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ADN da cerveja artesanal passa pela Letra. "Abrir em Lisboa é objetivo"

Os primeiros dez anos de uma marca têm sempre adversidades, mas Filipe Macieira e Francisco Pereira não se deixaram derrotar. O seu amor pela cerveja artesanal levou-os a criar a Letra, uma empresa com ADN 100% minhoto que hoje vinga no mercado nacional e estrangeiro.

O selo da cerveja artesanal minhota está nas mãos de Filipe Macieira e Francisco Pereira. Os dois colegas de Engenharia Biológica da Universidade do Minho começaram a criar a Letra em 2010, quando abordaram a produção de cerveja no mestrado e apresentaram protótipos da mesma. A Letra nasceria, oficialmente, em 2013.

Podiam ser apenas dois universitários a inventar, mas Filipe e Francisco atiraram-se de cabeça e hoje existem sete letras do alfabeto que compõem a coleção permanente da Letra. Atualmente, a Letra é uma das cervejas artesanais mais estabelecidas e reconhecidas do mercado, a par de outras.

"A primeira vaga da cerveja artesanal nasceu no Norte", lembram os fundadores, que ao longo da conversa evidenciam o ADN "100% minhoto" da marca de Vila Verde. Mas, embora a criação de novas marcas se tenha concentrado em Lisboa (Musa, LX Brewery, Dois Corvos), os dois empresários nunca baixaram os braços.

De facto, Filipe e Francisco continuam, mesmo volvidos "os primeiros dez anos" de Letra, a concentrar toda a atividade em Vila Verde. Ao Jornal Económico, os dois empreendedores explicam que toda a produção e distribuição da cerveja é feita onde tudo começou, em Vila Verde.

"Estar no Norte, especialmente no Minho, tem um custo", assumem. Esse custo passa, muitas vezes, por não serem tão visíveis, mas os dois sócios não se assustam com a concorrência. É que Filipe e Francisco têm as cervejas mas as Letrarias, espaços culturais que se inserem com vários temas e onde se aprecia cerveja da marca, também vincam todo o contexto.

A primeira abriu em 2015, precisamente em Vila Verde, com todo o conceito de brewpub, junto à fábrica onde os visitantes têm a experiência completa. Dois anos depois, em 2017, migraram para o Porto com a Letraria em formato beer garden. "É o nosso polo principal e tem um grande impacto financeiro". Em 2019 abriram em Braga, dentro de uma livraria comunitária, em 2021 foram para Ponte de Lima, onde a Letraria é decorada com discos vinil e em 2023 abriram em Viana do Castelo, numa parceria com um hotel secular.

Agora, em 2024, e cumpridos dez anos de marca, o foco está em Óbidos. Esta é a próxima grande abertura de uma Letraria, marcada para fevereiro do próximo ano dentro das muralhas do castelo. Ainda assim, "abrir em Lisboa é objetivo", sustentam em uníssono, mas "para isso acontecer têm de estar reunidas todas as condições". "Temos de encontrar o espaço que se adeque às nossas ideias, mas agora os preços dispararam. Apesar de ser objetivo, temos de aguardar".

A entrada em Óbidos, pela distância que separa Vila Verde e a vila do Oeste, já é uma grande mudança para a marca, que migra para fora de pé do território nortenho.

E o que significam as letras?

A Letra não é fácil de explicar, devido à quantidade que existe no abecedário mas também aos planos de Filipe e Francisco.

Apesar de ter nascido de um spin-off da Universidade do Minho, os empreendedores querem introduzir a cerveja artesanal da forma mais simples possível. Por isso mesmo, iniciam a coleção com as cervejas organizadas por grau alcóolico mas também pela quantidade de lúpulo presente.

De A a G, todas as cervejas artesanais têm características diferentes que se distinguem entre si, bem como para o momento em que se inserem ou gostos diferenciados.

Mas nem só das sete primeiras letras do alfabeto vive a Letra, apesar de serem a coleção permanente (para já). É que a cervejaria minhota faz parcerias com marcas de outros países. Filipe Macieira e Francisco Pereira contam ao JE que, desde a criação da empresa, já fizeram cerca de 30 colaborações, destacando o Brasil.

Isso também só é permitido por causa do fator exportação. Cerca de 10% da produção efetuada na fábrica é feita para exportação, nomeadamente para países como Espanha, França, Dinamarca, Bélgica ou Suíça. Este foi um valor que ficou pela metade durante a pandemia. "A pandemia teve um impacto negativo nas contas, mas conseguimos reorganizar-nos e concentrar o foco".

"Existe a necessidade de criar produtos novos para os consumidores, mas também que envolvam toda a cultura cervejeira existente em Portugal e no estrangeiro", dizem.

Faturação não está só nos supermercados

Os supermercados representam entre 5% e 10% das vendas totais da empresa.

Francisco Pereira conta ao JE que o El Corte Inglés foi o primeiro supermercado, em 2013, a inserir a Letra nas prateleiras. Desde aí, já garantiram presença no Auchan e na Sonae, embora a presença no grupo Continente esteja reduzida a apenas algumas lojas.

"Os portugueses consomem cerveja artesanal, mas não compram para casa", adiantam os sócios. Esta tem sido a principal diferença entre cervejas artesanais e 'regulares'. "É difícil trabalhar com a rodagem nos supermercados".

Apesar de ser preferível consumir cerveja artesanal em lata (razões estudadas por ambos no âmbito da tese), 99% da tiragem da Letra é vendida em garrafa. Isso é visível, seja nas prateleiras de supermercados ou no site.

Planos para o futuro?

"Continuar a consolidar a marca". Este é o plano dos dois sócios, que querem continuar a trabalhar a Letra.

"Esperamos que os próximos dez anos se mantenham à altura do que foram estes que passaram".

Desde a fundação da empresa, em 2013, a Letra cresceu de duas para 35 pessoas, entre a fábrica, distribuição e Letrarias.

"O objetivo é crescer, acima de tudo, com eficiência financeira". Este ano, os empresários estimam terminar o ano com dois milhões de euros em faturação, um valor com o qual se sentem confortáveis, dado o investimento que tem sido efetuado nos últimos anos - seja Viana do Castelo ou Óbidos -, ou a procura pela expansão da equipa.

Atualmente, a empresa tem uma parceria com a Universidade do Minho, de onde surgiu a Letra, na qual contratam talento, o que também permite dinamizar o mercado de trabalho na região de Vila Verde. "Temos uma taxa de retenção de 10% do talento que começa a estagiar connosco. É um valor bastante positivo", assume Filipe Macieira.

Apesar disso, os dois sócios (também pelo ambiente onde cresceram) admitem valorizar a cultura do tradicional 'desenrasque' a um curso superior. Porquê? "Quando existe um curso superior, as pessoas acham que estão acima ou que têm de fazer as coisas de determinada forma. Às vezes é preciso dar a volta a um problema de forma rápida e é aí que entra a cultura do desenrasque e que serve para muito do que fazemos na fábrica".