Skip to main content

"Apoio ao abate automóvel pode ser incentivo para compra de elétricos", defende diretora da Volkswagen

Programa de incentivo ao abate automóvel estava previsto no ano passado mas não chegou a avançar. Diretora da Volkswagen Portugal defende a ideia de utilizar este apoio para a troca de veículos elétricos, num processo moroso para se atingir o objetivo de neutralidade carbónica até 2035. Sobre alterações na Autoeuropa e novas produções, Marília Machado dos Santos remete a palavra aos responsáveis da fábrica de Palmela.

O apoio ao abate automóvel de veículos com alguma idade pode vir a ser um incentivo para os cidadãos olharem para os carros 100% elétricos como alternativas viáveis. Esta é, pelo menos, a visão de Marília Machado dos Santos, diretora-geral da Volkswagen Portugal, perante um parque automóvel envelhecido e poucos incentivos à compra de veículos elétricos.

Ao Jornal Económico, uma das poucas (mas cada vez mais) mulheres à frente de uma marca automóvel falou sobre o crescimento da Volkswagen em Portugal, objetivos para 2024 e novos lançamentos, sendo que a Autoeuropa foi colocada de lado.

Como foi 2023 para a Volkswagen?

Os resultados têm vindo a ser consolidados há três anos. Temos vindo a crescer de uma forma muito sustentável, com uma média de 0,2 pontos percentuais nestes últimos três anos.

No ano passado, o mercado cresceu aproximadamente 27% e, em termos de mercado de passageiros, realizámos a venda de 10.490 unidades. É um número que corresponde a um honroso sexto lugar, com uma quota de mercado de 5,6 no total do mercado de passageiros.

Mas aquilo que vale a pena salientar é que, em 2035, estaremos numa fase 100% elétrica e, no ano passado, as vendas elétricas da Volkswagen já representaram 20%. Trata-se também da consolidação da gama ID, totalmente elétrica.

Tirando a eletrificação, destacam o crescimento de outros segmentos?

Salientamos também o resultado muito positivo na gama dos SUVs. São uma carroçaria muito apetecível na Europa, sobretudo em Portugal, até porque temos uma grande tradição com os SUVs.

Na Volkswagen temos a mais valia de termos o T-Roc, que é produzido em Portugal, na fábrica da Autoeuropa. 'De Portugal para o mundo', como nós dizemos.

No ano passado, a gama SUV representou 56% para a Volkswagen. Portanto, há aqui um forte resultado extremamente positivo na gama SUV.

O T-Roc voltou a ser a viatura mais vendida na Europa e também em Portugal. Este é um crescimento de referência. No ano passado, vendemos entre duas mil a 2.050 unidades em Portugal e este é um marco importante para nós.

E a crise que começou na pandemia e a falta de semicondutores? Está tudo resolvido?

Depois de dois anos difíceis, em que no último ano também tivemos de fazer gestão de stocks e encomendas, já estamos organizados. O tema dos semicondutores de há dois anos não é isento a ninguém.

Já no final do ano passado ultrapassámos a questão de ter uma grande carteira de clientes à espera de automóveis. Hoje em dia, as produção estão regularizadas dentro dos limites normais, ou seja, um mês ou mês e meio.

Também já existem stocks disponíveis para o cliente que entra num showroom e pretende adquirir uma viatura. Poderá apenas não existir numa cor muito específica, mas já temos essa disponibilidade.

O que têm planeado para este ano? Estamos aqui em fase de arranque.

Vamos ter um ano dedicado aos lançamentos. Esta é forma que temos de continuar a crescer sustentavelmente e estruturadamente.

Acabámos de lançar o ID7, na primeira semana de janeiro, que é a nossa berlina topo de gama a nível dos elétricos. Vamos ainda ter o novo T-Cross, um novo SUV, e o Tiguan e a Passat vão ter versões PHEV com 100km de autonomia, que são versões muito adaptados à fiscalidade em Portugal.

Em Portugal temos uma fiscalidade muito específica nos automóveis, e também para empresas que têm os diversos patamares de tributação autónoma. OS PHEV são dois produtos que se adaptam aos privados, mas também a empresas.

No total do ano, falamos de sete novos produtos: ID7, ID Shooting Break, T-Cross, Tiguan, Passat, Golf e Golf Variant. Será tudo concentrado no primeiro semestre. Portanto, um semestre animado. Basicamente refaz toda a gama e consolida a gama dos elétricos.

Vai ser um ano extremamente interessante ao nível de novos produtos para continuarmos a crescer, porque estamos, efetivamente, num contexto económico com a subida das taxas... Portanto, não é a melhor fase, porque enquanto as taxas continuarem a subir a prioridade está virada para outro lado.

Portanto, têm aqui um foco muito eletrificado.

Sim. O nosso objetivo é continuar a aumentar, porque temos de construir toda a trajetória para, entre 2030 a 2033, estarmos preparados para em 2035 estarmos a 100% a nível dos elétricos. Não só dos elétricos, mas também ao nível dos PHEV, porque são versões com emissões mais baixas e também ao nível das viaturas a gasolina.

