A cerca de 10 meses do fim do prazo estabelecido, o ministro Adjunto da Economia e Coesão Territorial revelou no Parlamento que o Governo está a preparar uma segunda reprogramação do Plano de Recuperação e Resiliência (PRR) a apresentar à Comissão Europeia, sobre o qual gostaria de discutir com os deputados da respetiva comissão até ao fim de setembro ou início de outubro.
“Gostava de chamar a atenção dos senhores deputados para a circunstância de nós termos feito uma reprogramação do PRR e de estarmos a preparar um segundo ajustamento ao PRR", afirmou o ministro, ouvido no Parlamento esta terça-feira, no âmbito de dois requerimentos, um do Chega e outro do PS.
A primeira reprogramação, já aprovada pela Comissão Europeia este ano, ajustou as Agendas Mobilizadoras e as agendas verdes, criando um "instrumento financeiro para a inovação e competitividade", dotado com cerca de 315 milhões de euros, lembrou Castro Almeida, dizendo que as verbas em risco de se perderem serão canalizadas para esta área", explicou.
O ministro reconheceu que o próximo ano vai ser o "mais exigente" na execução do PRR - 2026 é o ano onde estão concentrados o maior número de marcos e metas - e que vão existir "dificuldades", mas defende que a "cláusula de salvaguarda" criada para canalizar as verbas não executadas vai fazer com que Portugal não desperdice "um euro" sequer nas subvenções.
"A cláusula de salvaguarda que consagramos na revisão do PRR vai garantir que a dotação prevista para qualquer investimento que não possa ser feito seja desviada para o instrumento financeiro para a inovação e competitividade", disse o governante, acrescentando que, desta forma, se resolverá um "pecado original" da bazuca europeia, o de ter "demasiado dinheiro para o Estado e pouco dinheiro para as empresas".
"O que agora o Estado não conseguir executar, vai para apoiar a inovação e competitividade das nossas empresas", vincou Castro Almeida.
Respondendo a uma pergunta de Mariana Leitão (IL), o governante disse que Portugal vai deixar de precisar de fundos europeus "quando as nossas empresas forem competitivas". "Portugal será rico quando as empresas portuguesas forem competitivas. É nisso que temos que apostar" e "todo o dinheiro que não puder ser investido do PRR é para aqui que vai ser dirigido".
O responsável pela tutela dos fundos europeus prosseguiu assinalando que tendo em conta que as empresas "têm uma grande capacidade" e "necessidade" de se tornarem mais competitivas, inovadoras e de estarem melhor capitalizadas, a cláusula de salvaguarda vai "garantir total execução" dos fundos. "Com uma vantagem", disse. "Basta que o contrato com o Banco de Fomento [que vai gerir esse instrumento financeiro] seja feito até 31 de agosto de 2026", podendo o dinheiro ser executado depois dessa data, até mesmo em 2027, explicou Castro Almeida.
Em jeito de resumo, na resposta à líder dos liberais, o ministro disse que o Governo está "ciente da exigência" do que tem para fazer e garantiu que o executivo "vai tentar, na medida do possível, executar o PRR tal como está programado". "Mas como bem sabe, há muitos agentes no terreno - empresas, setores do Estado, autarquias locais, IPSS, associações empresariais, cidadãos, entre outros - nem tudo está nas mãos do Governo" e, nessa medida, "há riscos de incumprimento", reconheceu.
Precavendo-se perante esses riscos, o executivo "arranjou forma de garantir que os casos de incumprimento que possam surgir" tenham uma alternativa. Dessa maneira, "se alguma meta ou marco falhar alteraremos essa componente e acrescentamos na da inovação e competitividade e colocamos o dinheiro nesse instrumento", explicou o responsável pela tutela. "É uma solução de que o Governo se orgulha e a maioria do Parlamento se há de orgulhar, porque vai ter tradução concreta no enriquecimento do país", afiançou.
