E se dentro de três anos o mercado imobiliário estivesse dividido ao meio entre compra e arrendamento? Em declarações ao Jornal Económico, Claude Kandiyoti, CEO da Krest Investments, acredita que sim, que é possível a entrada do segmento built to rent em Portugal neste espaço temporal.
“Não sabemos se o mercado de arrendamento será ou não limitado a 2%, mas, eventualmente, por causa da falta de capacidade para comprar, e porque as pessoas continuam a precisar de casa, o mercado vai transformar-se num mercado de arrendamento para construir ou comprar para arrendar. O mercado está a mudar e dentro de dois, três anos provavelmente irá mover-se dos atuais 70% para compra e 30% para arrendamento, para os 50% – 50% em termos de arrendamento versus compra”, afirma. Outros especialistas em imobiliário portugueses, no entanto, discordam desta visão. Uns totalmente e outros, sobretudo, no prazo.
A mudança para o segmento de arrendamento é algo que Claude Kandiyoti assume já ter previsto, apesar de frisar que o mercado de arrendamento ainda não está pronto por não haver produto suficiente para arrendar. Mas qual dos segmentos será mais acessível para os portugueses? Construir para arrendar ou comprar para arrendar? “Não é uma questão de ser ou não acessível. Há um grande fosso hoje em Portugal entre as pessoas que têm dinheiro e as pessoas que não têm dinheiro. E no final do dia, todos precisam de uma casa. O que queremos fazer é criar mais habitação”, afirma o CEO da Krest.
Promotores nacionais acreditam no built to rent, mas nunca em menos de dez anos
O segmento built to rent é visto com bons olhos por parte dos especialistas do sector ouvidos pelo JE, mas a maioria acredita que esta realidade prevista pelo promotor belga será viável, mas nunca num prazo inferior a dez anos. “Não acredito nisso [dos 50-50 em três anos]. Com o enquadramento legislativo que conhecemos e com as perspetivas para um futuro próximo, se chegarmos aos 50% – 50% é algo que levará no mínimo dez anos”, afirma Pedro Vicente, CEO da Overseas.
O responsável salienta que tendo em conta as novas gerações o built to rent é um movimento real e que faz sentido para Portugal, mas que a falta de condições para a produção de habitação para arrendamento vai dificultar esse objetivo. “Há um garrote e uma asfixia na indústria da produção de habitação para arrendamento que infelizmente, nunca vai permitir essa proporção”, sublinha, acrescentando que esta inversão seria desejável porque dá mais mobilidade às populações e endivida menos as famílias.
Para Pedro Vicente, seria necessário a criação de um pacote de construção para arrendamento, de forma a serem dadas as melhores condições para este segmento avançar no país. “Não tem nada a ver com custos controlados. É construção para arrendamento com um enquadramento legal estável e que não mude todos os anos com o Orçamento do Estado, como tem vindo a acontecer, onde se atira uma ‘bomba’ para cima de quem constrói para arrendar e como tal o resultado está à vista, temos zero de oferta”, afirma.
“Built to rent não existe em Portugal. Somos muito mais conservadores”
Nuno Durão, managing partner da Fine & Country, vai ainda mais longe. O responsável assume que o segmento “built to rent não existe em Portugal”, justificando com o facto de que o país é muito mais conservador. “Se o dinheiro no banco me dá 3% vou meter-me num built to rent que me dá 2%? Com o risco de não me pagarem a renda? Só um doido. Em Portugal o built to rent significa ganhar dinheiro e tudo o que seja ganhar dinheiro é para ser taxado amanhã. Portanto, ninguém arrisca”, refere.
Já Pedro Rutkowski, CEO da Worx, realça que o segmento built to rent vai ser exequível, mas nunca daqui a dois ou três anos. “Nem pouco mais ou menos a 50-50, isso é um wishfull thinking. Temos de ver que uma construção demora cerca de 18 meses, depois temos o problema do licenciamento, muitas vezes num prazo de dez anos demora um projeto a estar concluído”, sublinha.
No entender do CEO é preciso fazer algumas reformas no conceito da habitação e destaca que o mercado de built to rent terá de ser feito por particulares e quanto muito projetos público-privados. “Acho que é uma realidade da qual não vamos fugir, aliás há uma grande falta de habitação e hoje nem toda a gente consegue financiar-se para comprar uma casa, sobretudo com as taxas de juro no valor que estão”, realça.
“Built to rent puro está bastante longe”
Quem também não está muito otimista sobre uma entrada para breve deste segmento em Portugal é Bruna Melo, senior manager and tax services da consultora Ernst & Young (EY). “Aqui a questão é o mercado primário versus secundário. Se estamos a falar de promoção para arrendamento ou de arrendamento por privados. O built to rent puro, ou seja, o mercado de promoção e construção para arrendamento acho que está bastante longe”, salienta.
Para a responsável da consultora os incentivos que existem em Portugal é para o arrendamento acessível e defende que neste segmento, se as coisas não mudarem de forma considerável em termos de impostos (IVA, IRC, IMI e AIMI) “vamos ter dificuldade em ter projetos com viabilidade económica no built to rent“.