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CEO da Portocargo alerta que prolongamento da situação do Mar Vermelho vai provocar "aumento de custos brutais" do transporte marítimo

A Portocargo foi fundada em 1990 tendo como foco o transporte marítimo para o mercado asiático, em concreto a China. A empresa, dirigida por Mário de Sousa, foi crescendo e hoje interage com 162 países, espalhados pela Europa, Ásia, Américas, e África. As perturbações que se fazem sentir no Mar Vermelho, que leva a que quase nenhum navio lá passe, salienta o CEO da Portocargo, têm colocado pressão no setor, tendo em conta que os navios são obrigados a percorrer uma maior distância, o equivalente a mais quatro mil quilómetros. A incerteza provocado pelas tarifas, que têm sido defendidas pelo governo norte-americano, são outro fator que também preocupa o setor.

A Portocargo, que tem atualmente 44 trabalhadores e que em 2025 espera faturar os mesmos 36 milhões de euros do ano anterior,  possui uma vasta história no transporte de carga por via marítima. A aventura começou em 1990 no mercado asiático, com o mercado chinês. O negócio foi florescendo e atualmente a empresa portuguesa, que tem Mário de Sousa como CEO, tem ligação com 162 países, e já inclui na sua oferta de serviços o transporte aéreo.

As dores da atualidade do negócio, e que também se estendem ao setor, como descreve Mário de Sousa, em entrevista ao Jornal Económico (JE), passam pelas perturbações que se verificam no Mar Vermelho (o canal do Suez está a ser pouco utilizado pelas empresas para o transporte de cargas devido a fatores como os ataques de rebeldes Houthis), levando a que a carga transportada para o mercado asiático tenha que percorrer uma maior distância o que coloca maior pressão sobre os preços. O prolongar da situação, alerta o CEO, vai provocar um "aumento de custos brutais" do custo marítimo.

A história da Portocargo começa em 1990 tendo o Extremo Oriente como foco principal, numa fase em que a China "não estava aberta ao mundo", recorda Mário de Sousa.

"Nem as fábricas tinham autorização para exportar os seus produtos. Os produtos eram colocados em zonas logísticas de Hong Kong. Os potenciais clientes nem visitavam a China. Fomos pioneiros em fazer transportes diretos da República Popular da China, sem passar pelos tais postos intermédios e centros logísticos de Hong Kong e de Taiwan", descreve o CEO da Portocargo.

Isto, salienta Mário de Sousa, acabou por dar à Portocargo "uma posição no mercado de liderança destacada" porque nesse tempo a atividade transitária "estava muito concentrada no transporte rodoviário e na relação com os países europeus com os quais Portugal até hoje ainda mantém uma grande concentração do comércio exterior com cinco ou seis países, que representam 75% do nosso comércio externo".

A expansão no mercado asiático da empresa portuguesa foi continuando, abrangendo os chamados países tigres asiáticos (Coreia do Sul, Taiwan, Singapura e Hong Kong). "Crescemos para esses países todos no sudeste asiático", reforça Mário de Sousa.

Mas o aumento da concorrência, que começou a ver as potencialidades do mercado asiático, no que diz respeito ao transporte por via marítima, levou a que a Portocargo tivesse que olhar para outros mercados para continuar o seu crescimento.

Nos finais da década de 1990 a empresa portuguesa chega aos mercados da América do Norte e Brasil e no início da década de 2000 faz a estreia em África. Depois veio o transporte aéreo.

"Começamos a sentir mais concorrência porque o mercado europeu não era suficiente para a quantidade de operadores transitários. [...] Sentíamos necessidade de crescer e nos desenvolver. Acabamos por crescer para África e também para a América do Norte e Brasil. E hoje temos movimentos de importação/exportação por via marítima/aérea com 162 países", descreve Mário de Sousa.

A interação com 162 países trouxe os seus desafios para a Portocargo, como elenca o CEO da empresa.

"Sendo uma empresa só existente em Portugal temos que ter parceiros que nos representem e que nós representamos nos países com os quais queremos trabalhar. Não podemos oferecer um serviço a um cliente numa fábrica situada no Myanmar se não tivermos lá um parceiro com quem trabalhamos, que conheça o nosso modus operandis e que vai seguir as instruções que lhes transmitimos", explica Mário de Sousa.

CEO alerta para situação no Mar Vermelho

A questão geopolítica acaba por assumir relevo numa empresa como a Portocargo que está exposta a 162 países.

"Qualquer disrupção provocada por conflitos geopolíticos ou uma guerra aberta afeta a nossa atividade de imediato", descreve o CEO da Portocargo.

"Desde a pandemia já sentimos uma complexidade brutal nas operações. A guerra entre a Rússia e a Ucrânia não teve grande impacto na nossa atividade porque não tínhamos um movimento significativo com estes países", acrescenta.

Além destes acontecimentos as perturbações que se fazem sentir no Mar Vermelho [Canal do Suez] estão a pressionar fortemente a atividade da empresa dirigida por Mário de Sousa.

"Atualmente quase nenhum navio lá passa [Mar Vermelho] com raríssimas exceções. Têm todos que fazer o percurso via África do Sul, Cabo da Boa Esperança. E isso veio criar problemas brutais porque o tempo de trânsito alongou-se. [A distância] aumenta quatro mil quilómetros. Isto faz com que a frequência dos navios seja menor. O tempo que demora a ida e volta à Ásia é maior. Ou temos muitos mais navios, ou muito mais contentores, ou então há ali um período de diminuição da frequência e a oferta de disponibilidade diminui drasticamente", diz Mário de Sousa.

A se prolongar as perturbações no Mar Vermelho, fazendo com que os navios tenham que continuar a procurar soluções alternativas, isso terá como consequência "entropia e aumento de custos brutais do custo marítimo", alerta o CEO da empresa portuguesa.

"A questão do Mar Vermelho é importante para nós e para aqueles que produzem, compram, ou vendem produtos na Ásia e parte do Médio Oriente", diz Mário de Sousa.

Portocargo alerta que tarifas criam incerteza

A questão das tarifas, que têm sido determinadas pelos Estados Unidos, a vários parceiros comerciais, no entender de Mário de Sousa "vai dificultar e cria grandes dúvidas". Lembre-se que os Estados Unidos aplicaram uma tarifa de 15% às importações vindas da União Europeia.

Mário de Sousa considera que as incertezas que se possam gerar pelos Estados Unidos (o presidente norte-americano por diversas vezes avançou e recuou na percentagem de tarifa que iria aplicar a determinados parceiros comerciais), no que diz respeito às tarifas, faz com que aumentem as dificuldades ao nível da tomada de decisões das empresas.

"Não posso colocar em produção uma mercadoria num determinado país que hoje tem livre circulação e que de um momento para o outro os Estados Unidos decidem aplicar uma tarifa elevada, fazendo com que esse produto deixe de ser competitivo no mercado. [...] E depois há a questão do tempo que passa entre a encomenda, a execução, e o seu transporte, e a chegada ao destino, que se alongou muito. Devido ao aumento do tempo de viagem, os conflitos, e a dimensão dos navios é preciso mais capital e maior volume de stocks", revela Mário de Sousa.

As "dúvidas e incertezas" que têm surgido com as tarifas, explica o CEO da Portocargo, leva a um "afrouxamento das transações".