Hoje em dia, a nossa oferta de motores a combustão já têm emissões muito mais reduzidas em relação àquilo que eram antes.

Portanto, existe aqui  todo um percurso de neutralidade carbónica que teremos que caminhar. Todos os motores que se estão a lançar de novo respondem a este a este desafio de continuarmos esta trajetória. Temos de ver que a trajetória dos elétricos não é só na produção, mas também na construção. As fábricas que produzem elétricos já são fábricas, emissões CO2 zero em toda a Europa, e até 2030 todas serão assim, com exceção da China.

Aproveitando que introduziu aqui o tema das fábricas. Falou-se na modernização da Autoeuropa e de um investimento de 600 milhões, também focado na eletrificação. Sendo que, neste momento, se produz apenas um automóvel, há outros planos?

Infelizmente não lhe vou conseguir responder a essa questão. A Autoeuropa faz efetivamente parte do grupo Volkswagen, mas essa questão terá que ser endereçada à fábrica.

Posso dizer apenas que o T-Roc foi o modelo mais vendido na Europa, foi o modelo mais vendido em Portugal e, portanto, acredito que haja um projeto de sucesso também para o T-Roc e para a fábrica da Autoeuropa.

Voltando então atrás, o que perspetivam para o mercado elétrico este ano?

O plano é continuar a crescer. Nas grandes cidades é fácil crescer: Lisboa e Porto já têm rede suficiente, mas Portugal não é só Lisboa e Porto. Não são só as grandes cidades e há aqui um esforço que tem de ser feito, nomeadamente de apoios para que seja possível ter carregadores distribuídos uniformemente ou de forma mais complementar ao nível de outras pequenas cidades.

Não podemos deixar de dizer que, hoje em dia, adquirir uma viatura elétrica ainda é algo dispendioso. Os incentivos que existem são para empresas: 90% das viaturas eléctricas vendidas são para empresas, porque tem os benefícios.

A nível dos privados existe um benefício, mas é rapidamente consumido e não chega.

Foi pedido aos construtores que disponibilizassem mais viaturas elétricas. Agora tem de haver apoios ao nível dos carregadores e ao nível de aquisição para os privados. Porque hoje em dia há um grande esforço em tornar os elétricos mais acessíveis aos privados.

E como poderão ser esses apoios?

Temos de incentivar as pessoas à troca por viaturas elétricas. Podem ser apoios ou ações de formação e visibilidade, ou pode ser um misto entre as duas situações.

Acho que a transição passa muito por apoios necessários, como tivemos há 15 ou 20 anos, como os apoios aos abates, por exemplo. Isto porque o parque automóvel está muito envelhecido. Hoje em dia bastava fazer um programa de apoio, mesmo que fosse de substituição das viaturas para as viaturas de gasolina atual.

Por exemplo, uma viatura a gasolina com 20 anos não tem nada a ver com um motor a gasolina de hoje, em que os níveis de emissões de CO2 são muito mais baixos. Claro que devemos olhar sempre para os elétricos e para os híbridos, mas nem que fosse esta a primeira abordagem, já nos estaríamos a tornar num país muito mais ecológico.

Falamos nisto pouco tempo depois em que surgiram notícias de que carros com mais de 15 anos poderiam ser impedidos de ser reparados.

Exato. Não faz sentido.

Tem de ser um programa claro, que permita às pessoas fazerem esta transição para combustão ou diretamente para os elétricos, em que já estaríamos todos preparados para para 2035.

Hoje em dia até bastava fazer um programa de apoio, mesmo que fosse substituição para as viaturas. Mas de uma forma faseada, que libertasse esta quantidade de emissões que estão associadas ao parque automóvel envelhecido.

Em termos de incentivos a privados ainda estamos muito longe dos países nórdicos, que têm isso muito mais desenvolvido.

Mas, nesse caso, a infraestrutura também é diferente.

Foi uma transição que requereu um grande esforço para os construtores, e chegou-se a uma altura que tem que ser a própria estrutura a conseguir financiar.

Se a indústria deu o salto, por que não avançam os outros players também?

O sector automóvel evoluiu muito nos últimos cinco a dez anos, do que evoluiu em todo o passado. Houve um crescimento muito grande e agora falta conseguir estabilizar.

As autonomias ainda são um grande problema.

Têm sido cada vez menos. Há carros elétricos que têm até 600km de autonomia. Quem conduzir um elétrico também se vai adaptar.

É uma questão de mindset, porque todos paramos na autoestrada dez minutos para beber café. Porque não parar 20 minutos e carregar até 80% da bateria? Há uma responsabilidade em cada um de nós, enquanto membros da sociedade, de nos tornarmos mais sustentáveis.

As autonomias de há cinco ou três anos não têm nada a ver com as autonomias de agora. Hoje em dia temos uma oferta de 600km, que é algo que já permite fazer um trajeto robusto.