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Marcelo dá ‘luz verde’ a alívio do IRS do PS com olhos postos no OE

O Presidente da República promulgou o decreto que prevê a redução do IRS, proposto pelo PS, com descidas nas taxas até ao 6.º escalão de rendimentos. Marcelo afasta dúvidas de constitucionalidade e sinaliza que o impacto orçamental, dependente do Executivo, poderá ser empurrado 2025. Decisão sobre se o alívio fiscal se vai sentir já nos bolsos dos contribuintes, através das retenções na fonte, está agora nas mãos do ministro das Finanças.

O Presidente da República promulgou nesta terça-feira, 23 de julho, a descida do IRS proposta pelo PS, sustentando que o impacto orçamental dependente do Executivo e poderá só ser sentido no próximo ano. Cai assim por terra o argumento do Governo para o chumbo da medida ao sustentar que violava a lei-travão, segundo a qual os deputados não podem aprovar leis que aumentem a despesa ou reduzam receita enquanto está em vigor um Orçamento do Estado. Com Belém a dar  ‘luz verde’ à redução do imposto até ao 6º escalão de rendimentos, Marcelo abre o caminho para que os partidos se entendam relativamente aos impostos nas negociações relativas ao OE2025, pretendendo criar com a sua decisão um ambiente favorável à sua viabilização.

Apesar da promulgação do alívio do IRS, e de outros três diplomas relativos a este imposto, bem como a extinção de portagens nas antigas SCUT e a redução do IVA da eletricidade que também tiveram ‘luz verde’, Marcelo deixou um sério aviso relativamente ao próximo Orçamento do Estado: “Todos os diplomas terão de encontrar cobertura” orçamental “a fim de poderem ser executados”.

O Presidente da República destacou que espera que esta promulgação possa “contribuir para o debate e aprovação do Orçamento para o próximo ano” sendo que esta aprovação possa “contribuir para a estabilidade financeira, económica e política do nosso País”.

Marcelo sinaliza que nos três diplomas relativos ao IRS, que além da redução do imposto visam ainda o aumento da dedução com rendas de habitação dos atuais 600 para os 700 euros em 2025, também proposto pelo PS e a atualização da dedução específica, proposta pelo BE,  “dos quais dois votados apenas pelas Oposições, o momento da repercussão nas receitas do Estado está dependente de regulamentação do Governo, através da fixação das retenções na fonte, pelo que podem também só ter impacto no próximo ano orçamental”.

No entendimento do chefe do Governo, o impacto da redução do IRS a ter efeito este ano, por via da diminuição das tabelas de retenção na fonte, terá de ser sempre uma decisão do Governo e não do Parlamento. Ou seja, a única maneira de haver diminuição da receita em IRS em 2024 seria a alteração das tabelas de retenção na fonte, para refletir a descida do imposto, mas isso não violaria a norma-travão porque se trata de uma decisão do Governo e não do Parlamento.

Alívio fiscal já em agosto ou em 2025 nas mãos do Governo

A decisão sobre se a redução de imposto se vai já refletir nas retenções na fonte está agora nas mãos do ministro das Finanças. E o líder do PS desafiou já o Governo ao defender que os efeitos do alívio do IRS deve fazer-se sentir este ano nos bolsos dos contribuintes, tendo Pedro Nuno Santos destacado ontem que “a vontade de negociar o OE é independente da aprovação das medidas promulgadas pela Presidência da República”.

Fontes governamentais avançaram ao JE que com a promulgação do diploma a aplicação da redução do IRS proposta pelos socialistas, caso a medida não venha a ser revogada no OE2025, poderá ocorrer através de duas vias: pela alteração das tabelas de retenção do IRS, que, a partir de agosto, podia levar já ao aumento do rendimento disponível das famílias com menores retenções de imposto ou pelo acerto de contas com fisco só em 2025, aquando da liquidação do imposto referente aos rendimentos de 2024, o que levaria a que o alívio fiscal decorrente da alteração dos escalões do IRS não fosse sentido já este ano.

Fontes governamentais apontam o primeiro cenário como o mais provável - até porque na proposta do Governo para reduzir o IRS a margem orçamental era de 348 milhões para este ano - ainda que não esteja excluído que também o primeiro-ministro poderá vir a pedir a fiscalização sucessiva deste diploma.

