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Banca atrai novos clientes com vales, cashback e spreads zero

Os bancos estão a tentar captar novos clientes, oferecendo vouchers e isenção nas comissões de manutenção para quem abrir conta, mas também a suportarem os custos nas transferências de crédito e a darem spreads zero nos créditos da casa. O sector admite o aumento da concorrência, mas afasta que se estejam a assumir demasiados riscos.

Os bancos nacionais estão numa missão para atrair novos clientes. Isto está a ser feito através do lançamento de campanhas com condições atrativas, dando vouchers na abertura de conta, isenção da comissão de manutenção durante um ano, disponibilizando transferências de crédito sem custos para o cliente ou apostando no regresso de spreads zero nos empréstimos para a compra de casa. Um aumento da concorrência admitido pelo sector para tentar contrariar a diminuição da procura por crédito perante uma subida das taxas de juro ainda sem fim à vista. 

Há campanhas para todos, em praticamente todas as instituições financeiras nacionais. O BPI está a dar um voucher Worten, válido até ao final do ano, de 60 euros ou de 10% de desconto numa compra à escolha para os clientes com menos de 30 anos que abram uma conta para domiciliar o ordenado. Isto enquanto o Santander Portugal está a oferecer 12 meses de isenção de comissão numa conta online aberta até ao final de agosto. No Novobanco, a abertura de conta com domiciliação do ordenado “dá” um cashback de 10% sobre um máximo de 200 euros por mês em compras com cartão de crédito em supermercados e gasolineiras. 

As campanhas visam captar clientes, jovens ou menos jovens, muitos deles de outros bancos, criando uma base de potenciais clientes de crédito. E também há estratégias comerciais mais agressivas para tentar captar créditos de outros bancos. “A transferência de crédito habitação para o Novobanco é a oportunidade de reduzir a prestação mensal do seu crédito”, refere o banco liderado por Mark Bourke no seu site, suportando os custos de transferência e prometendo “acesso a novos spreads competitivos”, numa altura em que são várias as instituições a ajustar as suas taxas. 

A Caixa Geral de Depósitos (CGD) tem em vigor uma campanha de crédito a taxa fixa de 3,75% nos primeiros dois anos. “A Caixa procura ter a todo o momento uma oferta atrativa nos variados produtos que disponibiliza, ajustando-a permanentemente”, afirma fonte oficial do banco estatal. 

Nas ofertas a taxa variável, o BCP foi ainda mais longe, marcando o regresso dos spreads zero. “Até 31 de dezembro de 2024, o Millennium não cobra o valor dos juros correspondentes ao spread contratado em novos créditos até 30 de setembro de 2023 e desde que contratados com vendas associadas facultativas e com conta à ordem no Millennium”, de acordo com o site do banco liderado por Miguel Maya.

Queda do crédito traz maior concorrência

“Historicamente, o sector bancário sempre se caracterizou por um elevado dinamismo em campanhas de captação de clientes particulares. Nos últimos anos, essa concorrência tem sido notória não apenas na redução expressiva dos spreads oferecidos no crédito habitação, mas também no lançamento de programas destinados a novos clientes”, afirma fonte oficial do Novobanco. Esta tendência voltou a ganhar força no último ano. “Há um mercado a funcionar e é positivo que haja maior concorrência, porque beneficia o consumidor”, refere o BPI. 

Para Filipe Garcia, “isso sucede por dois motivos: por um lado, há menos novas operações de crédito, com os volumes mensais de novas operações a caírem há cinco meses consecutivos, pelo que os bancos lutam por essas operações, até para utilizar a sua capacidade instalada nesta matéria”. Por outro lado, nota o economista da Informação de Mercados Financeiros (IMF), “a diferença entre as taxas ativas e passivas continua a aumentar, o que dá espaço aos bancos para descerem o spread sem diminuírem a rentabilidade”. 

Esta quebra no crédito ficou visível nos resultados trimestrais dos grandes bancos. Na CGD, a carteira de crédito a clientes diminuiu 0,5% entre o final do ano passado e o primeiro trimestre deste ano, passando de 53 mil milhões para 52,7 mil milhões de euros. Enquanto o banco registou um crescimento junto das empresas, houve uma diminuição de 1,2% no crédito à habitação. A tendência foi semelhante no BCP, com o banco liderado por Miguel Maya a registar uma descida de 2% na carteira de crédito perante a menor procura por parte dos clientes empresariais num ambiente de subida das taxas de juro. 

