Para onde nos levará a inteligência artificial (IA) dentro de uma década? Que profissões deixarão de existir? Eduardo Marçal Grilo não arrisca fazer futurologia. Mas de uma coisa está certo: é preciso preparar “muito bem” as pessoas para o que aí vem. As escolas e as universidades terão um papel fundamental, garantindo que os pilares dos conhecimentos científicos, mas também dos valores, não vão ruir.
“Esta transformação a que estamos sujeitos tem uma rapidez tal que vai haver muita gente desempregada e muita gente vai ter que ser reconvertida” e as “boas empresas” vão precisar de trabalhadores proativos, que acrescentem”, assinalou o antigo ministro da Educação na conferência Zona de Impacto Pensar Global.
O país tem, neste contexto, um “grande desafio” nas mãos, especialmente as “instituições de grande responsabilidade”. As escolas e universidades têm de acompanhar a evolução, atualizar-se, e “pensar muito bem”. Matéria-prima para isso há, acredita Marçal Grilo, confiante nas capacidades das novas gerações.
“O país tem quem pense”, considera, justificando esse optimismo com dados: “Em 1978, o país tinha 2.600 doutorados, o país hoje faz 3 mil doutorados por ano. Mesmo que 10% sejam de baixa qualidade, é um número muito alto relativamente àquilo que foi há 50 anos.”
O antigo governante reconhece que o desafio envolve um “esforço” que vai além do “meter os computadores a funcionar”. “O pilar dos conhecimentos científicos é fundamental. Ninguém consegue ter sentido crítico nem capacidade de resposta nem vontade de aprender se não tiver uma formação de base do ponto de vista científico. Saber onde está, de onde é que vem, ter raciocínio lógico”, avisa.
Mas o que mais preocupa Marçal Grilo é a dimensão dos valores ameaçados pelos ares do tempo. “Vivemos no mundo da mentira. Antigamente falava-se do mundo do pós verdade. Não, não. É a mentira pura. (...) Tenho a certeza que no dia em que perdermos os valores, esta sociedade afunda-se. São os valores que tratam da ligação das pessoas”, diz Marçal Grilo.
As escolas e universidades têm, aqui, um papel crucial. Devem ser um “exemplo” inabalável na prática da verdade, da ética, da solidariedade e do respeito pelo outro, acrescenta o ex-governante.
Quanto aos efeitos da IA na economia nacional, Marçal Grilo antecipa dificuldades de adaptação, porque a esmagadora maioria das empresas são micro. E dá o exemplo do senhor Mário, fornecedor de legumes. “Não vai certamente entrar na era digital”, diz o antigo ministro. Aliás, termina, as profissões ligadas à alimentação têm seguro de vida garantido. “A IA não nos vai dar de comer!”, brinca.
Revolução tecnológica é um desafio para a escola e para o país
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Marçal Grilo, antigo ministro da Educação, defende que as escolas e universidades devem garantir que os pilares do conhecimento científico e dos valores sobrevivem à inteligência artificial.