Não começam do zero. Têm um nome com história, uma marca conhecida e a experiência dos sócios, mas entram de novo no mercado. Porquê este projeto?
Francisco Proença de Carvalho: O mercado é dinâmico e as pessoas que estão nesse escritório também são dinâmicas. Eu acho que o mundo da advocacia também está a mudar. Assisti a muitos colegas meus de grandes escritórios que ao longo das suas carreiras, em determinado momento, decidiram arriscar e fazer os seus projetos e sempre tive alguma admiração por eles e, às vezes, uma certa inveja. Senti que tinha neste momento que o fazer e acho que este mundo atual, em que a inteligência artificial também está a entrar pelo nosso mundo, em que no pós-pandemia os jovens advogados têm uma perspetiva diferente da profissão.
Este escritório tenta assimilar um bocadinho estas tendências. Nós temos um modelo de trabalho absolutamente flexível, assente no resultado de cada advogado e no resultado coletivo. As nossas regras básicas são o nosso manifesto, os nossos valores e o nosso código de conduta e a nossa deontologia, mas a partir daí podemos fazer de maneira diferente. Por exemplo, nós trabalhamos todos num modelo em que não temos um espaço cada um, físico, pesado, uma secretária própria; todos os dias mudamos de lugar, todos os dias estamos nesta partilha. E eu acho que é isso que a nova jovem advocacia precisa, de retirarmos tantas paredes que existiam, aquela cultura de uma certa distância entre sócios e o jovem advogado. Acho que neste escritório nos sentimos todos sócios, nos sentimos todos donos do negócio, independentemente da geração a que pertencemos. E isto é um bocadinho a génese da advocacia, as pessoas começaram com escritórios partilhados, partilhavam despesas, sentiam-se todos sócios, donos do seu negócio. E partilhavam espaço, partilhavam certamente ideias. Eu acho que a advocacia tradicional foi perdendo isso; as empresas foram ficando muito grandes, foram ficando demasiado hierarquizadas.
Este entusiasmo, que nós tivemos de poder começar um projeto de raiz, em que construímos o espaço que queríamos, o modelo tecnológico que queríamos, vamos entrar num projeto de inteligência artificial da maneira que queremos; rodeámo-nos dos colegas que queremos, é um privilégio que já valeu a pena. Agora, temos tudo ainda por fazer, mas já valeu a pena.
Sobre a marca, há um lado objetivo, do meu lado, que eu acho que é uma marca que é um ativo, que foi construído obviamente muito pelo meu pai, pessoa por quem eu tenho muita admiração, em que eu também tenho o meu lado da minha carreira – já são 20 anos –, mas depois tem um lado também sentimental. Custava-me tomar aquela decisão de sair da Uría Menéndez - Proença de Carvalho, que, apesar de tudo, esteve quase 15 anos no mercado e só porque eu tomava aquela decisão desaparecia essa marca. Portanto, eu tenho este lado de homenagem também ao meu pai.
André Matias de Almeida: Aquilo que a Proença de Carvalho vem trazer ao mercado é um respeito muito grande por aquilo que o nome representa, enquanto marca, enquanto tradição, mas também uma alteração grande àquilo que é o paradigma das sociedades de advogados. Nós queremos que as pessoas que trabalham na Proença de Carvalho e que com ela colaboram, além de sentirem que são elas próprias um bocadinho fundadoras desta sociedade de advogados, encarem o trabalho e a colaboração como algo são, como algo que não é uma obrigação, apesar de estarmos absolutamente cientes de que a qualidade do serviço e o rigor que temos de prestar aos nossos clientes tem de ser elevadíssimo.
Bárbara Schürmann: É uma oportunidade de fazermos algo com cunho pessoal, de entregarmos a um projeto a nossa visão da advocacia. Não só na forma como nós nos apresentamos para o exterior, para os clientes, vendo os clientes como parceiros, colocando-nos ao lado deles, entendendo, procurando entender as áreas de negócio dos clientes de modo a aportarmos mais e a não sermos vistos como uns meros aplicadores da lei, mas a utilizarmos a lei como uma ferramenta que nos permite de alguma forma ir mais ao encontro dos interesses dos nossos clientes. E internamente também uma forma de vermos as pessoas com quem trabalhamos, de colaboração entre todos, que implica uma certa flexibilidade e muita responsabilidade das pessoas.
Falaram em mudança. Como é que querem posicionar-se no mercado? Como uma boutique?
