As cigarras formam um coro orelhudo sob o sol escaldante, tal como cá. O verde seco, o azul saturado do céu e do mar e até os tons de areia são primos, mas com sotaques diferentes. Em Montpellier, no sul de França, achamos uma cidade pequena que almeja ser grande - das maiores -, e na qual um português se vai sentir estranha, mas intrinsecamente, em casa. Ou não fosse este canto recôndito da Occitânia um forte medieval de queijos e vinhos, dispostos orgulhosamente em todas as mesas, das mais caras às mais baratas. Aqui, numa das cidades mais velhas de França e do continente europeu, que continuamente quer rasgar rio adentro até ao mar, num frenesim de contemporaneidade e design, mandam os jovens - estudantes - que compõem quase dois terços da população residente. Na primeira noite, à nossa chegada, cumprimentaram-nos com uma clássica sincronia regurgitante e intoxicada, a escassos metros da fachada de uma das mais antigas faculdades de medicina do mundo. À segunda, presentearam-nos com um festival académico pingado de hits peganhentos dos anos 2000. À terceira, rebentavam as costuras das estreitas ruas en follie. Quem se esgueirava pelo ar suado, ombro a ombro, não se sentiria longe do Bairro Alto. E ainda bem, que há coisas que é melhor não estranhar.