A avaliação bancária na habitação voltou a subir em dezembro, interrompendo dois meses consecutivos de recuos numa altura em que o mercado começa a incorporar a expectativa de cortes de juros pelo Banco Central Europeu (BCE) ainda na primeira metade do ano. Por outro lado, a incapacidade da economia em fazer crescer a oferta leva a que o preço ajuste, dando seguimento à subida dos preços, explicam os especialistas.
O metro quadrado na habitação subiu seis euros em dezembro do ano passado, passando assim a 1.536 euros e interrompendo dois meses consecutivos de recuos no indicador. O aumento foi transversal ao país quase todo, com exceção apenas para a região dos Açores, e reflete sobretudo dois efeitos, explica Paulo Caiado, presidente da Associação de Profissionais e Empresas de Mediação Imobiliária (APEMIP): o não crescimento da oferta e a expectativa de normalização em breve da política monetária.
O representante do sector relembra que a oferta se tem mantido praticamente constante, não havendo um salto considerável apesar de uma “procura crescente”. O resultado é previsível – o ajuste é feito pelo preço, que voltou assim a subir.
“Quando temos várias entidades a concorrer para uma mesma solução, a tendência é que o preço, fruto dessa concorrência, suba. Isto é muito elementar. E não assistimos a nenhuma alteração destes fluxos”, expõe Paulo Caiado.
Por outro lado, a descida da inflação e os medos de uma recessão têm vindo o mercado a apostar com cada vez mais força num corte de juros diretores na zona euro ainda antes do verão, uma possibilidade que a própria presidente Lagarde não excluiu nas suas declarações ao longo do último mês. Vera Gouveia Barros, economista especialista em habitação, identifica aqui algum impacto desta expectativa no sector imobiliário nacional.
A subida em dezembro “reflete algum dinamismo do mercado, que vai já introduzindo a parte das descidas das taxas de juro do BCE”, argumenta a economista. Ainda assim, “essa hipótese já estava incorporada nas taxas Euribor, que na verdade são as relevantes para a concessão de crédito”.
“Havendo uma expectativa de redução das taxas de juro, acredito que isso se vai traduzir num com incremento da confiança em enfrentar novas aquisições”, projeta Paulo Caiado para a primeira metade deste ano, falando, portanto, em “boas expectativas” para o sector.
Os dados divulgados pelo INE esta segunda-feira mostram uma subida de 5,3% em termos homólogos, ligeiramente menos do que os 5,6% verificados em novembro. A Madeira registou a subida mais expressiva em comparação com igual mês do ano anterior, com 15,5%, ao passo que Lisboa liderou na análise em cadeia com 2,1% de subida.
Efeito riqueza vs. efeito exclusão
Há, no entanto, outro fenómeno a destacar: o efeito riqueza criado pela subida dos preços da habitação. Dado que os bens imóveis são o principal ativo das famílias, a sua valorização traduz-se também numa subida da sua riqueza, o que diminui a necessidade de financiamento aquando da aquisição de outro imóvel.
“Só isso justifica que, em 2023, o mercado residencial tenha transacionado em torno dos 28 mil milhões de euros e a banca tenha financiado pouco mais de 50%. Não é porque as pessoas tenham dinheiro guardado. Não é nada disso, é porque a principal alavanca financeira do sector imobiliário residencial é oriunda dos proveitos da venda de casas”, ilustra o presidente da APEMIP. E, no ano passado, “92% das casas transacionadas eram usadas”, completa.
Assim, o problema na habitação prende-se sobretudo com um “efeito exclusão” para aqueles que ainda não estão inseridos no mercado, ou seja, para quem quer adquirir a primeira casa. Para as famílias que já detêm uma habitação, nunca a “dotação financeira tinha sido tão significativa como neste momento”.
De acordo com o INE, em 2023, o valor mediano de avaliação situou-se em 1.521 euros por metro quadrado, traduzindo um aumento de 8,6% relativamente ao ano anterior.