André: Houve uma preocupação grande quando a Proença de Carvalho se apresentou ao mercado, muito por culpa também daquilo que é o peso que a marca representa, de na comunicação que fizemos as palavras serem muito claras e eu acho que o nosso manifesto foi escrito com todo o cuidado e que representa muito aquilo que a Proença de Carvalho pretende ser. Nele nós podemos encontrar algumas palavras que representaram não apenas o legado de Daniel Proença de Carvalho, o que sempre o caracterizou enquanto advogado e que nós achamos que devem ser os valores essenciais que um escritório deve ter, de rigor e de, sobretudo, ser um escritório parceiro do seu cliente. Se me perguntar como é que a Proença de Carvalho gostaria sempre de ser vista pelos seus clientes, para quem nós trabalhamos sempre, em última instância, e de quem queremos a satisfação máxima, queremos que os nossos clientes nos vejam como um parceiro e não apenas como um prestador de serviços.
Francisco: Nós somos uma sociedade de advogados que vai estar no mercado da advocacia de negócios naquilo que ela comporta.
Hoje em dia, até pelo que disse das novas ferramentas de trabalho, dos novos modelos de trabalho, os grandes escritórios não se medem pelo tamanho. Portanto, este grande escritório não se vai medir pela sua dimensão. Seremos capazes, certamente, de trabalhar em várias áreas nessa advocacia de negócios; do fiscal, aqui magnificamente liderado pela Bárbara; na área de M&A, societária, dos fundos, de private equity, pelo André; na área do imobiliário e urbanismo muito com o Francisco Sousa Coutinho, com o Frederico Pestana; também na área de resolução de litígios, que é uma forma abrangente de falar em contencioso desde o penal ao civil, enfim, comigo, com a Filipa Loureiro e com a nossa equipa. No fundo, abarcamos tudo, mas depois há uma área dos chamados private clients, que se calhar é uma área que os grandes escritórios, muitas vezes, enfim, entre aspas, desprezam, que nós não queremos desprezar, porque, hoje em dia, este lado mais privado dos problemas pessoais dos líderes são coisas importantes. Nesse lado está a Eduarda Proença Carvalho.
É aqui que nos vamos posicionar. Caracterizem-nos como quiserem, nós somos a Proença de Carvalho e acho que é fácil associarem-nos à advocacia.
Há um segundo ponto, que tem um bocadinho a ver com o lado da confiança, o lado humano e de uma certa individualidade de cada advogado que aqui se integra. Eu acho que o mundo ultracorporativo, que tem muitas vantagens, tem uma tendência para definir um perfil daquilo que é o funcionário, o advogado desta sociedade de advogados. Eu acho que a advocacia tem muito dessa liberdade. Uma coisa é nós cumprirmos a nossa deontologia, sermos tecnicamente competentes, outra coisa é escrevermos todos da mesma maneira, vestirmos todos da mesma maneira e termos todos a mesma forma de lidar com os clientes, isso não. E acho que os advogados que passaram tantos anos a estudar, que são pessoas com uma preparação em Portugal tremenda, se abafam perante uma marca e que deixam ter uma própria individualidade é algo que eu gostaria de evitar. Eu sei que nesta fase inicial somos poucos, mas eu queria muito que desde o primeiro estagiário ao advogado mais experiente que essa individualidade fosse respeitada, e nós vamos tentar com a nossa comunicação, com a nossa forma de estar também, interna e externa, que essa individualidade seja respeitada e seja exposta, ou seja, que não seja tudo abafado, pura e simplesmente pela nossa marca. Cada advogado aqui, se o quiser ter, vai ter um protagonismo próprio, obviamente sujeito a uma regra geral comum, como em qualquer empresa, uma deontologia comum, uma marca comum e um lado digital comum.
A equipa ainda é pequena. Vão recorrer a colaborações, querem crescer? Como é que estruturam a oferta de serviços tendo em conta esta limitação?
André: A equipa pode considerar-se pequena, mas não me recordo de uma sociedade de advogados que tenha imediatamente iniciado a sua atividade com 14 advogados, que cobrem áreas de uma advocacia de negócios muito especializada, pessoas com uma experiência de largos anos nos seus setores e que nos permitem, sem prejuízo de um eventual crescimento que tenhamos, conseguir fazer todo o tipo de negócios, de operações que temos em Portugal.
É evidente que este negócio é um mercado de parcerias, de colaboração com outros escritórios nacionais e internacionais. Fechar a porta a isso é uma coisa que nenhum escritório em Portugal pode e deve fazer.
A Proença de Carvalho pretende também neste mercado posicionar-se como um parceiro que acompanha o seu cliente ao longo da vida. Nós não podemos esquecer que o tecido empresarial português – sem prejuízo dos clientes internacionais – é hoje composto, em grande parte, por um tecido empresarial familiar. E este tecido empresarial familiar preza muito duas palavras importantes naquilo que é o léxico da Proença de Carvalho, que é coragem e uma que faz parte do nosso slogan principal, que é confiança. E é isto que nós queremos, sobretudo, imprimir a tudo aquilo que fazemos, tenhamos 14 advogados ou possamos dentro de um ano ou de dois ou três termos muitos mais.
