É com "interesse" que a gestora de ativos Arrow Global olha para o mercado imobiliário português e em particular para vários projetos de habitação a custos controlados. No entanto, este é um segmento que por via dos aumentos dos custos da construção e falta de mão-de-obra qualificada coloca dificuldades na hora de investir.
"É difícil hoje em dia fazer um projeto de habitação a custos controlados face aos custos de construção que existem. Isso é um problema e levamos horas à volta disso. Temos interesse até junto das municipalidades onde temos projetos em criar um tipo de relacionamento que faça com que, do ponto de vista da nossa capacidade de agregar valor à comunidade, esse tipo de projetos faça todo o sentido", refere em declarações ao Jornal Económico (JE), João Bugalho, CEO da Arrow Global Portugal, que atualmente conta com quase duas mil pessoas a trabalhar no país e uma equipa de gestão 100% nacional.
O responsável assume que a matemática para este problema é difícil, mas que será uma questão para a qual Portugal vai ter de encontrar uma resposta. "A habitação é um tema difícil, não só em Vilamoura, mas noutras geografias também dentro do país. Portugal tem uma falta de casas novas, brutal. Não há oferta de casas. Essa é uma das razões para que os preços também tenham subido da forma que têm subido", afirma. No caso da ausência de mão-de-obra qualificada João Bugalho entende que é preciso dar uma resposta, mas que não é o particular que a consegue dar. "Acho que o Governo tem que ajudar também nesse sentido. Está a fazer o que pode", realça.
Com três projetos em comercialização e um conjunto de cerca de seis projetos para lançar nos próximos seis meses, a Arrow espera investir até 2026 uma verba a rondar os 500 milhões de euros na região Vilamoura, onde até ao momento colocou um montante de 400 milhões de euros entre a compra original, e o Capex que já foi colocado entre os diferentes ativos. "O ano passado vendemos cerca de 30 unidades. Este ano já estamos nas 50 e vamos com certeza chegar quase às 100. Para o ano a nossa ambição é vender 200, ou seja, há aqui um ritmo sucessivo de multiplicação da nossa dimensão", explica ao JE, Pedro Reimão, CEO da Vilamoura World.
Em relação às nacionalidades o CEO destaca que mais de metade do produto imobiliário vendido desde o princípio do ano foi a clientes portugueses. "Historicamente o comprador do Algarve é inglês, mas em Vilamoura houve sempre um grande peso dos portugueses. Mas o desafio é de uma dimensão tal que torna indispensável não só acarinharmos obviamente, essa nossa penetração do mercado português como complementarmos essa dimensão que queremos manter com clientes de outros mercados de origem, incluindo os suspeitos do costume no Reino Unido e Irlanda, norte da Europa, mas também Espanha e França", explica.
Além dos "suspeitos do costume", Pedro Reimão destaca também outros mercados emergentes como os Estados Unidos e Canadá, frisando que Portugal continua a ser o principal país de origem dos clientes. "Estamos com 50% a 60% de portugueses dependendo dos projetos. A seguir continua a ser o Reino Unido", salienta.
Novo aeroporto. "Nada disto ajuda a imagem de Portugal no exterior"
Pelo facto de ser uma região muito procurada por clientes e turistas estrangeiros, a questão do aeroporto é um tema que impacta também o mercado imobiliário algarvio, onde o aeroporto de Faro não tem ligações diretas para quem vem dos Estados Unidos, ao contrário do que sucede com quem viaja do Brasil ou Canadá.
"Os americanos têm duas semanas de férias e nessas duas semanas estão disponíveis para gastar o mesmo ou se calhar mais do que os europeus gastam em quatro, mas querem conveniência, facilidade. De repente, se em duas semanas houver dois dias de viagens para vir e voltar não faz muito sentido", refere João Bugalho. Um sentimento que é partilhado por Pedro Reimão. "É uma limitação óbvia para todo o Algarve, não é só para Vilamoura", afirma.
Sobre o processo da localização do novo aeroporto o CEO da Arrow Global, considera que "nada disto ajuda a imagem de Portugal no exterior. Um turista que está a marcar férias e vê na televisão que há uma greve, isso inevitavelmente pesa nas decisões das pessoas", acrescentando que no final do dia os turistas querem vir para cá. "Portugal têm uma condição geográfica absolutamente única, até pelo contexto internacional que vivemos, estamos longe dos problemas mais centrais que a Europa está a viver. Somos um país seguro", realça.
Por sua vez, Pedro Reimão assume ainda assim que estas condicionantes não impedem que o trabalho continue a ser desenvolvido. "A grande questão é quão melhor poderia ser se esses temas estivessem fora do caminho, com a resolução do problema do aeroporto de Lisboa e com as ligações diretas a aeroporto de Faro", sublinha.
Licenciamentos e fim dos Vistos Gold. "Qualquer alteração é perturbadora de confiança e até de fiabilidade"
Outro dos temas que mais problemas levanta na hora de avançar com um projeto imobiliário é o longo processo de licenciamento e que de acordo com João Bugalho acabam "sempre" por ter impacto. "Acho que há uma enorme boa vontade por parte do município, da câmara para nos apoiar, o tema não se coloca nessa frente, mas há de facto, uma máquina administrativa subjacente a estes processos que não ajuda", refere, acrescentando que torna-se complexo explicar ao cliente internacional, porque é que alguns projetos, que teoricamente faria todo o sentido avançar acabam por ter vários atrasos. "Nós não podemos dizer que vamos demorar 12 meses e depois quando demoramos 18 vir explicar porque é que isso acontece", afirma.
O CEO da Arrow Global em Portugal salienta que existe uma enorme disparidade dentro do país na forma como algumas câmaras conseguem responder ao tema do licenciamento, dando os exemplos do Porto e Lisboa. "O Porto é uma máquina, Lisboa tem dificuldade. Isso não ajuda", realça.
Uma das medidas que mais impactou o mercado imobiliário desde 2022 foi o fim dos Vistos Gold. Para João Bugalho este tipo de situações tem sempre impacto pelo facto de "qualquer alteração é perturbadora, de uma espécie de continuidade e de confiança e até de fiabilidade. O sentido desta alteração é negativo", refere.
Para o CEO uma das consequências do fim dos Vistos Gold são as restrições ao Alojamento Local. "Como o que aqui vendemos são primeiras habitações, mas também segundas, a perspetiva de rendimento é sempre interessante e os nossos compradores querem saber como é que podem rentabilizar as suas propriedades fora do tempo em que estão a usar diretamente. Dito isto, como é óbvio, o que nós gostávamos mesmo é que houvessem soluções concretas para o problema da habitação que nós próprios podemos contribuir para resolver. E gostávamos que houvessem condições ideais e estáveis que nos permitissem evitar estes sobressaltos", sublinha João Bugalho.
Questionado sobre quais seriam essas soluções mais urgentes, o CEO defende que valia a pena discriminar profundamente as circunstâncias de centros urbanos como Lisboa e Porto, em relação aos quais há problemas específicos de zonas iminentemente turísticas como estas do Algarve em geral, e de Vilamoura em particular.
"Nesse sentido, era óptimo que se pudessem discriminar melhor, facilitando as abordagens ao país. Para alguns sectores da sociedade existe alguma fobia contra os estrangeiros comprarem em casa e então é tudo feito à volta disso, esquecendo-se tudo o que acontece à volta do ecossistema dos estrangeiros. O peso dos compradores internacionais é marginal no cômputo geral das vendas em cidades como Lisboa e Porto ou outros centros urbanos. Quando se fala em Lisboa e Porto é o centro", explica.