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“Empresas devem preocupar-se em entender os próprios dados”

Sérgio Gaio, ‘associate director’ da Accenture Technology, defende que a tendência no sentido de bens e serviços cada vez mais personalizados pode ser positiva sobretudo para os setores da indústria.

Mais de 80% dos executivos acredita que integrar a customização e entregar em tempo real os bens ou serviços que a sua empresa oferece será a próxima vantagem competitiva. Os autores do estudo “Tech Trends 2019”, elaborado pela Accenture Technology, chamam-lhe o “mercado do momento”, que é considerado tanto uma arte como uma ciência.
Sérgio Gaio, associate director da consultora, afirma que a hiperpersonalização deve ser a seguida pelas organizações que pretendem responder melhor aos seus clientes. “Com a digitalização, os clientes estão a mudar as suas exigências, tanto os B2B como os B2C, empresariais e pessoais. A arte de captar o momento certo em que temos de interagir com eles e no qual aceitam a apresentação de um novo produto e serviço é na realidade o grande desafio e a grande oportunidade”, diz ao Jornal Económico.
A tendência – vista como pós-digital – é destinada a todas as indústrias, mas poderá ser especialmente benéfica nas indústrias.
“É cross-industry, sendo que na área da produção é onde trará maior eficiência às empresas e também melhores resultados. Por exemplo, a General Motors tem numa fábrica uma impressora 3D para imprimir peças que falham na produção. Por apenas três dólares, consegue-se substituir uma peça que, a comprar, custaria três mil dólares”, exemplifica Sérgio Gaio.
Na prática, a ideia transmitida pelos especialistas da Accenture no relatório é que a Internet das Coisas ou o machine learning têm de ser aproveitados para exceder as expectativas dos clientes, mais do que apenas saber responder-lhes. Ou seja, utilizar a inteligência artificial (IA) para perceber comportamentos e preferências pessoais, com o intuito de alterar as vendas em função disso. “Quem usa a Netflix e o Uber já sente que, quando vai a essas aplicações, tem uma experiência em que lhes são apresentadas coisas de que gostam. Os algoritmos vão ter de ir aprendendo conforme vamos evoluindo e vamos usando mais”, refere Sérgio Gaio.
O foco no gosto particular de consumidor pode até ser levado ao extremo. É o caso da Paper Boat, uma empresa indiana de bebidas e alimentos que altera os sabores dos produtos consoante a região em que são vendidos e tem até alguns que são produzidos apenas durante três dias por ano. Além disso, utiliza a WhatsApp para perguntar aos clientes a opinião sobre os mesmos e, consoante essas sugestões, altera a produção.
“Há mercados que têm diferentes velocidades, mas hoje em dia também já se está a sentir em Portugal essa hiperpersonalização. Olhando para o país, as grandes empresas estão no comboio da frente, porque têm mais capacidade financeira e uma predisposição maior para entra neste mundo”, refere, acrescentando que, ainda assim, as PME também têm acesso a um conjunto de ferramentas que a Amazon, a Google ou a Salesforce disponibilizam para esse efeito.
No entanto, para que um algoritmo seja fidedigno a base de dados da empresa que o cria ou usa também tem de ser bastante forte.
Questionado sobre quando é que é uma decisão inteligente e útil implementar IA para prever atitudes, Sérgio Gaio aconselha as empresas a olharem para os dados dos clientes que já possuem e procurarem perceber se os estão a utilizar da melhor maneira. A partir daí, poderão concluir se têm a informação necessária para criar um serviço customizado.
“Se olharmos para a IA e para os dados, grande parte das empresas deveria, numa fase inicial, preocupar-se em entender os seus próprios dados, aqueles que têm atualmente. Até aqueles que têm atualmente não os estão a usar da melhor forma. Não estão a fazer uma análise de previsão destes mercados instantâneos”, sugere.
O responsável da Accenture Technology defende que deve existir um compromisso por parte dos clientes e das empresas para que este contrato de «eu vou perceber o fazes e oferecer-te aquilo de que gostas sem pedires» seja positivo e mantenha a fidelidade entre as partes. “É o outro lado da moeda. Para oferecerem produtos e serviços personalizados, as empresas têm de ter acesso à informação, e os clientes, quando subscrevem um serviço, têm de ter noção de que o estão a subscrever e, ao mesmo tempo, saber que estão a comprometer alguma da privacidade”, clarifica Sérgio Gaio. 

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