O Banco Central Europeu (BCE) prepara-se para voltar a cortar taxas esta quinta-feira, dada a descida da inflação para valores em linha com o objetivo de longo prazo, mas também as preocupações com o crescimento anémico na zona euro, cada vez mais perturbada pela fraqueza industrial das suas duas maiores economias, a alemã e a francesa.
Na última reunião do BCE, em setembro, a presidente Christine Lagarde procurou afastar a possibilidade de nova descida dos juros em outubro, argumentando que o curto intervalo entre reuniões (cinco semanas) seria escasso para alterar de forma significativa o panorama económico na zona euro. Passadas essas cinco semanas, parece ser a visão de Mário Centeno que prevaleceu.
“Cinco semanas não é pouco tempo”, afirmou o governador do Banco de Portugal (BdP), isto algumas semanas após ter contestado a visão de Lagarde. Ao ‘Politico’, o antigo ministro das Finanças projetou que o BCE poderia ter de acelerar o ritmo de corte de juros, sobretudo após a Reserva Federal norte-americana ter optado por uma descida ‘jumbo’ de 50 pontos base (p.b.).
Esta visão acabou por ser secundada por outras figuras menos ‘dovish’ do que Centeno, como o governador francês, François Villeroy de Galhau, que admitiu a possibilidade de o BCE ter de acelerar os cortes face a um cenário bastante pessimista do lado do crescimento.
Os mercados concordam agora com Centeno, com 90% dos economistas consultados pela Morningstar a projetarem novo corte de 25 p.b. em outubro – o terceiro e penúltimo este ano, dada a expectativa de nova descida em dezembro. Olhando para as taxas de juro implícitas de mercado, a probabilidade estimada para esta descida é de 97,6%, de acordo com a Refinitiv.
A inflação de setembro mostrou um indicador abaixo do objetivo de 2% do BCE pela primeira vez desde junho de 2021, com 1,8%, e a inflação subjacente também caiu (por 0,1 pontos percentuais para 2,7%), sinalizando um alívio a continuar nos próximos meses.
Do lado do crescimento, os sinais são bastante menos animadores. O índice de gestores de compras (PMI) ficou abaixo de 50 pontos, ou seja, em terreno de contração, na leitura mais recente, deixando antever uma possível recessão na zona euro – ou pelo menos nas suas economias mais relevantes, em plena recessão industrial há vários trimestres.
Também o próprio BCE cortou a previsão de crescimento este ano em 0,1 p.p., antecipando agora 0,8% de avanço, valor visto como próximo de anémico por boa parte dos analistas. Junta-se a isto uma série de inquéritos de mercado e indicadores de confiança em terreno negativo, além da instabilidade geopolítica global, que cria riscos claros para o crescimento europeu.
Martin Wolburg, economista senior na Generali AM, aponta para os ganhos salariais reais nos últimos meses para argumentar que o consumo deverá suportar a economia da moeda única, vendo também espaço para o investimento público aumentar significativamente com a reversão da política monetária. Como tal, a previsão de uma taxa de 2,5% no final de 2025 é antecipada para abril, com cortes de 25 p.b. em cada reunião a partir de agora.
O Goldman Sachs vai mais longe, antecipando mesmo que os cortes se sucedam em cada reunião até junho, quando os juros diretores para a zona euro chegarão a 2%. O indicador está atualmente em 3,5%.