O Banco Central Europeu (BCE) reúne esta quinta-feira, mas o foco estará colocado nos meses seguintes e no arranque da normalização da política monetária. A decisão de março será certamente a manutenção dos atuais níveis, mas o mercado procura incessantemente sinais do que está para vir, ao passo que o banco central não se quer comprometer demasiado com um caminho definido, sobretudo dados os sinais contraditórios sobre a economia da moeda única.
Os juros diretores para a zona euro estão em níveis recorde há vários meses, mais concretamente em 4,5% desde março do ano passado, e a reunião desta quinta-feira não deve trazer novidades nesse capítulo. Os mercados chegaram a apontar para março como o arranque das descidas de juros, dado o recuo assinalável da inflação nos últimos meses de 2023 e a perspetiva de uma recessão, mas os dados desde então têm pintado um cenário menos claro.
Os mais recentes vieram com o índice de gestores de compras (PMI), que mostrou o sector dos serviços de volta a uma situação de crescimento ao fim de sete meses. Ainda assim, e apesar da melhoria no indicador composto, a economia mantém-se em terreno de contração, mas com pressões inflacionistas ainda bastante evidentes, sobretudo na vertente dos salários.
“O BCE, com a sua postura de decidir com base nos dados, irá com certeza levar em conta os últimos números dos PMI, que potencialmente poderão ser um aviso de que o problema da inflação ainda não está controlado, revelando que será ainda demasiado cedo para começar a baixar os juros”, considera Ricardo Evangelista, diretor executivo da ActivTrades Europe.
Esta parece ser a visão predominante do mercado, que aponta agora esmagadoramente para junho como a primeira descida de juros do atual ciclo monetário. A suportar esta ideia estão também os comentários recentes de vários governadores de bancos centrais nacionais, que têm procurado sublinhar a necessidade de mover com cautela.
“Os riscos provenientes do crescimento salarial continuam a existir e o segundo trimestre mostrar-nos-á se se materializam ou não”, destaca Martin Wolburg, economista chefe da Generali AM. Como tal, é expectável que Lagarde “mantenha o discurso dovish de ‘esperar para ver’ e sinalize verbalmente um primeiro corte a acontecer em junho”.
Ricardo Evangelista antecipa uma postura semelhante, frisando novamente a dependência dos dados do BCE e relembrando que “a precificação por parte dos mercados financeiros da moderação da política económica do BCE acaba por ter um efeito contraproducente face ao objetivo de controlar a inflação, já que por si só dilui algum do efeito restritivo da atual política monetária”.
Flavio Carpenzano, diretor de investimentos no Capital Group, lembra as palavras de Isabel Schnabel, membro do Conselho do BCE e uma das decisoras mais hawkish da autoridade monetária, que sugerem que “está satisfeita por as taxas não terem de subir mais” para exemplificar como o mercado parece estar a pensar demasiado à frente.
“Os mercados está a ser prematuros ao esperarem o primeiro corte já em março. O BCE vai querer evidências mais claras de que o crescimento salarial está a acalmar e que as empresas estão a absorver os custos mais elevados nas suas margens de lucro antes de cortar taxas. […] Apesar de acharmos que os mercados atualmente estão a incorporar demasiados cortes e cedo demais, o facto de o BCE ter já acabado com as subidas vai ter um impacto negativo forte sobre as taxas no médio prazo.”