Quase 50 anos depois da Revolução do 25 de Abril e dos três "D" - Democratizar, Descolonizar, Desenvolver - que deram um novo rumo a Portugal, o país carrega um fardo difícil de explicar: a pobreza.
A propósito do Dia Universal dos Direitos da Criança, que se celebra esta segunda-feira, 20 de novembro, a Pordata, base de dados estatísticos da Fundação Francisco Manuel dos Santos, disponibiliza um conjunto de dados com origem em várias fontes (INE, Eurostat, PORDATA, OCDE e Censos) que permitem traçar o retrato das crianças e jovens que residem em Portugal. E como é diferente o que se vê, para o bem e para o mal.
Mais de um quarto de milhão de crianças e jovens viviam num contexto de pobreza em 2021. Eram exatamente 266 mil, das quais 76 mil com menos de seis anos.
Uma família de um casal com um filho é considerada pobre quando os seus rendimentos são inferiores a 991 euros líquidos por mês. Já um casal com dois filhos é uma família pobre se auferir menos de 1.156 euros/mês.
No mapa da União Europeia a 27, Portugal era, nesse ano, o 11.º país com maior taxa de pobreza entre as crianças e jovens (18,6% vs. 19% na EU27) e o 12.º com maior taxa de pobreza entre as crianças com menos de 6 anos (16,4% vs. 17,7% na EU27). Em Espanha, na Roménia, na Bulgária e em Itália, mais de uma em cada quatro crianças é pobre. Em contrapartida, na Eslovénia, Finlândia, Dinamarca e Hungria, menos de 10% das crianças vivem em situação de pobreza.
A taxa de pobreza ou exclusão social denuncia a maior vulnerabilidade das crianças e jovens mais velhos: 17,6% entre os menores de 6 anos, 20,7% entre os 6 e os 10 anos, e 23,4% entre os 11 e os 15 anos.
As situações de pobreza impactam a vida das crianças, nomeadamente na saúde. Portugal é o 5.º país da UE onde há maior proporção de crianças sem acesso a cuidados dentários, e o primeiro, quando falamos de crianças em situação de pobreza.
Em 2021, 1,7% das famílias afirmaram que as suas crianças não conseguiram aceder a cuidados médicos (valor abaixo da média europeia, de 3,6%). O número sobe para 6,6% nas famílias que estão em situação de pobreza (e, aqui, o valor é superior aos 5% da média europeia).
E quando se fala em cuidados dentários, a situação piora: 6,4% das famílias dizem não ter acesso, contra 4,4% da média europeia. O número dispara para 17,7% nas famílias em situação de pobreza, contra 9% da média europeia.
Retrato das crianças e jovens
O número de crianças cai quase metade em 50 anos. Em 2022, viviam em Portugal 1,3 milhões de crianças e jovens até aos 15 anos, dos quais 51% rapazes e 49% raparigas, o que equivale a 12,8% do total da população. Há 50 anos, eram mais de 46%. A quebra nos mais novos coloca Portugal na cauda da União Europeia, só ultrapassado pela Itália. E não é tudo. O INE estima que em 2050, crianças e jovens não ultrapassem 1,1 milhões e em 2028 sejam apenas um milhão.
O país está mesmo a ficar diferente. Olhe-se para o número de crianças e jovens com nacionalidade estrangeira: representam já 4,9% da população com menos de 15 anos. No total são 65 mil. Os brasileiro são a maioria (45%), seguindo-se mas a longa distância os angolanos (8%) e os chineses (4%). Uma fatia de 12 mil dessas crianças nasceram já em Portugal. Destaque para 5% de crianças ucranianas nascidas neste cantinho à beira mar plantado.
Com quem vivem e onde passam o dia
A grande maioria (81%) das crianças e jovens viviam em núcleos familiares compostos por um casal em união de direito ou de facto, e 19% numa família monoparental, sobretudo com a mãe (89%). Num contexto de pais separados, a guarda foi atribuída três quartos das vezes ao progenitor. Em 19% dos casos, a guarda era partilhada.
Para um país que há 50 anos não sabia o que era uma creche, Portugal fez um grande caminho. Apenas em sete países da UE27 mais de metade das crianças estavam em serviços educativos formais, com destaque para a Dinamarca e os Países Baixos, onde mais de 70% das crianças frequentam a creche. Portugal, onde quase metade das 240 mil crianças até aos 3 anos têm este respaldo está 12 pontos percentuais acima da média da União Europeia, que é 36%.
Portugal tinha registadas 2.549 creches, em 2021, menos 12 do que no ano anterior, das quais 77% integrando a rede solidária e pública, com capacidade para 118.260 crianças.
No que concerne às crianças entre os 3 anos e a idade de escolaridade obrigatória (6 anos), 89% frequentavam o ensino pré-escolar em 2021, valor ligeiramente acima da média europeia (88%). Em 13 países, mais de 90% das crianças nesta faixa etária estavam no pré-escolar. Na Hungria, na Suécia, em Espanha, nos Países Baixos e na Bélgica, a percentagem é de pelo menos 98%. Portugal destaca-se, contudo, como o país da União Europeia com maior proporção de crianças no pré-escolar com 30 ou mais horas semanais.
Caso de sucesso no PISA
Nas edições de 2015 e 2018 dos testes PISA, os jovens portugueses de 15 anos revelaram melhores resultados que a média da União Europeia em todas as matérias avaliadas (Leitura, Matemática e Ciências). Comparando com os resultados obtidos na primeira participação de Portugal no PISA, em 2000, constata-se que houve melhoria em todas as matérias, com especial destaque para a Matemática, onde o resultado passou de 454 pontos para 492 pontos.