Lisboa volta esta quinta-feira a receber o STEM Women Congress (SWC) – o evento que pretende reduzir a desigualdade de género na ciência, tecnologia, engenharia e matemática – e há alguns “puxões de orelhas” a dar a Portugal. Depois de um ano a estudar o mercado português, a organização internacional tem dados concretos para apresentar no congresso e conclusões a retirar deles, nomeadamente uma: é preciso fazer mais nas escolas para ter mais mulheres nas ciências e matemáticas.
O SWC analisou os programas que o país tem para inspirar raparigas a entrarem em cursos que lhes abram portas para uma carreira técnico-científica e concluiu que só tiveram impacto em 17.2501 crianças com idades compreendidas entre 1 e 14 anos até 2023, o que representa menos de 2% (1,26%) das crianças. Logo, é preciso atuar mais na educação pré-escolar e básica.
Isto acontece porque a etapa da carreira – iniciativas para o ensino secundário, superior e profissional – é uma prioridade para a maioria das iniciativas analistas. Ou seja, existem em Portugal 15 programas de inspiração (educação pré-primária e ensino básico) e 29 de carreira. Outra curiosidade é que mais de metade (57%) estão interessadas em recrutar voluntários para os seus projetos.
Segundo a informação avançada pelo SWC ao Jornal Económico (JE), “os estereótipos de género podem ter um impacto desde tenra idade, mas muitas vezes são abordados mais tarde”. “Mudar perceções e quebrar estereótipos mais cedo é crucial para construir uma base sólida. Muitas iniciativas STEM concentram-se no ensino secundário e universitário, onde as decisões vocacionais já foram tomadas”, defende a instituição de origem espanhola.
Mar Martínez Porras, uma das diretoras do SWC, esteve à conversa com o JE e comparou as duas economias da Península Ibérica. “Podemos ver que, nos primeiros anos de escola, há mais raparigas orientadas para a tecnologia em Portugal do que em Espanha. Quanto aos dados que temos para as universidades, identificámos é que há menos iniciativas STEM em Portugal do que em Espanha”, informou a ativista do talento feminino que estará hoje no palco da Gare Marítima de Alcântara a detalhar estes números.
De facto, os eventos (69%) são as atividades que, geralmente, têm o maior impacto no maior número (quantitativo) de mulheres nas STEM, mas é a formação (62%) e a mentoria (62%) que têm o maior impacto qualitativo. No ano passado, provavelmente devido a fundos europeus e ODS das Nações Unidas, as empresas deram avanços na diversidade, na equidade e na inclusão.
“É a segunda edição deste congresso, portanto significa que estamos a criar impacto na sociedade portuguesa desde a última edição. É para isso que estamos aqui e agora temos um relatório para apresentar, que resultou da nossa recolha de dados ao longo do ano. É necessário para tomar decisões”, destacou Mar Martínez Porras, em declarações ao JE.
Falta descentralizar. Lisboa e Porto recebem quase exclusivamente o impacto de todas as iniciativas STEM, segundo a radiografia elaborada pelo SWC. Por exemplo, em Vila Real, Évora e Beja só há uma iniciativa STEM (Science, Technology, Engineering & Mathematics).
Ainda assim, de acordo com os dados do Eurostat referentes a 2021, Portugal está acima da média europeia de mulheres licenciadas em STEM, com 37,7% contra 32,8%, apenas atrás da Roménia (42,5%), Polónia (41,5%), Grécia (40,9%), Itália (39%) e Croácia (37,9%). As taxas mais baixas foram registadas na Bélgica (27,4%), Espanha e Alemanha (ambas com 27,7%) e Áustria (28%). A questão é: e se saírem todas de Portugal?
“Conseguimos identificar alguns movimentos de raparigas jovens, que terminam as suas formações tecnológicas, a sair do país devido ao diferencial de género. Estamos atentas a isto também, porque se conseguirmos mais raparigas nas escolas e cursos STEM tanto em Portugal como em Espanha, mas essas raparigas acabarem por sair do país… É um grande desafio para endereçar”, advertiu Mar Martínez Porras, que tem duas filhas e trabalha na Ricoh Espanha.
Os dados do primeiro relatório STEM em Portugal foram comparados com a informação sociodemográfica da população em Portugal, publicada pelo Instituto Nacional de Estatística (INE) e pela Direção-Geral de Estatísticas da Educação e Ciência (DGEEC).