Um quadro de topo das forças de defesa de Israel (IDF), admitiu, citado pelo jornal “The Times of Israel”, que se instalou naquele corpo militar uma cultura de “disparar primeiro e pergunta depois” – que é o mesmo que afirmar que as IDF têm recorrido ao assassinato em vez de fazerem perguntas.
A admissão ocorre após vários ataques a um comboio da World Central Kitchen na passada segunda-feira, que estava a viajar dentro do que deveria ser um corredor humanitário desmilitarizado. Sete funcionários do WCK morreram no local e diversos países – nomeadamente os de origem dos mortos – instaram Israel a investigar exaustivamente os acontecimentos.
O quadro das IDF, que falou evidentemente sob condição de anonimato, disse que aquelas práticas, que configuram pura execução de suspeitos, são usadas desde o final de dezembro, quando as tropas abriram fogo contra três reféns israelitas que conseguiram escapar do cativeiro e agitavam uma bandeira branca quando foram mortos.
Tanto esse incidente como o de segunda-feira, entre vários outros, representaram uma violação grosseira das regras que a IDF cumpria até então, disse a mesma fonte.
“Os soldados estão a operar sob imensa pressão, em condições muito difíceis nas quais o Hamas se insere na população civil, mas as regras são previstas para ajudar a lidar com tais condições, e muitas vezes são ignoradas”, afirmou.
Estas declarações vêm ao encontro da opinião de vários analistas, que têm afirmado que o aumento do perímetro do serviço militar motivou a desqualificação militar das tropas – que não estarão preparadas para agir em cenário de guerra permanente. O aumento do perímetro do serviço militar continua, entretanto, a ser praticado – o que é também uma causa possível para as dezenas de baixas que o exército israelita tem sofrido.
Entretanto, as explicações fornecidas pelo governo israelita sobre o que aconteceu ao comboio atacado pelos militares não convencem os países que exigiram uma investigação cabal ao sucedido. O chefe do governo espanhol, Pedro Sánchez, disse que as explicações fornecidas por Israel sobre a morte das sete pessoas que trabalhavam para a ONG World Central Kitchen são insuficientes e inaceitáveis, e exige mais detalhes.
O primeiro-ministro Benjamin Netanyahu caraterizou o sucedido como “um evento trágico em que as nossas forças atingiram involuntariamente não combatentes”. “Acontece na guerra”, acrescentou. Por seu turno, o chefe do Estado-Maior das IDF, Herzi Halevi, disse que o ataque se deveu a um “erro de identificação” feito em condições complexas de guerra.
“Tudo isto é inaceitável e insuficiente, e estamos a aguardar um esclarecimento muito mais forte e detalhado, após o qual veremos que ação tomar”, disse Sánchez em conferência de imprensa esta quarta-feira, durante uma visita ao Qatar. A World Central Kitchen foi fundada pelo hispano-americano Jose Andres.
Também o secretário-geral da NATO, Jens Stoltenberg, condenou a morte das sete pessoas da World Central Kitchen. “O que vemos em Gaza é uma catástrofe humanitária. Vemos sofrimento. Vemos que civis são mortos, e também vimos o ataque contra trabalhadores humanitários, e condeno o ataque”, disse Stoltenberg em Bruxelas, onde os ministros das Relações Exteriores da aliança se reuniram. Mas não se esqueceu de saudar o facto de Israel ter garantido que investigará o ataque – num cenário de guerra onde as condições de investigação não serão as melhores.