A empresa global de formação, coaching e tecnologia especializada no ramo de mediação imobiliária Keller Williams, instalada em Portugal há 10 anos, continua a crescer. Terminou o primeiro semestre de 2024 com um novo recorde de faturação: mais de 30 milhões de euros, o que representa um acréscimo de 17% relativamente ao mesmo período do ano passado. O período entre janeiro e junho registou, ainda, uma subida no número de transações: mais 15% do que no período homólogo de 2023, 80% das quais ligadas a processos de compra e venda.
A Keller Williams anunciou recentemente 30 milhões de euros de faturação no primeiro semestre. Antecipa o dobro para o total de 2024?
Em condições normais seria lógico até antecipar um bocadinho mais. Quer para nós quer para o mercado tendo em conta que o último trimestre do ano costuma ser o mais forte do ponto de vista do número e do volume de transações. No entanto, e ao contrário das expectativas, os números do INE do primeiro trimestre apontam um decréscimo no número de transações de 4,1% a nível nacional. Assim sendo, e tendo em conta os nossos resultados do primeiro semestre, estamos otimistas quanto à continuação da nossa boa performance na certeza que temos que continuar muito atentos ao mercado e à sua evolução.
Que outros indicadores de negócio pode avançar?
A faturação é a consequência de tudo o que fazemos. Por isso, vemos crescimento em todos os outros grandes indicadores de atividade. Estamos a crescer no número de consultores, o primeiro dominó, como costumamos dizer, isto é, a variável que determina todas as outras, mas também estamos a crescer na angariação de imóveis, que serão postos à disposição dos clientes/compradores.
Quanto estão a crescer?
Nas angariações crescemos no passado 20% e estamos a continuar esse crescimento. Neste momento, no acumulado do ano, levamos um crescimento de cerca de 10%. O volume está ligeiramente acima, porque os preços continuam a aumentar. Quando aumentamos o número de angariações em unidades, o valor dessas angariações cresce um pouco mais. São boas notícias para nós e para o sector, para a sociedade, nem tanto, pois significa que ainda não há perspetivas dos preços virem a baixar. Também vamos crescer em número de operações. Até ao final do ano vamos continuar a abrir os chamamos market centers, nome que damos às nossas agências.
Quantas novas aberturas tem em perspetiva?
O número exato vai depender, mas vemos entre três a cinco novas operações até ao final do ano. Comunicámos recentemente a assinatura de duas novas franquias.
E negócios em carteira, qual é a ordem de grandeza?
É difícil dar essa perspetiva. Não é um indicador que a KW Portugal acompanhe. O que está em carteira, o que foi para contrato de promessa compra e venda, o que está em escritura, aqui, a nível central, nós não acompanhamos. O melhor proxy que temos relacionado com o aumento de faturação é o número de angariações e aí, como lhe disse, estamos a crescer 10%. Como, normalmente, os nossos contratos têm, em média, seis meses de duração, isso dá-nos uma perspetiva de que a prazo há condições para a nossa faturação também continuar a aumentar. Os grandes indicadores para nós são o número de consultores, as angariações e a faturação, além, naturalmente, de tudo o que tem a ver com margem e lucro.
Estamos a falar de quantas angariações?
Milhares. O stock é um número que não revelamos, mas posso dizer-lhe que fazemos mais de 1000 angariações por mês em todo o país.
Que tipo de edifícios?
Trabalhamos todo o tipo de produto, digamos assim: apartamentos, moradias, terrenos, espaços comerciais, enfim, tudo o que puder imaginar…
Palácios?
Sim, palácios, também. Lançámos o ano passado uma nova divisão na KW chamada KW Luxury. É uma área dentro da nossa proposta de valor que está direcionada para o mercado do luxo. No nosso portfólio contam alguns alguns palacetes, incluindo um aqui em Lisboa. Temos uma quinta na Grande Lisboa por 12 milhões. Recentemente, vendemos uma herdade no Alentejo, que gerou uma comissão que, posso dizer-lhe, foi uma loucura…
O luxo continua em alta?
