Os resultados das eleições legislativas argentinas – inesperada e surpreendentemente bons para o presidente Javier Milei, eleito há dois anos – “são excelentes para a extrema-direita europeia, mas também para Donald Trump”, disse o embaixador Francisco Seixas da Costa, analista de assuntos internacionais. A dois dias das eleições nos Países Baixos – onde o Partido pela Liberdade, do extremista Geert Wilders, está confortavelmente à frente nas sondagens – esta renovação na retórica nacionalista-liberal vinda dos confins da América Latina serve de combustível às diversas propostas da extrema-direita europeia. Isto, evidentemente, apesar de haver diferenças significativas entre as propostas e de em nenhum país da Europa, ou pelo menos da União Europeia, ser possível a um presidente colocar no terreno uma agenda político-económica idêntica à de Milei. De qualquer modo, os parabéns endereçados ao presidente da Argentina surgiram céleres de todas as sedes dos partidos de extrema-direita. O presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, foi dos primeiros a fazê-lo.
Entretanto, os mercados financeiros também ‘deram os parab’ens’ a Milei: o pré-mercado antecipava o grande dia – coisa que as sondagens não conseguiram – e estava solidamente no verde desde o início das negociações. Na abertura do mercado, a tendência de alta se consolidou-se. Na Bolsa de Valores de Nova Iorque, o otimismo dos investidores já era evidente na noite de domingo, antes mesmo da divulgação dos resultados das eleições. Com a vitória do La Libertad Avanza (o LLA de Milei) confirmada, a tendência consolidou-se, e ao longo da manhã as ações do BBVA subiram 40,2 %, enquanto as do Banco Supervielle subiram 50,5%, as do Grupo Financiero Galicia avançaram 39% e as do Banco Macro subiram 39,1%. Só aqui, estão três dos cinco maiores bancos do país. Os mesmo se passou com as principais ações de empresas argentinas: o grupo Edenor (energia) chegou a subir 38%, o Pampa Energía (energia) 27,3%, o YPF (petrolífera) 26,6% e o Central Puerto (eletricidade) 35,8%. O grupo imobiliário argentino IRSA subiu 28,3% na Bolsa de Valores de Nova Iorque, enquanto a Loma Negra (cimentos) valorizou 37%.
Na primeira sessão da semana, a taxa de câmbio oficial fixou 1.430 pesos para comprar um dólar, o que representa uma queda de 85 pesos em relação ao fecho de sexta-feira (menos 5,6%), quando atingiu 1.515 pesos, o maior valor nominal já registado, enfatiza a imprensa argentina. Os títulos soberanos também apresentam tendência de alta durante o pré-mercado.
"O resultado também reaviva a perspetiva de a Argentina regressar ao mercado, portanto, é provável que vejamos uma compressão significativa do risco-país, com um consequente aumento nos preços dos títulos em dólar e peso. Agora que a incerteza política se dissipou, o cíclo virtuoso que caracterizou o programa até meados deste ano pode recomeçar, desta vez impulsionado pela possibilidade real de retomar o acesso ao mercado num futuro próximo", disseAdrián Yarde Buller, economista-chefe e estrategista da Facimex Valores, citado pelo jornal argentino ‘La Nacion’.
“A grande vitória de La Libertad Avanza nas eleições intercalares fortalece a posição do presidente Milei, que procura fazer avançar a sua agenda legislativa e construir impulso político nos próximos dois anos do seu mandato. O resultado parece também destinado a proporcionar algum alívio no mercado cambial a curto prazo. No entanto, a LLA ainda estará longe de obter a maioria em ambas as câmaras do Congresso, pelo que o presidente Milei precisará de formar uma coligação eficaz no meio do cenário político fragmentado da Argentina para aprovar reformas económicas”, refere entretanto um research da consultora DBRS.
“Há duas conclusões principais a partir do resultado. Em primeiro lugar, a LLA, juntamente com os seus aliados, garantirá mais de um terço dos lugares na Câmara dos Representantes. Isto significa que os partidos de centro-direita terão votos suficientes para proteger os vetos presidenciais e impedir os esforços de destituição. Em segundo lugar, apesar dos fortes resultados eleitorais, a aliança LLA-PRO ainda está muito aquém da maioria em ambas as câmaras. Por conseguinte, o presidente Milei precisará de conquistar apoios no Congresso entre os partidos provinciais, independentes e a União Cívica Radical (UCR) para aprovar leis caso a caso”, diz ainda a nota. Para rematar: “a 13 de outubro, escrevemos que a questão-chave para o futuro é se o presidente Milei conseguirá mudar de política após as eleições intercalares. Em termos de política, a vitória dará provavelmente ao governo um maior espaço para recalibrar a sua estratégia de acumulação de reservas sem a ameaça imediata de uma grande desvalorização. Não é claro se o governo aproveitará a oportunidade. Em termos de política, o resultado das eleições dá ao presidente Milei uma maior influência nas negociações com o Congresso. Mas as perspetivas para a agenda de reformas dependerão ainda da vontade e sua capacidade para expandir a coligação para além do eleitorado de direita. Os próximos meses serão reveladores”.
Entretanto, o chefe de gabinete de Milei, Guillermo Francos, disse que “o povo entendeu a mensagem do presidente" e confirmou que os primeiros projetos a serem apresentados ao Congresso serão as reformas tributária e das leis do trabalho. "Valorizamos muito a mensagem expressa pelo povo argentino, e o presidente fez um discurso muito claro a esse respeito. O governo está disposto a construir consensos e alcançar mudanças na Lei do Contrato de Trabalho e nas reformas tributárias", afirmou, citado pela imprensa argentina. "Apresentaremos propostas em dezembro com diversos setores para votação no Congresso."