia da República com petições e audiências; na concertação social já que somos, a par dos consumidores, a única associação verdadeiramente transversal; e, quando for necessário, no tribunais através de um fundo judicial”, explicou.
“Faço notar que queremos ser, como fomos até agora, sempre construtivos – faz parte do ADN da associação. Tudo isto vai levar tempo. E temos de andar depressa”, sublinhou.
Paulo Carmona, em tempos parte da direção da Iniciativa Liberal e presidente do Fórum de Administradores e Gestores de Empresas, apresentou a renúncia ao cargo da APC após ter sido nomeado diretor-geral de Energia e Geologia.