Quanto aos alertas da comissão de acompanhamento do PRR sobre as dificuldades na execução dos fundos, uma visão mais pessimista do que aquela que é traçada pelo Governo, o ministro considerou que os relatórios "são opinativos" mas "úteis", não havendo nenhum "segredo" nos mesmos, até porque se baseiam em dados e informações da própria Estrutura de Missão Recuperar Portugal.
A primeira revisão do PRR, recorde-se, foi aprovada pela Comissão Europeia em 11 de abril deste ano, com o objetivo de reprogramar projetos que Portugal considerava serem mais difíceis de executar. Ao todo, a bazuca portuguesa inclui verbas europeias de 22.200 milhões de euros, dos quais 16.300 milhões de euros são concedidos em subvenções e 5.900 milhões de euros chegam através de empréstimos do Mecanismo de Recuperação e Resiliência.
Com a reprogramação, o número de investimentos sobe de 117 para 119, e o de reformas apoiadas continua a ser de 44. O número de marcos e metas a cumprir para a Comissão Europeia libertar as verbas do PRR diminuem de 463 para 438, segundo fez saber em abril o presidente da Estrutura de Missão Recuperar Portugal, Fernando Alfaiate, entidade responsável pela monitorização da execução do plano.
No arranque da audição, ainda antes das questões dos deputados, Castro Almeida garantiu que Portugal "vai executar completamente as subvenções do PRR", rejeitando a ideia de que o país esteja atrasado nesse domínio. "As coisas estão controladas", disse, sustendo que Portugal irá fazer o oitavo pedido de pagamento a Bruxelas dentro do prazo, tal como sucedeu no sexto e no sétimo pedido, ainda em avaliação na Comissão Europeia.
Fazer "justiça ao setor empresarial"
Ao longo da audição, o ministro elogiou as Agendas Mobilizadoras - "uma bela ideia" dos socialistas - e explicou que o mecanismo de salvaguarda traz várias vantagens. Não vai apenas "garantir a integral execução" do PRR, como "alargar o prazo de execução" que, reconhece, "está muito apertado, sobretudo quando envolve obras de construção civil", como se torna numa oportunidade de "fazer alguma justiça ao setor empresarial, que na programação inicial estava pouco dotado". O PRR, disse várias vezes Castro Almeida, "estava muito mais dirigido aos serviços do Estado do que às empresas", mas "temos a oportunidade de fazer alguma correção".
O ministro aproveitou para defender que a "inovação" é mesmo o "ponto forte da política económica" do executivo e avisou que "o país não vai crescer se não inovar mais e se não tiver mais investimento". Lembrou também que o rendimento dos portugueses só vão melhorar quando a competitividade das empresas aumentar.
"As empresas têm de inovar e alargar o seu mercado potencial, descobrir novos destinos para os seus produtos. Se estamos a vender sempre aos mesmos, a economia fica estagnada, e com a agitação causada pelas tarifas americanas, é mesmo preciso procurar mercados alternativos", considerou.
Referindo-se à reprogramação das Agendas Mobilizadoras feita pelo Governo, Castro Almeida disse que o executivo deu oportunidade aos diferentes consórcios de poderem "aumentar ou diminuir a ambição da respetiva agenda".
"Apresentaram-se a alterações 37 agendas mobilizadoras, envolvendo mais de 1.700 entidades, entre empresas, universidades, centros de investigação e etc (...) Na revisão que fizemos, reforçamos as agendas mobilizadoras com mais 319 milhões de euros, o que quer dizer que o valor que o PRR destina às agendas mobilizadoras já ultrapassa os 3 mil milhões de euros", contextualizou o ministro.
Nesse processo, destacou, "demos anuência à proposta de dois consórcios na área da engenharia aeroespacial e aeronáutica", justificando que "os nossos melhores estudantes estão a dirigir-se" para essa área que vai ter um "grande futuro em todo o mundo".
"Os nossos melhores estudantes corriam o risco de, acabados os cursos não terem emprego, estamos a criar um cluster aeroespacial e aeronáutico em Portugal para que os nossos melhores não tenham de sair de Portugal", disse, Castro Almeida, concluindo que o país quer "estar na linha da frente" neste setor.