"Não basta ter contrato, é preciso sentir o clube. Ter contrato é pouco importante". A afirmação de Sérgio Conceição na última conferência de imprensa não esclareceu se vai renovar o contrato com o FC Porto e na entrevista que Pinto da Costa deu à SIC em novembro, o histórico presidente dos "dragões" deixou a pergunta face ao momento pré-eleitoral que o clube está: "Alguém vai renovar sem saber quem vai ter a dirigi-lo? Eu não assinava, ele não sei". O escrutínio tem lugar em abril e conta com três candidaturas: Nuno Lobo, André Villas-Boas e, tal como foi confirmado este fim-de-semana, Jorge Nuno Pinto da Costa.
No FC Porto desde 2017, Sérgio Conceição devolveu o clube aos títulos depois de quatro épocas de jejum (o maior período sem troféus na era de Pinto da Costa) e apesar dos baixos investimentos na equipa de futebol, foi campeão em três ocasiões (2018, 2020 e 2022), conquistou três Taças de Portugal (2020, 2022 e 2023), uma Taça da Liga e três Supertaças. Tão ou mais importante: o técnico português já qualificou o FC Porto por cinco vezes para a fase a eliminar da Liga dos Campeões e caiu nos oitavos aos pés do Liverpool (2018) e do Inter de Milão (2023) e nos quartos por culpa do Liverpool (2019) e do Chelsea (2021). Na presente edição, o FC Porto foi a única equipa portuguesa a qualificar-se na fase de grupos da Liga dos Campeões e terá o Arsenal como adversário.
E porque é que é tão importante falar da Liga dos Campeões e de Sérgio Conceição neste contexto? Em dezembro do ano passado, o FC Porto carimbou a 14ª qualificação da sua história para os oitavos da prova milionária da UEFA e desses catorze apuramentos, Sérgio Conceição foi responsável por cinco. De resto, o técnico é o primeiro treinador a atingir por duas vezes os quartos de final da "Champions" com uma equipa portuguesa.
Apesar do reconhecido sucesso à frente do FC Porto, a relação entre Sérgio Conceição e alguns responsáveis da SAD e até mesmo da claque "Super Dragões" (que na semana passada sofreu um duro revés com a operação da Polícia Judiciária a deter Fernando Madureira) tem sido tudo menos pacífica. É público que o técnico tem vindo a gerir com algum desgaste e até desconforto algumas posições da SAD a propósito da política de vendas: o mais recente foi a venda de Otávio ao Al Nassr, uma operação que no entender do treinador, comprometeu os objetivos desportivos na época passada.
"É o maior ativo do FC Porto"
Jorge Faria de Sousa, comentador do programa "Jogo Económico", da plataforma multimédia JE TV, considera mesmo que Sérgio Conceição "é o maior ativo do FC Porto" já que "tem sido absolutamente determinante no sucesso desportivo da sua equipa". O analista recorda ao JE que "o treinador conviveu com a intervenção da UEFA, por incumprimento do fair-play financeiro e ainda assim, tem conquistado troféus".
No entender deste comentador, "Conceição ao longo do seu trajeto tem tido plantéis inferiores aos seus rivais, com vários jogadores a saírem a custo zero e uma quebra de investimento na equipa".
E que consequência pode ter a saída do técnico do comando do FC Porto como pode acontecer no final desta época? "Uma eventual saída de Sérgio Conceição do comando técnico será desportivamente muito difícil para o clube da invicta. Além dos problemas financeiros que o emblema portista vive, ter de iniciar um novo projeto desportivo, com uma nova equipa técnica será uma incógnita".
Milhões em caixa
E porque vitórias e qualificações na Liga dos Campeões rimam com milhões em caixa, Sérgio Conceição já garantiu à SAD do FC Porto desde 2017, só com receitas provenientes da UEFA, uma soma próxima dos 350 milhões de euros (347 milhões de euros para ser mais preciso), com a época de 2018/19 a ser a mais proveitosa de sempre da história do clube nas competições europeias: 80,7 milhões de euros. Só esta temporada, apesar de cumprida apenas a fase de grupos, os "dragões" já garantiram a terceira maior receita de sempre na prova (63 milhões de euros), sendo que a segunda foi atingida em 2020/21: 73,7 milhões de euros.
Se quantificarmos o peso de Sérgio Conceição na valorização dos ativos do FC Porto (os passes dos futebolistas), é possível perceber através de dados do site "Transfermarkt" que o técnico português nunca gastou mais em contratações do que o valor das vendas desde que está no comando dos dragões. Desde 2017, o FC Porto gastou 280 milhões em contratações (113,9 milhões de euros em 24 jogadores contratados a clubes portugueses, de acordo com a página "Diário de Transferências") e fez vendas no valor de 533 milhões de euros. De resto, as receitas com passes de jogadores suplantaram sempre os 68 milhões de euros (o valor mais baixo foi atingido esta temporada) sendo que a época mais despesista de Sérgio Conceição ao serviço do FC Porto foi também a mais proveitosa em termos de vendas: em 2019/20, os "azuis e brancos" compraram no valor de 63,3 milhões e arrecadaram 88 milhões de euros.
SAD do FC Porto em "situação gravosa"
Têm sido públicas as dificuldades financeiras da SAD do FC Porto mas a última análise (de outubro do ano passado) às contas da época passada dos três "grandes", por parte da Maxyield - Clube dos Pequenos Acionistas, à qual o JE teve acesso, demonstra que a SAD dos "dragões" está a afundar-se no campeonato financeiro dos maiores emblemas do futebol nacional.
"Todas as SAD manifestam dificuldades de liquidez, apresentando fundos de maneio negativos, ainda que bastante diferenciados, condicionantes da gestão de tesouraria e satisfação dos seus compromissos, sendo a situação da Porto SAD particularmente gravosa", segundo o estudo a que o JE teve acesso.
"A liquidez obtida com a transação de atletas, vem sendo decisiva para evitar a rutura de tesouraria. Acresce que a Porto SAD e Sporting SAD apresentam um baixo nível de capitais próprios, configurando uma situação de perda de metade do capital", pode-se ler.
Note-se que no relatório e contas apresentado à CMVM no final de outubro e referente à época anterior, a SAD apresentou um prejuízo de 47,6 milhões de euros com capitais próprios negativos de 175,9 milhões de euros.
De resto, se o novo regulamento financeiro da UEFA entrasse em vigor no final desta época tal como vai ficar fixado (sem o período de transição), o FC Porto estaria muito perto de incumprir a norma. Atualmente, um terço dos emblemas que estão a disputar a atual edição da maior prova europeia de clubes, estariam excluídos de acordo com a norma estabelecida que vem substituir o fair-play financeiro. É o que diz esse novo regulamento: em 2025/26, as sociedades desportivas, que gerem o futebol dos clubes, não podem gastar mais de 70% das receitas em ordenados, transferências e comissões a empresários.