O município de Miranda Douro pondera avançar com uma ação contra o Estado se caducar o Imposto Municipal sobre Imóveis (IMI) de 2019 referente às barragens de Miranda e Picote, que fazem parte das seis barragens vendidas pela EDP ao consórcio francês que ficam no rio Douro por 2,2 mil milhões de euros. A revelação foi feita ao Jornal Económico pelo vereador do município de Miranda Douro Vítor Bernardo, a poucos dias do fim de dezembro data até à qual a AT pode liquidar o IMI relativamente aos quatro anos anteriores. Na mira da autarquia está uma ação civil e criminal contra a administração fiscal por esta caducidade.
“Estamos a pouco dias do fim do ano e antecipo que vai caducar o direito à liquidação do IMI do ano 2019. Se caducar, o município reserva-se ao direito de avançar com uma ação, civil e criminal, contra o Estado por culpa e inação de quem tem a relação contratual de entregar os impostos ao município que é a Autoridade Tributária”, revelou ao JE o vereador do município de Miranda Douro Vítor Bernardo.
Segundo este responsável, além do risco de caducar o IMI das barragens de Miranda e Picote referente a 2019, soma-se o risco do IMI referente aos anos seguintes também não vir a ser pago. Isto porque, explica Vítor Bernardo, na sequência das avaliações das barragens, que, diz, “seguiu fielmente as instruções ilegais da AT, não é uma avaliação de barragens, ou de centros eletroprodutores como lhe chama a lei”.
Segundo o autarca, a Câmara foi notificada do valor da avaliação – que aponta para 52 milhões de euros, que compara com avaliações de 230 milhões pedidas pelo município - há poucos dias e o que foi avaliado “não é um prédio, mas uma ficção”, porque é feita uma avaliação de centros de produção hidroelétrica apenas compostos por betão armado e alvenaria, portanto, sem capacidade para produzir energia.
Vítor Bernardo explica aqui que “os prédios têm de ter valor económico e produzir rendimento para se pagar IMI. Ora, se é feita uma avaliação apenas à parte estrutural sem ter em conta os equipamentos, não dá lugar ao pagamento do IMI”. O responsável diz, por isso, que não só está em causa o não pagamento do IMI de 2019 que está prestes a caducar, mas também nos anos seguintes com base nestas avaliações recentes da AT.
É neste contexto que, no início deste mês, o município de Miranda do Douro anunciou que vai pedir à Procuradoria-Geral da República (PGR) uma “investigação rigorosa” ao “ilegal comportamento da Autoridade Tributária (AT)” na avaliação das barragens de Miranda e Picote, localizadas no concelho.
Movimento da Terra de Miranda alerta para perda de 22 anos de receita de IMI
O Movimento Cultural da Terra de Miranda (MCTM) garantiu no final de novembro que o direito à liquidação de IMI sobre o negócio da venda das seis barragens transmontanas referente a 2019 vai caducar, perdendo-se 22 anos de receitas deste imposto.
O MCTM indicou ainda que passaram quase 10 meses desde que o Secretário de Estado dos Assuntos Fiscais deu ordens à Diretora-Geral da Autoridade Tributária (AT) para cobrar o IMI sobre as barragens e até hoje, nada aconteceu, tal como passaram três meses sobre o segundo despacho do mesmo secretário de Estado a mandar cumprir o primeiro despacho.
O movimento recorda ainda que passaram 18 anos desde que um parecer da Procuradoria-Geral da República (PGR) estabeleceu, com caráter vinculativo, que as barragens devem pagar IMI.
Recorde-se que a AT só pode liquidar o IMI relativamente aos quatro anos anteriores, pelo que a partir de 31 de dezembro, já não o poderá fazer relativamente ao ano 2019.
“Nesse dia caduca o direito da AT a liquidar este imposto, pelo que os contribuintes, neste caso a EDP fica definitivamente dispensada do pagamento”, alertou o MCTM.
Segundo o MCTM, a impossibilidade de liquidação do imposto até ao final do ano advém de as avaliações das barragens ainda não terem sido efetuadas e que essas têm ainda de ser notificadas às concessionárias e aos municípios, sendo que, será ainda necessário esperar 30 dias para que as entidades notificadas possam apresentar reclamação.
O movimento diz ter alertado para o risco de caducidade as entidades que auditam e fiscalizam a legalidade da ação da AT, em especial o Tribunal de Contas e a Inspeção-Geral de Finanças, até agora sem resultados.
“Pedimos também à PGR que investigasse estes graves indícios”, vincam os membros que integram o MCTM.
A vertente fiscal das barragens saltou para a agenda mediática na sequência da venda pela EDP de seis barragens em Trás-os-Montes (Miranda do Douro, Picote, Bemposta, Baixo Sabor, Feiticeiro e Tua), por 2,2 mil milhões de euros, a um consórcio liderado pela Engie.
Avaliação da generalidade das barragens está concluída, garantem as
O secretário de Estado dos Assuntos Fiscais, Nuno Santos Félix, disse nesta terça-feira, 19 de dezembro, ter informações da AT de que a avaliação da generalidade das barragens para efeitos de IMI já está concluída.
"A última informação que recebi da AT sobre esta matéria […] vai no sentido de ter sido concluída a avaliação da generalidade das barragens", disse Nuno Santos Félix, ouvido nesta terça-feira na Comissão de Orçamento e Finanças na sequência de um requerimento potestativo do PSD.
Esta informação reporta-se à situação relativa ao final de novembro, disse o governante, precisando que os sujeitos passivos visados (concessionárias) e os municípios estarão agora "a exercer os seus direitos de defesa nesta matéria", designadamente pedindo segundas avaliações ou recorrendo a outros mecanismos de contestação previstos na lei, nomeadamente recorrendo para os tribunais.
A audição, pedida pelo PSD, visa ouvir o secretário de Estado sobre eventual aumento do IMI, tendo os sociais-democratas avançado para um requerimento potestativo após o PS ter chumbado o requerimento original.
O tema da avaliação das barragens foi levado para a audição pelo deputado do PCP Duarte Alves que questionou o secretário de Estado sobre se havia meios para impedir os concessionários das barragens avaliadas de recorrerem aos tribunais arbitrais em caso de contestação da avaliação.
Nuno Santos Félix salientou que o ordenamento jurídico não permite distinguir os contribuintes na utilização dos meios que lhes dá, notando que em termos de valor dos processos, e relativamente aos dados de 2023, a AT venceu em 50,3% dos montantes que estavam a ser disputados em tribunal arbitral.
Já a questão relativa à possibilidade de o processo ser concluído a tempo de ser cobrado o IMI de 2019 e 2020 não teve resposta.