Skip to main content

Há tanto Brasil para lá do óbvio

Escreveu Drummond de Antrade que tinha “apenas duas mãos e o sentimento do mundo”. Em ano de bicentenário da independência, o Brasil permanece um país que nos suscita uma vastidão de sentimentos, anseios e sonhos. Tão vastos quanto a sua imensidão. Pretexto para descobrir paisagens mil e relaxar em recantos que ainda não estão no radar das multidões.

Brasil é independente há 200 anos, mas é muito mais americano do que português. A cultura de Hollywood seduz muito mais do que o cinema ou a música made in Portugal. A língua, contudo, foi sempre motivo de enamoramento (e não só). E a literatura sempre exerceu um profundo magnetismo. Dos dois lados do Atlântico, versos e paisagens entrelaçaram-se para criar melodias que habitam o imaginário de ambos, portugueses e brasileiros. E se Saramago e Pessoa são apenas dois dos nomes venerados da literatura portuguesa no Brasil, por cá não faltarão indefetíveis de Jorge Amado e Carlos Drummond de Andrade, para mantermos o doce equilíbrio do “dueto”.

Antes de prosseguirmos esta flânerie terra adentro, pois é isso que nos traz a terras do Brasil, talvez importe recordar a riqueza humana deste imenso país, feita da mestiçagem entre povos indígenas, africanos e europeus. Percorrer este vastíssimo território é descobrir muitas realidades e culturas paralelas, mas também constatar que há uma unidade fundamental sob a diversidade, os regionalismos, os bairrismos – uma cultura comum cujo eixo é a língua portuguesa, em solitário confronto com o vasto meio circundante de fala hispânica.

O Brasil surprende sempre. Pelas suas diferenças. E também pelas suas semelhanças.
Daí que o início deste périplo se faça longe dos locais habituais, e sim no coração do estado de Minas Gerais, nesse devaneio do barroco brasileiro que é Ouro Preto, cidade arrebatadora, onde as pedras da calçada falam de ambição desmedida e do sonho de liberdade dos Inconfidentes. “Precioso, ainda que Negro” foi o lema da bandeira de Ouro Preto (estado de Minas Gerais, Brasil) até 2005, ano em que vários movimentos levaram à sua alteração, por alegadas conotações racistas, para “Precioso Ouro Negro”.

Ouro Preto, Cidade Monumento Nacional, foi a primeira urbe brasileira distinguida como Património da Humanidade, em 1980. Dois génios das artes brasileiras, o arquiteto e escultor António Francisco Lisboa, o Aleijadinho, nascido em Ouro Preto, e o pintor Mestre Ataíde, de Mariana, contribuíram com a sua criatividade para fazer com que Ouro Preto, terra protegida pelas montanhas, tenha um carácter verdadeiramente único.

Foi aqui, na antiga capital de Minas Gerais, de seu nome Vila Rica, que surgiu o primeiro grande movimento de independência, conhecido como a Inconfidência Mineira, que resultou na morte de Joaquim José da Silva Xavier, o Tiradentes. Poderá desbravar a História, com maiúscula, no Museu que é dedicado a este episódio, e percorrer as suas colinas, para descobrir os sobrados, as janelas com gelosias, as mil e uma igrejas e até as Repúblicas de estudantes.

Se quiser relaxar com vista para as montanhas que servem de biombo a Ouro Preto, e ter por companhia a igreja de Nossa Senhora do Rosário, instale-se num dos terraços do Hotel Solar do Rosário, no centro da cidade, e escolha um quarto com vista.

Este conteúdo é exclusivo para assinantes, faça login ou subscreva o Jornal Económico