 Os avisos de Montenegro

Para já, após o anúncio da decisão de Marcelo, o primeiro-ministro deixa o aviso de que "a decisão da Assembleia da República se querer substituir ao Governo em matérias que são claramente de ação executiva" tem "consequências", nomeadamente financeiras.

Luís Montenegro reagiu com algum pessimismo à promulgação de sete diplomas, seis dos quais votados aprovados pela Oposição, e deixou a ideia que o Governo vai ter de equacionar o que vai deixar de fazer em função dessas decisões.

Em visita a Luanda, o chefe do Governo enalteceu que “o próprio Presidente da República dá nota que há consequências do ponto de vista orçamental para o próximo ano e eventualmente já para o ano em curso”.

“É importante reter que algumas destas medidas foram tomadas em contraponto ao que é o programa do Governo. Essas decisões têm não só um impacto financeiro como um impacto nas escolhas políticas porque é preciso tomar decisões quanto a receitas e despesas”, comentou o primeiro-ministro.

Montenegro desafiou a oposição a explicar como irá compensar as perdas para os cofres do Estado: “o que é interessante para o país é que quem promoveu estas alterações, diga ao país o que oferece em troca”, pedindo ao PS e ao Chega que clarificassem se recomendariam ao Governo que a descida do IRS, promulgada por Belém, através da redução das tabelas de retenção na fonte, se aplica no próximo ano ou ainda este ano.

Abolição de portagens, redução do IVA da luz e IRS custam mais de 800 milhões

Sobre a promulgação dos sete diplomas enviados pela Assembleia da República, entre os quais estavam projetos aprovados à revelia do Governo, como a redução do IRS, a extinção de portagens nas antigas SCUT, as deduções por habitação no IRS para os 800 euros, até 2028 ou o aumento do consumo de eletricidade à taxa reduzida do IVA, Marcelo sustenta que “todos os diplomas terão de encontrar cobertura no Orçamento do Estado para 2025, a fim de poderem ser executados, não sendo, por isso, irrelevantes para contribuir para o debate e aprovação do Orçamento para o próximo ano”.

Só a abolição das portagens (157 milhões), a redução do IVA da eletricidade (100 milhões) e o alívio do IRS (550 milhões) representam mais de 800 milhões de euros, com a redução do IRS proposta pelo PS a custar mais 87 milhões face ao custo de 463 milhões que representava a proposta do Governo, que contemplava também cortes nas taxas do7º e8º escalões.

O alívio fiscal proposto pelo PS, entre 0,25 e 1,5 pontos percentuais até ao 6.º escalão de rendimentos, tem um impacto orçamental de 550 milhões de euros, sendo que o PS defendeu que maior fatia de 348 milhões deveria ocorrer este ano com descida das tabelas de retenção na fonte com os socialistas a argumentarem estar em linha com a margem orçamental prevista pelo Governo para a redução intercalar do IRS. A restante fatia (202 milhões) chegaria ao bolso dos contribuintes, com o aumento dos reembolsos, em 2025.

Marcelo deu ainda conta das medidas, cujo custo só se irá refletir no próximo ano. É o caso do diploma do BE que atualiza a dedução específica, que está congelada nos 4.104 euros há mais de uma década, em função do Indexante dos Apoios Sociais (IAS) e a lei dos partidos que suportam o Governo, que procede à atualização dos limites dos escalões em linha com a inflação e da produtividade e do mínimo de existência.

Na semana passada, Marcelo tinha já sinalizado que o que pode fazer nas suas decisões sobre estas leis é “pensar naquilo que é melhor para criar um clima favorável à passagem do Orçamento do Estado” e que vê com “bons olhos” o processo de diálogo que o Governo iniciou sexta-feira passada com as oposições.

Já nesta terça-feira, a poucas horas antes de anunciar a sua decisão, Marcelo reconheceu que a tomada de posição será “obviamente política” e que está relacionada com as negociações relativas ao OE2025, um documento que o chefe de Estado disse, na semana passada, que iria fazer tudo para que fosse aprovado.