A descida foi ainda mais acentuada no Santander Portugal. O crédito a clientes recuou 2,2% para 42,6 mil milhões de euros, “dinâmica largamente explicada pela amortização antecipada de créditos a empresas”, explicou o banco liderado por Pedro Castro e Almeida nos resultados. 

No Novobanco, o crédito manteve-se estável, subindo apenas 0,2% face a dezembro de 2022. Já o BPI contrariou a tendência, com a carteira total de crédito a clientes do banco a aumentar 4% em termos homólogos para 29,2 mil milhões de euros. “Continuamos ativos no crédito à habitação, apesar da redução com expressão na nova concessão. Tivemos uma redução de 20% no primeiro trimestre”, afirmou João Pedro Oliveira e Costa, CEO do banco, na apresentação das contas.

Banca está a assumir demasiado risco?

É neste cenário que o sector financeiro está a apostar em campanhas para atrair novos clientes, afastando, contudo, que isto possa representar um risco acrescido, nomeadamente numa altura em que já há bancos, como o BCP, a dar spreads de 0% no crédito à habitação. Questionado sobre estas estratégias, o banco liderado por Miguel Maya limitou-se a dizer que o “Millennium BCP não comenta a sua estratégia comercial”.

“Com a normalização das taxas de juro, há margem para os bancos poderem oferecer preços competitivos e procurar conquistar quota de mercado. Por seu lado, as pessoas beneficiam com a possibilidade de comprar casa com spreads mais baixos do que no resto da Europa”, afirma o BPI, notando que o “risco de incumprimento depende sobretudo da qualidade do mutuário e não necessariamente do preço”.

Por outro lado, o Novobanco sublinha que o “sector bancário encontra-se hoje numa posição sólida e fortalecida quando se compara com a última crise financeira”, com o rácio de transformação (crédito concedido em percentagem dos depósitos de clientes) dos bancos nacionais abaixo dos 100%. Uma solidez que permite que os “bancos possam oferecer melhores condições aos seus clientes, ajudando assim as famílias portuguesas a superar este momento de instabilidade, com taxas de juro e inflação em níveis bastante elevados”.

Concorrência no crédito, mas não nos depósitos

A maior concorrência sente-se num período de maior cautela por parte dos clientes bancários que tentam navegar a subida das taxas de juro. No Fórum Anual do Banco Central Europeu (BCE), que decorreu na semana passada em Sintra, Christine Lagarde deixou claro que os aumentos vão continuar. Já o economista-chefe do BCE sublinhou que o mercado não deve descontar cortes nos juros nos próximos dois anos, uma vez que a inflação ainda está longe de alcançar a meta de 2%. 

O reflexo desta subida nos depósitos está a ser um processo mais lento. Os juros pagos pela banca nacional mantêm-se entre os mais baixos da Europa, perante os níveis elevados de liquidez no sector financeiro. “Já há bancos que subiram taxas de juro e é um processo em curso. No entanto, as taxas têm subido menos e mais devagar em Portugal do que em outros países da zona euro”, refere Filipe Garcia, da IMF, considerando que é um “erro estratégico da banca, que tem vindo a erodir significativamente os laços de confiança com os clientes”.

“O mercado dos depósitos registou um ajustamento mais lento no início do ano, precisamente devido à forte posição de liquidez que os bancos se encontram”, explica o Novobanco, notando, porém, que a “taxa de produção dos depósitos a prazo nos particulares já aumentou 61% entre março e janeiro de 2023 no sector bancário, estando disponíveis no mercado diversas soluções com taxa superior a 2,50%”.

É, por exemplo, o caso da CGD. Fonte oficial relembra que a “Caixa liderou o movimento de revisão em alta das taxas praticadas nos depósitos, tendo vindo a atualizar regularmente a oferta à luz da evolução da política monetária do BCE”. Atualmente, oferece um depósito a prazo a 12 meses não mobilizável, com uma taxa anual nominal bruta de 2,75%. 

O BPI também considera que a “concorrência é óbvia e o mercado está a ajustar. Começou pelas aplicações de empresas e maiores depósitos, e agora já se notam subidas nas ofertas do retalho. É o mercado a funcionar e isso é saudável”.