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Fed dividida quanto a subida de junho vê riscos ascendentes na inflação

Alguns membros queriam manter inalteradas as taxas em julho, mas a decisão de subir 25 pontos prevaleceu, colocando os juros de referência no máximo desde 2001. A incerteza continua a ser grande e mercado imobiliário preocupa, mas os medos de uma recessão causada pelo sistema financeiro parecem ter desaparecido.

As atas da reunião da Reserva Federal de julho mostram um painel de política monetária cauteloso e dividido quanto à necessidade de novas subidas, com alguns membros a defenderem que os juros deveriam ter ficado inalterados enquanto outros continuam incomodados com a inflação elevada.

O documento divulgado esta quarta-feira refere-se à reunião de julho, em que a autoridade monetária norte-americana voltou a subir os juros em 25 pontos base (p.b.), uma decisão largamente esperada pelos mercados. A taxa de referência ficou assim entre 5,25% e 5,5%, o valor mais elevado desde janeiro de 2001.

Do lado dos preços, e apesar da subida em julho, o indicador tem vindo a cair de forma sustentada, mas mantém-se acima do objetivo de 2% da Fed. A leitura mais recente revelou 3,2%, acima dos 3% de junho; já na core, há quatro meses seguidos que o subindicador cai, estando em 4,7%.

A “maioria dos membros do painel” do banco central continua a considerar que os riscos relativamente à inflação são claramente ascendentes, pelo que será necessário continuar a monitorizar os dados que forem sendo conhecidos, lê-se no documento. A possibilidade de novas subidas está, portanto, bastante em cima da mesa.

Outro aspeto no qual houve consenso foi na questão da incerteza. Com perspetivas ainda bastante variáveis, o Comité Federal de Mercado Aberto (FMOC, na sigla em ingês) reconhece que a própria política monetária tem efeitos cumulativos ainda desconhecidos e por se materializar na totalidade, aumentando a necessidade de cautela nesta altura.

O mercado imobiliário foi também discutido e parece preocupar o banco central, que fala em “riscos potencialmente associados com a desvalorização de imobiliário de retalho que podem afetar negativamente bancos e outras instituições financeiras”. Ainda assim, e comparando com minutas anteriores, os medos de uma recessão com origem no sector bancário parecem ter-se dissipado.

Também o banco ING destaca os sinais de fraqueza no mercado imobiliário, que registou na semana anterior um dos valores mais elevados este século para as taxas em contratos hipotecários a 30 anos de taxa fixa. O indicador chegou a 7,16%, igualando o máximo de outubro do ano passado – o máximo anterior a este foi em dezembro de 2001.

“Sem surpresa, a procura por hipotecas cai novamente”, aproximando-se do mínimo de fevereiro, que compara apenas com valores registados em 1995, quando “a população era de menos 70 milhões de pessoas” nos EUA, sublinha o banco neerlandês.

A análise do banco ING junta-se assim à Goldman Sachs, ao levantar a possibilidade de cortes de taxas já no próximo ano, mas deixa um alerta: ao baixar juros, a Fed pode “desamarrar oferta reprimida que pode ser o catalisador de novas quedas de preços no próximo ano”.

Retalho dá uma forte ajuda

Os dados do retalho foram conhecidos terça-feira e dão força à possibilidade de uma ‘aterragem suave’, crescendo mais do que o projetado em termos homólogos e em cadeia. Os consumidores norte-americanos continuam com mais resistência à subida de custos do que se esperava e podem mesmo assegurar um crescimento de 3% este trimestre, embora as dificuldades estejam à porta.

O mercado esperava um crescimento de 0,4% em cadeia, mas o retalho norte-americano cresceu 0,7% em julho, além de ter visto os dados de junho revistos em alta por 0,1 pontos percentuais (p.p.) para 0,3%. Em termos homólogos, foi um avanço de 3,2%, o maior em cinco meses e acima da projeção de 1,5%.

O Prime Day da Amazon parece ter tido um impacto considerável, mas os ganhos foram transversais a outras categorias como a restauração e bares, vestuário e bens alimentares. Estes ganhos “colocam os EUA em linha para reportar um crescimento anualizado de 3% no terceiro trimestre”, considera o banco ING, mas o final do ano vai ser mais complicado.

A subida dos custos de financiamento irá dificultar o consumo de boa parte das famílias norte-americanas, sobretudo dado que as poupanças acumuladas durante a pandemia já estão perto de esgotadas, o que também pesará no crescimento este ano. O mercado imobiliário é, claro, o mais vulnerável, mas o sector de compra e venda de veículos e os créditos de consumo também sofrerão.