Sim. Tem vindo a crescer e não foi afetado pela crise no ano passado. É um segmento no qual não se movimenta a população portuguesa. Portugal continua muito atrativo para o investimento, mesmo que tenha havido por parte dos governos algum desinvestimento nos incentivos para esse tipo de clientela. A verdade é que o país continua a ser seguro, atrativo do ponto de vista da estabilidade económica, o tempo é maravilhoso... Continuamos a atrair muito interesse do cliente estrangeiro. Vemos isso em Lisboa, e, em particular, neste momento, também na Região Autónoma da Madeira, onde o mercado de luxo está a crescer a olhos vistos, desde o palacete até ao terreno agrícola.
Que importância tem este segmento para vocês?
O nosso grande foco, onde fazemos 80% do nosso negócio, é a compra e venda de habitação residencial, apartamentos, vivendas. É aí que nos posicionamos. Obviamente, quando aparecem oportunidades noutras áreas, estamos cá para agarrá-las.
Explique-nos como funciona o negócio.
Importamos um modelo que vem dos Estados Unidos, onde o número de verdadeiros empreendedores e a cultura empreendedora está muito mais desenvolvida do que Portugal, por um lado, e por outro, temos na nossa sociedade um problema gravíssimo de literacia financeira. Por isso, se quisermos crescer, temos que ter a capacidade de ajudar as nossas pessoas a crescer. Temos que as capacitar não só para conseguirem angariar o imóvel, mas também para conseguirem gerir o rendimento que tiram da venda dele, ensiná-las a reinvestir no próprio negócio, ensinar-lhes técnicas de marketing, de gestão de finanças, etc. etc. Quando dizemos que somos uma empresa de formação, anunciamos ao mercado a forma como nós trabalhamos com as nossas pessoas para as levar a atingir resultados.
É um fator de diferenciação?
Sim e um fator de diferenciação fundamental. Normalmente, a principal proposta de valor dos nossos concorrentes é a própria marca. São franchisings mais tradicionais, na base de uma proposta de valor que assenta na marca, ‘associa-te a mim, tenho este logótipo e este logótipo é reconhecido no mercado como um selo de qualidade’ (...) Nós não investimos em marketing, fazemos investimento. Quando comparado com o tradicional, nós não temos campanhas na televisão, nem outdoors. Não trabalhamos a promoção da marca, trabalhamos o seu posicionamento de forma diferenciada. A nossa principal aposta é formar as nossas pessoas, investir nelas, remunerá-las de uma forma que lhes permita reinvestir no seu negócio. Por isso é que temos a comissão mais elevada do mercado. Pagamos mais, mas ensinamos as pessoas a saber utilizar esse dinheiro para reinvestir na sua marca. A nossa marca são os nossos consultores, é aí que nós trabalhamos. Para isso é preciso ensinar.
Resumindo: vocês são a cabeça da rede, o que passam através da formação é o conhecimento para a fortificar.
Isso mesmo. A componente comercial de vender casas é uma fatia muito pequena da totalidade da nossa proposta de valor de formação. De facto, nós queremos impactar as nossas pessoas muito para além do ‘angaria, transaciona, ganha comissão’. O consultor imobiliário tem que ter muitas competências e deter informação que permita ao cliente ter confiança em fazer aquela transação e para isso só as técnicas comerciais de angariar não chegam. (...) Mensalmente, produzimos um pacote de informação que disponibilizamos aos nossos consultores, exatamente para que estejam o mais bem informados possível sobre todas as métricas de negócio, porque vão precisar de falar disto com os seus clientes.
Qual é o ganho médio de um operador nesta atividade?
À média chegamos facilmente: Temos 3000 consultores, faturamos 30 milhões no primeiro semestre, mas isso não traduz a realidade. Há consultores que faturam cinco mil euros e outros que faturam mais de 1 milhão. Todos têm acesso às mesmas oportunidades, à mesma formação. Dizer que um consultor imobiliário, em média, recebe isto é falacioso, porque recebe em função do investimento que faz em si próprio, na sua capacidade de aprendizagem. Aqui não há uma tabela salarial.
Na rede KW, quantas pessoas têm um rendimento superior a 50 mil euros por ano?
Muitas.
Dezenas?
Chegam às centenas. Se calhar entre 15% e 20% dos nossos consultores têm esse tipo de faturação. Normalmente é acima desse patamar que distribuímos reconhecimentos, prémios.
Está a apontar aos 300.
Não lhe digo o número exato, mas é seguramente acima disso.
