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Regime de Gestão de Ativos que tem de ser um exemplo europeu

O principal diploma regulador dos organismos de investimento coletivo em Portugal é exemplar, pela concisão, pela responsabilização dos agentes e pela agilidade que dá à supervisão.

O Regime de Gestão de Ativos (RGA) é o principal diploma regulador dos organismos de investimento coletivo (fundos de investimento e sociedades de investimento coletivo) em Portugal, em vigor desde 2023 e o regulamento que o enquadra, com pouco mais de um ano, estão a funcionar bem e constitui um exemplo no processo de transposição de regras europeias.


“O balanço da vigência do RGA é muito positivo, sobretudo se tivermos em conta o desequilíbrio e o sobrepeso de produção regulatória no sistema financeiro, em particular provindos de fontes europeias”, diz Paulo Câmara, sócio no departamento de Financeiro & Governance da sociedade de advogados Sérvulo, ao Jornal Económico (JE). “A concisão normativa, a eliminação de adições domésticas (gold-plating) e a simplificação legislativa subjacentes ao RGA são sinais importantes de progresso”, sustenta.


Paulo Câmara é autor do livro “Regime de Gestão de Ativos Anotado”, editado pela Almedina no final do ano, juntamente com os advogados que trabalham na área de Financeiro & Governance da Sérvulo.


Questionado pelo JE sobre a adaptação dos agentes às novas regras, considera que decorreu “genericamente bem”. Sobre a a adaptação do regulador às novas responsabilidades, diz que “a CMVM liderou o processo pré-legislativo, pelo que deve ser louvada a sua atuação”. Além disso, “tem-se adaptado à nova orientação do ambiente regulatório. Prosseguiu ainda uma tarefa muito meritória de divulgação dos trabalhos preparatórios do diploma e de publicitação de respostas a questões frequentes. Fica facilitada, também por este modo, a tarefa de interpretação de cada normativo do RGA”.


A preparação desta legislação assentou num processo aberto e muito participado, que mobilizou a comunidade jurídica, financeira e o regulador do mercado, a Comissão do Mercado de Valores Mobiliários (CMVM), o que motivou a análise feita.


“Trata-se de um exemplo de maior apuro sistematizador do que o encontrado no próprio direito europeu”, diz Câmara, apontando que este quadro “promove a agilidade de supervisão, através de prazos de decisão mais curtos; aceita a autonomia e a responsabilização das sociedades gestoras, através de um princípio de supervisão sucessiva, com contadas exceções”.


Por isso, constitui um exemplo do caminho que a União Europeia devia seguir. “Este diploma manifesta um relevo mais amplo do que o respeitante à gestão de ativos. No momento que atualmente atravessamos, de início de um novo ciclo político na Europa, seria importante assentar na necessidade urgente de rever o sistema de regulação financeira na Europa, em benefício de uma maior concisão legislativa e de maior competitividade dos operadores – como bem propõe o Relatório Draghi”, diz o sócio da Sérvulo.


“O Regime de Gestão de Ativos é um diploma sintomático, na medida em que incorpora e antecipa uma nova visão regulatória. Onde a União Europeia aposta em mais produção regulatória de diversos estratos normativos, o RGA prefere a contenção normativa e a eliminação do gold-plating. Onde a União Europeia reparte por dois hemisférios normativos (UCITS e AIFMD) o tratamento dos organismos de investimento coletivo, o RGA opta pela unificação dos dados normativos num só diploma”, acrescenta.


Paulo Câmara é doutor em Direito e professor universitário. Está na Sérvulo desde 2008. É coordenador do Governance Lab, um grupo independente de investigação dedicado ao corporate governance e membro da Comissão de Acompanhamento e Monitorização do Código do Instituto Português de Corporate Governance. Antes, foi diretor do Departamento Internacional e de Política Regulatória e do Departamento de Emitentes da CMVM, entre 1998 e 2008, exerceu funções como membro da Comissão Euro entre 1996 e 1998 e do Grupo de Trabalho para elaboração do Código dos Valores Mobiliários entre 1997 e 1999.