Assim que se finalizou a contagem dos votos dos círculos da emigração, ao início desta quinta-feira, 21 de março, o Presidente da República chamou o líder da AD a Belém para indigitar Luís Montenegro como primeiro-ministro e convidá-lo a formar governo.
Segundo a nota publicada no site da Presidência da República, "tendo o Presidente da República procedido à audição dos partidos e coligações de partidos que se apresentaram às eleições de 10 de março para a Assembleia da República e obtiveram mandatos de deputados, tendo a Aliança Democrática vencido as eleições em mandatos e em votos, e tendo o Secretário-Geral do Partido Socialista reconhecido e confirmado que seria líder da Oposição, o Presidente da República decidiu indigitar o Dr. Luís Montenegro como Primeiro-Ministro, apresentando oportunamente ao Presidente da República a orgânica e composição do XXIV Governo Constitucional".
O líder da coligação PSD/CDS tinha estado horas antes, ao final da tarde de quarta-feira, numa primeira audiência, com o Presidente da República para análise dos resultados eleitorais e logo à saída, aos jornalistas, disse que esperava que Marcelo o indigitasse primeiro-ministro assim que os votos da Europa e de Fora da Europa fossem contados. “A minha perspetiva é que, assim que fique concluída a contagem dos votos, seja indigitado pelo presidente da República”, disse o líder da AD aos jornalistas à saída da audiência com Marcelo Rebelo de Sousa, ao qual foi dizer que está “preparado” para formar governo, que está “focado” em resolver os problemas dos portugueses e meter a “economia mais forte”. Montenegro não quis falar sobre detalhes do futuro executivo, nem sobre a sua composição ou objetivos, argumentando que ainda não existe governo porque a decisão estava “agora” nas mãos de Marcelo e que só depois da indigitação seriam tomados os “procedimentos” sobre a governação
Mas uma coisa fez questão de garantir: quer uma “economia mais forte”, quer “promover uma mudança de governo e das políticas” no país, quer “melhores salários”, uma “classe média mais desafogada”, os jovens com “mais esperança” e os serviços públicos a “darem resposta”. Após a primeira reunião em Belém, antes de voltar para ser indigitado, Montenegro também saudou o “sentido de responsabilidade” do PS ao sinalizar viabilização de OE retificativo.
O PSD e CDS – que formaram a coligação AD, que venceu as eleições de 10 de março - foram os últimos a ser ouvidos pelo chefe de Estado após as eleições legislativas antecipadas de 10 de março. Os votos da emigração (que contam para a eleição de quatro deputados) começaram a ser contados na segunda-feira e durante esta quarta-feira continuavam a dar a mesma tendência: dois deputados para o Chega, um para a AD e outro para o PS (com o atual presidente da Assembleia da República, Augusto Santos Silva a falhar a eleição no círculo Fora da Europa). O resultado final manteve-se inalterado.
Tal como era esperado pelos partidos (logo na noite eleitoral Pedro Nuno Santos assumiu a derrota), a contagem dos votos do círculo fora da europa (dois deputados) e da Europa (dois deputados) não deu a volta ao resultado da noite de domingo, 10 de março. E Montenegro, sendo líder da coligação mais votado, vai mesmo formar governo. O líder do PSD quer ter um governo de “combate”, com pessoas com “experiência política e governativa”, mas também técnicos, como dizem ao JE fontes da AD, até porque tendo maioria relativa vai ter vários desafios pela frente para fazer aprovar diplomas e terá de ter ministros com experiência política.
Até esta quarta-feira chegaram Portugal 318.839 cartas com os votos dos emigrantes portugueses nas legislativas, segundo a Administração Eleitoral. Os dados indicam que chegaram a Portugal 21,29% dos votos, o que representa um aumento de seis pontos percentuais em relação aos rececionados em 2022 (15,17%).
Pelo círculo da Europa, o Chega ficou em primeiro lugar, muito à conta dos votos vindos da Suíça, e pelo círculo Fora da Europa ficou a AD, que perdeu, contudo, o Brasil para o Chega, onde Bolsonaro fez campanha por André Ventura.
Estão eleitos os dois deputados pelo círculo Da Europa, um pelo Chega, outro pelo PS. O partido de André Ventura foi o vencedor, com 18,31%, que correspondem a 42.972 votos, seguido do PS, com 16,22%, que representam 38.061 votos e a AD em terceiro, com 14,21%, 33.350 votos.
Pelo círculo Fora da Europa, a AD garantiu um deputado e o Chega outro deputado. A coligação foi a vencedora, com mais de 24%, seguida do Chega com mais de 14% e do PS que ultrapassou os 13%.