Também existe o inverso. Não vende não tem rendimento, certo?
Não angaria, não vende, não tem rendimento. Isso mesmo. Temos infelizmente pessoas nessa situação.
Como se aguentam essas pessoas?
Não aguentam, muitas vezes. Depois saem do sector. Este é um dos sectores onde existe uma maior taxa de rotatividade. Temos contribuído e queremos continuar a fazer o caminho de valorização do sector, de valorização do profissional e da carreira de consultor imobiliário. Historicamente, este é um sector que tem servido para acolher pessoas que chegam à mediação como o plano C ou D das suas vidas. 'Não está a aparecer mais nada, vou lá experimentar'. Acontece que quem tem a capacidade de incorporar toda a formação que damos e começar a fazer as atividades e a angariar rapidamente, muitas vezes, não volta onde estava, porque efetivamente um bom consultor imobiliário pode e tem rendimentos muito acima da média. A questão é que nem toda a gente tem capacidade para estar seis meses sem rendimento. A elevada taxa de rotatividade no sector faz parte. É, aliás, a razão pela qual, na minha perspetiva, muitas vezes, o sector pode ter inclusivamente uma imagem mais degradada junto do mercado.
A regulação ajudaria a dar um contorno mais, digamos, claro à atividade?
Existir ou não um selo ou um certificado não coloca minimamente em causa o profissionalismo das nossas pessoas. Temos pessoas muitíssimo qualificadas, altamente profissionais, que prestam um serviço aos seus clientes absolutamente extraordinário. Para quem está fora e eventualmente ainda olha para este sector com alguma desconfiança, saber que aquela pessoa para poder desempenhar aquela função, passou pelo mínimo de formação e que essa formação está certificada para alguma entidade pública, poderia, talvez, ajudar. Mas um bom consultor é um bom consultor, independentemente de ser certificado ou não. Ponto. Mas, sim, admito que poderia ajudar a imagem do sector. Talvez.
De onde vem a maior parte dos estrangeiros que vos procuram?
As três nacionalidades que mais investem em Portugal, neste momento, são americanos, franceses e brasileiros, não necessariamente por esta ordem. Vimos no ano passado um crescimento brutal do cliente americano. Antigamente era só para um determinado posicionamento, mas com a crise nos Estados Unidos, investir na Europa tornou-se atrativo mesmo para a classe média. Os franceses também têm vindo a crescer.
Os angolanos já estiveram nesse top?
Decaiu.
E os russos?
Não necessariamente só russos, mas do Leste da Europa , do antigo universo da ex-União Soviética. Bulgária, Lituânia, Letónia... Vemos também cliente ucraniano, com maior poder de compra a fazer investimento e a fugir da situação do país.
O perfil brasileiro?
Evoluiu. Numa primeira vaga com a entrada do Bolsonaro, houve muita gente da classe média, mas hoje em dia é gente com um altíssimo poder de compra.
A KW está neste momento compradora de alguma empresa em Portugal?
A nossa proposta de valor passa por, em primeira instância, continuar a importar o que ainda não importámos dos Estados Unidos. Importámos a nossa divisão de luxo no início do ano passado. Este ano lançámos a nossa empresa de coacinhg que também existia nos Estados Unidos - é uma afiliada, embora seja uma entidade diferente. Estamos a investir no nosso negócio de intermediação de crédito, mas dentro da KW Portugal, atraindo talento. Temos uma pessoa muito talentosa que trabalhava há muito tempo nesse sector que agora está a desenvolver essa área dentro da KW Portugal. Estamos atentos a oportunidades do ponto de vista tecnológico (...) Queremos aumentar a nossa proposta de valor aos nossos associados em Portugal e por isso vamos reforçando dentro da nossa plataforma. São tudo temas dentro da mediação, digamos assim, mas aquisições não está no nosso horizonte.
O que ainda vos falta trazer dos Estados Unidos?
Olhe, por exemplo, dentro da Divisão de Coaching, há dezenas de programas que já existem nos Estados Unidos que neste momento, com a nossa equipa não faz sentido ter cá. Vamos precisar de fazer crescer a equipa para continuar a trazê-los. Mais do que outras empresas ou outras áreas de negócio, é sobretudo, dentro da própria proposta de valor que temos à nossa disposição que estamos a trabalhar, para melhorar.