A consultora brasileira FCamara, que está presente em Portugal e trabalha com a Farfetch no desenvolvimento digital do marketplace de moda, foi impactada pela mudança na estrutura acionista da tecnológica, mas vai manter os contratos que tem em curso mesmo com os novos donos da empresa, a Coupang.
“Vamos manter o contrato. Isso já está certo, mas com alguns recortes. Vamos ser impactados. Acreditamos que, no segundo semestre, já estaremos mais fortes. Independentemente da empresa, quando se entra em crise sem uma recuperação judicial ou insolvência – e aqui ‘raspou a barriga no asfalto’ – as operações vêm daí mais fortes e reposicionam-se. Não tem como não investir”, diz ao Jornal Económico (JE) o diretor geral da FCamara Europe.
Publicamente, a FCamara nunca admitiu que tinha negócios com a Farfetch, embora reconhecesse que tinha um “unicórnio do e-commerce” na lista de clientes. Entre os sete de Portugal, tecnicamente, só há um de e-commerce: a Farfetch. Então, como é que a FCamara está a lidar com o processo de resgate do primeiro unicórnio nacional? “Não lidámos. Estamos lidando. Ainda tem de ser assim, no gerúndio”, responde Angelo Tonin.
“É um momento complexo e estamos a dar todo o nosso apoio. No Brasil sempre foi uma montanha-russa e estamos muito habituados a estas situações. Está no nosso ADN e não é novidade para nós. Ainda agora aconteceu algo parecido com uma grande retalhista brasileira no valor de 10-12 mil milhões”, conta.
Para o especialista em integração tecnológica e inovação aberta, se uma empresa – neste caso, sul-coreana – apostou na Farfetch significa que existe potencial de crescimento, portanto esta equipa continuará também a prestar o seu auxílio através de soluções/serviços.
“Se alguém colocou dinheiro, acreditou, tem de se investir. Há uma brincadeira que dizemos no Brasil: é um freio de arrumação. Se o autocarro está cheio, no Rio de Janeiro, o motorista dá uma pisadela forte no travão e cabem mais uns dez. É mais ou menos o que se passa aqui. É o momento de fazer ajustes e continuar”, comparou o gestor de São Paulo.
No verão, a multinacional brasileira instalou um novo hub em Carnaxide, no complexo de escritórios World Trade Center Lisboa, e adquiriu duas empresas (Play Studio e SGA). No âmbito da entrada na zona da capital portuguesa, tornou-se membro do programa “Elite”, da World Trade Center Lisboa International Academy, para auxiliar empresas na internacionalização, sustentabilidade, empreendedorismo e acesso ao mercado de capitais.
“A FCamara, por ser um projeto com uma certa musculatura, tem uma característica muito forte que é a flexibilidade, que lhe permite tentar trazer propostas que ajudem. Sabemos que todas as empresas passam por dificuldades, mas fazemos sugestões para conseguirmos manter a relação [com os clientes] e até fazê-la crescer”, sublinhou Angelo Tonin.
Obviamente, este tipo de clientes grandes causam um frio na barriga, um frisson [calafrio], mas há outros projetos a caminho de fechar.
Os mercados da Europa, Médio Oriente e África são o principal foco da operação na Europa (Lisboa, Leiria e Londres) emprega 70 pessoas em regime de trabalho híbrido. No entanto, estes profissionais estão a desenvolver projetos de digitalização para organizações em Portugal, nos Estados Unidos, no Reino Unido e nos Países Baixos. “Estamos próximos de fechar clientes em Espanha e na Suíça. É um projeto grande”, revela ainda o diretor geral da FCamara Europe ao JE. Globalmente, o grupo emprega 1.300 colaboradores em diversos países.
“Apesar do contexto mundial, das guerras na Europa e no Médio Oriente, acho que a perspetiva é boa. Acredito que vamos crescer de uma forma bastante consistente. Há alguns sinais de arrefecimento, mas o emprego da tecnologia não tem volta atrás. As empresas, para conseguirem sobreviver e crescer, precisam de implementar e investir em tecnologia. É um caminho irreversível”, conclui.