Pedro Nuno Santos sustenta governo até verão
Foi a grande novidade que saiu da audiência do secretário-geral do PS com o Presidente da República, na terça-feira, que durou quase duas horas. À saída, aos jornalistas, Pedro Nuno Santos reiterou o que terá dito a Marcelo Rebelo de Sousa: que aprovaria um orçamento retificativo de um governo AD para que até ao verão fosse possível avançar já com algumas medidas. E deixou o seu caderno de encargos: o retificativo teria de servir para subir salários na administração pública, nomeadamente médicos e oficiais de justiça e atribuir o suplemento de missão à PSP e GNR. A abertura do PS para “sustentar” o governo na aplicação destas medidas mais populares acaba por tirar alguma margem à pressão que o Chega tem feito junto da AD, ameaçando votar contra qualquer orçamento se a coligação rejeitar fazer um acordo de governo com o partido de André Ventura (acordo de governo significa, aqui, ter uma palavra a dizer na composição do governo e nas políticas que vão ser desenvolvidas).
Na terça-feira, Pedro Nuno Santos acabou por surpreender tudo e todos, uma vez que na noite eleitoral disse que, apesar de não chumbar o programa da coligação, iria ser oposição e deixou implícito que não ia suportar um governo AD, que é como quem diz não aprovaria orçamentos. Certo é que o governo AD tem margem orçamental para avançar por decreto com algumas das principais medidas de que fez bandeira na campanha – reposição do tempo de serviço dos professores, negociar com forças de segurança e plano de emergência para a saúde. Mas o líder socialista veio, agora colocar o líder da AD à vontade para apresentar ao parlamento um orçamento retificativo caso necessite (se ultrapassar os tetos orçamentais previstos) que terá aprovação garantida.
Mas deixou condições: “Tem de ser em matérias de consenso”, disse Pedro Nuno Santos. O líder do PS recusou que esta sua abertura representa qualquer espetro de uma coligação do estilo bloco central, repetindo e reafirmando que está no parlamento para fazer oposição ao governo de centro-direita, que ganhou as eleições por uma mínima margem face ao PS e sem maioria absoluta (só a teria com o Chega, partido com o qual Luís Montenegro rejeita qualquer possibilidade de acordo ou aliança, mas apenas negociação medida a medida). “O PS será uma oposição responsável”, justificou Pedro Nuno Santos.
“Desde logo, ao longo da campanha, foi notório para todos que havia um largo consenso, que extravasa aliás o próprio PS e a AD, sobre a necessidade de valorizarmos as carreiras e as grelhas salariais de alguns grupos profissionais da administração pública”, explicou. Polícias, oficiais de justiça, médicos e professores estão neste grupo.
O líder do PS disse ainda esperar que nesta quarta-feira Luís Montenegro apresente um “governo estável” a Marcelo Rebelo de Sousa.
Iniciativa Liberal no governo?
É ainda uma incógnita. Fonte da IL respondeu ao JE “ainda não sabemos” e fontes da AD nem querem responder. Existe na coligação uma espécie de pacto de silêncio pedido por Luís Montenegro para que nenhuma informação sobre o futuro governo transpire para fora.
A ideia de a IL integrar o governo AD com dois ministros foi lançada por Luís Marques Mendes no domingo no seu espaço de comentário na SIC Notícias. Mas a AD não abre o jogo. Neste momento, sabe o JE e o NOVO, os dois partidos encontram-se apenas na fase das negociações, mas ainda não chegaram a uma conclusão final. É certo que este terá sido um dos temas que os representantes da AD levaram à audiência desta quarta-feira com o Presidente da República.
A IL não quis fazer um acordo pré-eleitoral com o PSD, à semelhança do que fizeram o CDS e o PPM, e acabou por eleger apenas oito deputados, que a juntar aos 79 que a AD conseguiu não chegam para uma maioria absoluta no parlamento (com a emigração a AD passará para 80).
Após a noite eleitoral, as informações começaram a ser contraditórias e alguns sociais-democratas diziam que não valia a pena fazer um acordo pós-eleitoral com os liberais, precisamente porque aritmeticamente não alcançavam a maioria absoluta, optando-se, apenas, por acordos pontuais na Assembleia da República. E o próprio líder da IL, Rui Rocha, chegou a colocar-se de fora, Mas, com o decurso do tempo, as posições de ambos os lados começaram a mudar de sentido e tanto no PSD, como nos liberais já se começava a falar da possibilidade de um acordo de governo, o que poderia dar a Montenegro, não a tal maioria absoluta, mas um sinal ao país de maior coesão e força do executivo. E a questão voltou a estar em cima da mesa.
Esta quarta-feira, à saída da reunião com Marcelo, Luís Montenegro voltou a não ser muito claro. Disse que formaria governo com a minoria saída das eleições – PSD e CDS – e que outros “procedimentos” só seriam adotados depois de ser indigitado para formar governo (àquela hora ainda não tinha sido). Ou seja, nem disse sim à IL, mas também disse não. O mesmo não que já disse ao Chega.