As promessas eleitorais custam dinheiro e as que Luís Montenegro fez aos polícias e professores vão custar um aumento de pelo menos 220 milhões no Orçamento do Estado de 2024 (OE-2024), mas sem necessidade de um orçamento retificativo. Sem incluir, claro, o que poderá resultar das reuniões com os oficiais de justiça e com os profissionais da saúde, nomeadamente médicos e enfermeiros, cujas reivindicações deverão afetar apenas os orçamentos dos próximos anos, se forem aprovados.
Ao JE, fontes próximas do Governo admitem que aquele valor possa cobrir as promessas eleitorais para este ano, sem, contudo, o assumirem oficialmente, com o pretexto de não prejudicarem as duras negociações que se avizinham.
Os 220 milhões são estimados no pressuposto de que poderá haver acordo relativamente à reposição de 20% do tempo integral de serviço dos professores, o que já foi proposto às organizações representativas do sector. O Governo estará também a contar que esta reposição, e os suplementos, não sejam aplicados retroativamente a 1 de janeiro de 2024, mas vigorem apenas a partir do segundo semestre.
O cenário é semelhante nas forças de segurança – incluindo as Forças Armadas, porque o Governo não vai arriscar deixá-las de fora – no que diz respeito à atribuição de um subsídio de risco igual ao que o anterior Executivo decidiu para a Polícia Judiciária (PJ). O atual Governo conta que esta medida, alargada às forças de segurança e às Forças Armadas, também comece a vigorar apenas no segundo semestre.
“Assim, tomando como base os cálculos já divulgados pelo Governo, atualizando-os e estendendo a atualização do complemento de risco também às Forças Armadas, o aumento da despesa para apenas meio ano determinaria um custo adicional para o OE-2024 que estimo em cerca de 220 milhões”, explica ao JE o economista Eugénio Rosa.
Balizando as parcelas, o economista considera que “65 milhões de euros sejam dirigidos para a reposição de 20% do tempo de serviço dos professores, 100 milhões para atualização do complemento de risco das Forças de Segurança e o resto para as Forças Armadas”. Contudo, este é o valor ilíquido, antes do pagamento do IRS, que fica na totalidade no Estado.
“Se deduzirmos o IRS, o aumento da despesa efetiva reduz-se para cerca de 200 milhões”, observa Eugénio Rosa, sublinhando: “Trata-se de um “valor que me parece perfeitamente comportável a nível da despesa aprovada no OE do PS para 2024”. E adianta: “Isto, porque o Ministério das Finanças tem no seu orçamento uma verba para fazer face a imprevistos como este que, em 2024, é de 503 milhões euros.
Rosa lembra que nesta rúbrica, em 2023, foram gastos apenas 91 milhões de euros, segundo o relatório do OE2024.
Ao que o JE apurou, estes números coincidem com os do Governo, só os não admitindo por receio de prejudicar as negociações com os sindicatos.
A adição à despesa, por causa das mais emblemáticas promessas eleitorais, rondaria, assim, os 200 milhões, depois de deduzido o IRS dos funcionários. Este valor tem consistência prática no pressuposto de que não existem valores acordados com o Executivo relativamente à Saúde e à Justiça com impacto já este ano, devendo a negociações com este sectores surtir efeitos apenas no OE para 2025, que começará agora a ser preparado. Mas, há nuances que poderão atirar os números muito mais para cima, para lá dos 300 milhões.
Administração Interna
A negociação com as forças de segurança deverá ser complicada, porque as partes vão partir de diferentes pressupostos. O MAI tem previsto atualizar o suplemento de risco com efeitos a partir do segundo semestre, enquanto a Plataforma, composta por sete sindicatos da Polícia de Segurança Pública (PSP) e por quatro associações da Guarda Nacional Republicana (GNR), que vai negociar em bloco o suplemento de risco, já esclareceu que pretende ver os seus elementos a serem tratados exatamente da mesma forma como o anterior Executivo tratou a PJ. Ora, os inspetores no final de 2023 receberam aquele suplemento com retroativos a 1 de janeiro.
Os polícias e guardas vão partir para as negociações com este dado: para haver equidade, a retroatividade para as forças de segurança terá de recuar até à mesma data. Se ganharem o braço de ferro com o Governo, os 200 milhões vão galopar.
Acresce, a isto, a pressão já iniciada pela Plataforma. Por um lado, vai exigir que seja a ministra Margarida Blasco a avançar com propostas concretas sobre o subsídio de risco, cabendo-lhe o papel mais cómodo de, depois de discutir internamente, sabendo-se da dificuldade de um consenso interno nesta matéria, dizer se concorda ou não.
Esta quarta-feira, note-se, a Plataforma emitiu um comunicado a lamentar não ter recebido ainda do MAI a indicação da hora para a reunião de dia 22 e a informar que solicitou à ministra uma proposta para atribuição do suplemento de missão. E avisou: “A Plataforma (enquanto tal) não deixará de reagir à proposta do Governo, acaso os pressupostos que sustentam o suplemento de missão na PJ, não sejam assumidos e valorados de igual forma na PSP e na GNR.”
Por outro lado, os chamados movimentos inorgânicos que nestas alturas sempre emanam do seio das forças de segurança, com os quais os sindicatos dizem não se identificar, já começaram também a passar mensagens anónimas para o exterior. Nesta quinta-feira, foi lançado o apelo, caso não haja um acordo até 10 de maio, ao boicote de iniciativas nos dias 11 e 12 de maio, fim de semana em que decorre o Rally de Portugal e vários jogos de futebol da I Liga. Margarida Blasco, que neste dossier será acompanhada pelo secretário de Estado Telmo Correia, terá a vida bastante complicada.