Um gestor português ocupa um cargo de topo numa farmacêutica europeia que lidera a resposta na luta global contra a obesidade. A dinamarquesa Novo Nordisk produz dois medicamentos inovadores para esta epidemia: o Ozempic e o Wegovy.
É um mercado que vale muito dinheiro: em 2030, deverá valer 130 mil milhões de dólares (122,5 mil milhões de euros), segundo as contas do Goldman Sachs, que reviu este ano em alta a sua previsão, dada a evolução positiva da procura.
A companhia dinamarquesa é a mais valiosa da Europa em capitalização bolsista: 3,4 biliões de coroas dinamarquesas (456 mil milhões de euros), deixando à distância a casa de luxo francesa LVMH: 300 mil milhões de euros, surgindo na segunda posição. A sua grande concorrente é a norte-americana Eli Lilly.
Nuno Couto é o vice-presidente internacional da Terapia para a Obesidade da companhia dinamarquesa. Esteve na Web Summit na terça-feira, onde foi entrevistado no palco principal com o tema de fundo - Travar a epidemia da obesidade.
"Estar na indústria farmacêutica é apaixonante. Ajudamos muito os pacientes", começou por dizer ao JE à margem da sua intervenção na Web Summit.
Sobre a sua carreira profissional, recordou que "começou numa empresa portuguesa, a Tim.We, uma startup. Fiz o mestrado e sempre achei que ia voltar para a área das startups. Mas, de facto, estar na indústria farmacêutica é apaixonante. Ajudamos muito os pacientes e decidi ficar."
E quais os conselhos que daria a um estudante ou jovem profissional com interesse em progredir na área farmacêutica? "Estudem, tenham curiosidade, atravessem fronteiras. Encontrem a paixão para ajudar o paciente. É um mundo com muitas oportunidades, mas temos de fazer escolhas, e esta é uma escolha que parte dos nossos valores. E trabalhar na área ligada à saúde é uma área bastante recompensante."
Licenciado em Gestão e com um mestrado em Marketing, ambos pelo Instituto Superior de Gestão, o gestor começou a sua carreira na farmacêutica GSK no Reino Unido, tendo passado por vários países, incluindo o Brasil, Espanha, Eslovénia. Mais tarde, integrou os quadros da farmacêutica Novartis na Suíça e depois na Alemanha. Em 2022, ingressou na Novo Nordisk, mas na cidade suíça de Zurique.
Na sua intervenção no palco central da Web Summit, destacou que a obesidade é a "única doença" em que se coloca "todo o fardo" no doente. Em todo o mundo, mil milhões de pessoas vivem com obesidade, uma em cada oito habitantes do mundo, com o número a dobrar se forem tidas em conta as pessoas com excesso de peso e em risco de serem obesas.
"Facilmente, estamos a falar de 30% da população mundial. Qualquer um de nós, ou dos mais próximos, já foi tocado por esta doença", apontando que aos doentes é sempre apontada, injustamente, uma "falta de vontade ou falta de motivação, mas sabemos que é uma doença multi-fatorial: genética, metabolismo, DNA, fatores psicológicos ou socioeconómicos, como o acesso a boas calorias, o seu preço e diferenças culturais", afirmou na terça-feira perante uma plateia de milhares de pessoas na Altice Arena.
Dando o seu exemplo, recordou que cresceu na África do Sul, numa família mediterrânica, com uma alimentação equilibrada, e praticava vários desportos, incluindo ténis e futebol. Mas os cereais com açúcar a que misturava Coca-Cola ou outros refrigerantes, um mau exemplo seguido a partir de amigos, provocaram o excesso de peso. Sobre esse período, recordou o estigma associado ao excesso de peso. "Foi muito estigmatizante."
As dietas e o exercício são bons para manter a saúde, mas não são suficientes para manter um peso ideal, afirmou. "As pessoas voltam a ganhar peso várias vezes. É o efeito yo-yo. Acontece frequentemente."
"Aos 2-3 anos, o nosso corpo regista um determinado peso que considera ideal. Esse ponto sobe facilmente, mas é muito difícil descer", o que acontece desde que o ser humano era caçador-recoletor. "Há duas grandes razões para perder peso: falta de alimentos e doença. Quando se perde uma grande quantidade de peso, o nosso cérebro diz-nos que estamos em perigo. Estamos a lutar com a nossa biologia. A dieta e o exercício são importantes, mas não são a única resposta. O medicamento suprime o apetite, menos calorias ingeridas."
Caso contrário, "vamos acabar por desenvolver mais apps de exercício, mas não vamos estar a resolver o problema. Isto é como os ginásios no início de janeiro; depois, as pessoas deixam de ir."