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Portugal está num bom caminho mas já acionou "cartão de crédito ambiental", diz Associação Zero

"Ainda estamos muito longe de ser sustentáveis". Quem o diz é Susana Fonseca da Associação Zero, defendendo que Portugal tem de fazer mais e melhor, apostando noutro modelo económico. Para já, Portugal tem dado pequenos passos para atingir os ODS das Nações Unidas mas o caminho a trilhar ainda é longo e o relógio não pára.

Existem 248 indicadores globais para saber se os países se estão a esforçar para atingir as 169 metas dos '17 Objetivos de Desenvolvimento Sustentável da Agenda 2030' proposta pelas Nações Unidas.

Os últimos dados do Instituto Nacional de Estatística - que analisou 170 indicadores - mostra que Portugal já conseguiu chegar à meta em 20 deles e regista uma evolução positiva em 101 indicadores.

No entanto, ainda há um longo caminho a percorrer. Susana Fonseca da Associação Zero diz ao Jornal Económico que o caminho está a ser feito mas que ainda há muito para trabalhar porque há objetivos que "não estão perto de ser atingidos", isto devido às desigualdades existentes no que toca à sociedade.

"Quando olhamos para as avaliações que são feitas sobre os diferentes objetivos, Portugal está melhor que a média europeia em alguns e pior em outros casos", diz a responsável pela área Sociedades Sustentáveis.

"As sociedades desenvolvidas, por muito que já tenham feito para melhorar a sua eficiência, a circularidade dos materiais, ainda estamos muito longe de ser sustentáveis. Basta olhar para indicadores como o da pegada ecológica, que é um indicador agregado com várias dimensões. E o que nos diz? Se todos vivessem como vivemos em Portugal, seriam necessários três planetas", evidencia. "Não há sustentabilidade dentro deste contexto".

"Nós estamos a fazer um bom caminho e, embora tenhamos estagnado, já acionámos o nosso cartão de crédito ambiental no mesmo dia do ano passado. Mas não estamos de todo a regredir, nem nós nem os países desenvolvidos porque o próprio modelo económico em que assentamos não é compatível com a sustentabilidade. É um modelo que assenta muito na exploração de recursos naturais e humanos, numa lógica de produção e consumo constante", lança Susana Fonseca.

Sobre que alterações podem fazer os países desenvolvidos, Susana Fonseca lembra que não é só a reciclagem ou ser mais eficientes, ainda que o tenhamos de ser. "Precisamos cada vez mais de questionar o nosso modelo alimentar, o uso que fazemos da energia e dos nossos recursos".

Mas a responsável da Associação Zero relembra que ainda há população que ainda não tem acesso ao básico, evidenciando as desigualdades sentidas no planeta. "Os impactos das alterações climáticas em Moçambique não tem nada a ver com o impacto sentido em Portugal. Nós temos mecanismos de apoio que não se comparam com Moçambique", exemplifica.

Para Susana Fonseca, um dos maiores focos que Portugal deve ter para conseguir atingir os objetivos inseridos na Agenda 2030 é "repensar o modelo económico". "Enquanto não mexermos nesta máquina, e quando o digo é alterar o modelo da produção e consumo constantes, e na distribuição dos recursos, dificilmente vamos conseguir melhorar".

E o que pode ser alterado? Portugal pode apostar numa agricultura mais sustentável e respeitadora, centrada na soberania alimentar e na qualidade dos alimentos, ou no investimento em transportes públicos, melhorando toda a rede.

"Enquanto sociedade, temos de perceber que todos não podemos ter tudo o que queremos", sublinha. "Temos de encontrar outros modelos económicos que nos permitam viver nos limites do planeta mas com bem-estar. Sermos prósperos mas sem estarmos constantemente a crescer".

Nas palavras da responsável dos ambientalistas, o ser humano tem de ser mais comedido nos seus quereres e prolongar o tempo de vida do que já tem.

Qual o estado de Portugal?

No retrato do INE, Portugal tem nota máxima em 20 indicadores (já atingiu a meta), nota positiva em 101 e nota negativa em 28. Três indicadores estagnaram face à última análise e em 28 indicadores não existiam dados, o que equivale a uma nota negativa.

A qualidade da água foi uma das metas já atingidas. Portugal atingiu uma meta de 99% de água segura para consumo humano em 2021, cerca de nove anos antes do fim.

Ainda em termos ambientais, Portugal conseguiu reduzir em 32,9% o total de emissões de gases com efeito de estufa em 2020 quando comparado com 2005. Apesar da evolução positiva, o país ainda tem de trabalhar para atingir a redução proposta de 45%-55% até 2030.

E onde se saiu mal? Portugal apresentou uma evolução desfavorável na erradicação da pobreza, erradicação da fome e na obesidade, que aumentou, bem como nos preços da alimentação, cujo último aumento se deveu à guerra na Ucrânia.

Na igualdade de género, a nota também não é positiva, com o INE a indicar a fraca representação de deputadas. Também os resíduos urbanos continuam a pressionar o objetivo a atingir, com os resíduos a aumentarem para 5,3 milhões (513kg per capita) em 2020.

Na semana passada, o Presidente da República discursou na ONU e pediu mais financiamento para se atingir os objetivos propostos na Agenda 2030. "Continuamos a perder terreno", disse Marcelo Rebelo de Sousa em Nova Iorque, notando que a meio do percurso (faltam sete anos para se fazer o balanço final) "o contexto é crítico".

O que é a Agenda 2030?

A Agenda 2030 foi assinada em 2015 pelas Nações Unidas e ficaram definidos 17 Objetivos de Desenvolvimento Sustentável a atingir até ao ano em questão. A conquista dos indicadores arrancou a 1 de janeiro de 2016.

"A Agenda 2030 é uma agenda alargada e ambiciosa que aborda várias dimensões do desenvolvimento sustentável (sócio, económico, ambiental) e que promove a paz, a justiça e instituições eficazes", lê-se na página da ONU.

Para António Guterres existem pilares que os países devem começar a atacar de forma imediata, nomeadamentea fome, a transição para as energias renováveis, digitalização, a educação de qualidade, o trabalho digno e a proteção social e a crise climática.

“Estou profundamente encorajado pela política abrangente que estamos a discutir, especialmente pelo compromisso de melhorar o acesso dos países em desenvolvimento ao combustível necessário para o progresso nos ODS: o financiamento", disse Guterres na sede da ONU.

Mas o Alto Representante das Nações Unidas evidenciou que os países, governos, empresas e organizações globais têm de "unir forças" para conseguir atingir os objetivos propostos, uma vez que o tempo começa a fugir.

Quais são os objetivos?

  1. Erradicar a pobreza
  2. Erradicar a fome
  3. Saúde de qualidade
  4. Educação de qualidade
  5. Igualdade de género
  6. Água potável e saneamento
  7. Energias renováveis e acessíveis
  8. Trabalho digno e crescimento económico
  9. Indústria, inovação e infraestrutura
  10. Reduzir as desigualdades
  11. Cidades e comunidades sustentáveis
  12. Produção e consumo sustentáveis
  13. Ação climática
  14. Proteger a vida marinha
  15. Proteger a vida terrestre
  16. Paz, justiça e instituições eficazes
  17. Parcerias para a implementação dos objetivos