Francisco: Com uma ajuda. Vamos iniciar agora um projeto com uma startup portuguesa chamada Neuralhift de inteligência artificial aplicada ao nosso setor e que entendemos que nos poderá tornar maiores, se for bem aplicada, bem interpretada. Torna-nos mais produtivos e, portanto, isso, à partida, poderá exigir menos recursos humanos, para que os advogados estejam também dedicados àquilo que importa.
O mercado está agora mais competitivo e ainda ficará mais com a concretização da multidisciplinaridade. Como é que uma sociedade mais pequena consegue responder?
André: Um investimento que seja bem feito e que seja consolidado em tecnologia, transporta-nos para uma realidade em que nós podemos assessorar e podemos estar a trabalhar com clientes não apenas em Portugal, mas também com clientes portugueses que estão a fazer algum trabalho no estrangeiro, a uma velocidade e com uma capacidade como se tivéssemos um número de advogados bastante superiores e isso traz-nos uma capacidade de resposta muito elevada.
Francisco: Digo uma coisa que o meu pai dizia muito e que eu associo: são os clientes que escolhem os advogados, não são os advogados que escolhem os clientes, e nunca nos podemos esquecer disso. Eu acho que em Portugal, infelizmente, tivemos uma triste tendência de desvalorizar os nossos serviços, porque entramos na competição. A advocacia, o mundo do direito, é algo que na maior parte dos países civilizados é muito valorizado, porque é muito importante e cada vez mais neste mundo em mudança, com regulação por todo o lado. É muito importante nós não autodesvalorizamos isso. É uma coisa que nós não gostaríamos de fazer no nosso mercado, se quisermos, e queremos, também, saber gerar confiança. Isto vai depender de cada um de nós. Eu acho que se nós prestamos um bom serviço aos clientes, formos empáticos, formos humanos, gerarmos a confiança de que eles precisam, não temos de nos preocupar com a concorrência. Aliás, a concorrência no setor da advocacia, pelo menos é essa a minha experiência, é de que também são os outros escritórios de advogados que nos geram negócio e que nós geramos negócio para outros.
A nossa preocupação é em fazer o nosso trabalho, responder aos nossos clientes, dar-lhes uma assessoria de parceria, e acho que depois, naturalmente, as coisas vão acontecer.
Bárbara: Eu acho que há sempre espaço para, se nos conseguirmos posicionar como queremos, como parceiros dos nossos clientes. Nós procuramos entregar soluções que são desenhadas especificamente para o problema do cliente e não são soluções standard para toda a gente, o que será mais típico das estruturas muito grandes. Há sempre espaço para uma advocacia assim.
Como é que tem sido a resposta do mercado? A porta está aberta há pouco tempo, mas já têm quem venha cá, bater à porta, e já foram bater a portas e foram recebidos?
André: A realidade que os clientes, as pessoas e as empresas, têm como pano de fundo quando se recordam do nome e da marca Proença de Carvalho é obviamente facilitador, quando falamos com clientes que o que procuram é confiança, um parceiro com coragem, e, sobretudo, advogados que possam ser parceiros ao longo do tempo e dos seus investimentos. Mas é sobretudo um fator de grande responsabilidade para o futuro, porque nada está feito, temos tudo por fazer, mas claro, e comporta sempre para nós um desafio quer do ponto de vista da responsabilidade, quer do ponto de vista da prestação do serviço.
Francisco: Todos os sócios deste projeto já tinham cada um a sua prática, a sua carteira de clientes e muito associada à sua própria pessoa. Lá está, a advocacia, por muito que nós por vezes pensemos que é de marcas, é ainda muito de pessoas.
Nós começámos logo com uma base de clientes que já tínhamos, que ficou feliz pelo nosso passo – eu acho que posso dizer isto –, ficou feliz pela atitude, pela atitude de arriscar. No fundo, eu acho que demonstramos essa coisa que os clientes apreciam, essa atitude, essa coragem, essa vontade de fazer uma coisa, de construir. Eu acho que isso dá-nos boa imagem. Portanto, o mercado, em 15 dias, que é do que estamos a falar, já reagiu muito bem, quer de um lado, quer de outro: clientes que se interessaram e que nos contactaram, como disse, mas também o mercado de trabalho; notámos, e para mim foi uma surpresa tremenda, que nos primeiros dias recebemos dezenas e dezenas de candidaturas de pessoas que tinham perfil e percurso e notas – no caso dos estagiários – para irem para qualquer um dos grandes escritórios, mas que perceberam a mensagem e perceberam que aqui era um tipo de escritório mais flexível, um pouco diferente do que eles estavam à procura. Nós respondemos às mensagens, ainda estamos numa fase assentar, de step by step, mas esperamos um dia receber essas pessoas que têm interesse. Só os clientes e o mercado é que dirão, nós não temos nenhuma obsessão sobre o tema. Queremos ser felizes.