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“Pequenas empresas não têm forma de reescalonar dívidas sem que o Banco de Portugal seja sinalizado”

A Matoaka tem duas unidades de negócio, uma das quais permite a qualquer empresário colocar à venda a sua empresa, que será avaliada cem 10 minutos, como explica ao JE um co-CEO da empresa de consultoria. O plano é potencial 50-70 transações anuais de micro e PME em dois anos.

A empresa portuguesa Matoaka, uma espécie de consultora de M&A para micro e pequenas empresas, conta com uma plataforma digital com um conjunto de oportunidades no mercado das fusões e aquisições. Atualmente, estão em fase de conclusão “cinco ou seis” transações iniciadas no primeiro semestre, sendo que a estimativa é que se chegue aos “50 a 70” negócios anuais num prazo de dois anos.

A previsão foi deixada ao Jornal Económico (JE) pelo co-CEO e sócio fundador da Matoaka, Paulo Lima, que referiu que, ao serem inseridos os dados referentes a determinada empresa, é feita uma avaliação que demora “dez minutos.” Os potenciais interessados podem fazer também a sua avaliação e, eventualmente, efetuar uma proposta de aquisição.

O responsável aponta ainda para as dificuldades atravessadas pelas micro e pequenas empresas, que contribuíram para o crescimento de 18% ao nível das insolvências no primeiro trimestre. Uma tendência que pode ser travada por eventuais novos cortes nas taxas de juro do BCE, explica.

Na prática, a Matoaka tem duas unidades de negócio. Quais são as principais diferenças entre ambas?

A Matoaka foi criada entre dois caminhos que estavam a ser feitos em paralelo. De um lado, a Ó Capital, liderada pela Sara do Ó, que tinha já criado um produto de apoio a micro e pequenas empresas para promover o seu crescimento. Por outro lado, eu e o meu sócio Miguel Marecos criámos uma plataforma para venda de micro e pequenas empresas, porque acreditávamos efetivamente que o mercado de M&A [português] acabava nas médias e grandes empresas. As micro e pequenas empresas não tinham uma montra credível para mostrar a investidores que efetivamente estas são empresas tão válidas como as outras para serem negociadas e que têm retornos muito acima de outros de outros tipos de investimento.

Hoje em dia temos um serviço que é o Energize, que promove de uma forma informal e muito acompanhada a micro e pequenas empresas, a sua profissionalização, acima de tudo, para crescer. E a plataforma de Transfer, destinada a vender micro e pequenas empresas, que tem um modelo automático de avaliação. Qualquer pessoa pode entrar na plataforma enquanto dono de uma empresa e colocar a sua empresa à venda em apenas dez minutos e tem logo uma avaliação.

Os investidores podem vir à nossa plataforma e, de uma forma informada e credível, ver as oportunidades que existem e saber se são investimentos que fazem sentido para a sua carteira de investimentos.

Qual foi o vosso volume de transações no primeiro semestre do ano?

Nós começámos no início do ano. Estamos ainda a dar-nos a conhecer ao mercado e a mostrar que existe efetivamente solução para estes empresários colocarem os seus negócios à venda. O crescimento em termos de utilizadores tem sido exponencial de trimestre para trimestre e as oportunidades que surgem também têm sido bastante têm crescido quase 100% ao mês.

Neste primeiro semestre temos cinco ou seis transações, que estamos em fase de conclusão. No segundo semestre, dado este crescimento, se calhar vamos conseguir fazer também mais cinco ou seis. Se calhar estamos a falar hipoteticamente de seis a 10 transações este ano, com um horizonte que queremos atingir, como plano de negócios a dois anos, de fazer entre 50 e 70 transações por ano, só na plataforma de Transfer da Matoaka.

E na outra vossa frente?

No negócio do Energize, já estamos a apoiar dez clientes e a nossa lógica é construir uma base mais ou menos de 20 a 25 empresas em que estamos a potenciar o seu crescimento e fazer este caminho de micro a pequena e pequena a média empresa. 

Qual o investimento que planeiam fazer em 2024?

Fazemos muito investimento, mas que fazemos tipicamente porque é uma empresa que se destina a credibilizar também a nossa plataforma de reconhecimento da plataforma para os investidores É um investimento que nós fazemos muito direcionado ao marketing que que estamos a fazer e promover também neste caso os gestores, que sou eu, o Miguel [Marecos] e a Margarida Xavier de Basto.

Abordando o mercado de micro e pequenas empresas, importa falar sobre insolvências, que tiveram um aumento de 18% no primeiro semestre e grande parte dos números são referentes a empresas destas tipologias. O que é que está a falhar no tecido empresarial português?

Nós temos estado a trabalhar com o grande segmento do tecido empresarial, que são as micro e pequenas empresas, que são também, nesta realidade destes 18%, se calhar 80 ou 90% dessas insolvências. Acreditamos que há um desfasamento muito grande do que é o serviço da dívida que estas empresas podem pagar versus o endividamento que têm.

E isto tem a ver com uma herança também pesada, que veio de, logicamente, de dois anos de Covid, que trouxeram muita dívida para as empresas. Uma dívida que na altura parecia fácil, com garantias do Estado, etc., mas que agora está a começar a pesar no cash flow das empresas.

Isto, a juntar à maior subida da inflação nos últimos 15 anos, levou a que as empresas ao mesmo tempo libertassem também menos dinheiro para o serviço de dívida. Ou seja, numa primeira instância, contraíram mais dívida por um período que não era esperado e, depois, ficaram com menos fundo de maneio para pagar o serviço de dívida.

Quais os principais riscos para as empresas?

O que existe atualmente é uma situação asfixiante, porque também não há medidas dentro de um enquadramento que se diga normal, de as empresas poderem reescalonar as suas dívidas sem serem, por exemplo, sinalizadas no Banco de Portugal (BdP) como empresas em dificuldades. Nós até assistimos a empresas que estão a faturar mais, mas que têm, por exemplo, metade da rentabilidade fruto da inflação, que não podem passar o preço para os clientes finais.

O que acontece é que não existem instrumentos que digam “ok, compreendemos, então vamos procurar reescalonar isto dentro de um enquadramento, que seja normal e não de risco” de sinalização do Banco de Portugal.

Acreditamos que nas micro e pequenas empresas, que é o segmento que nós trabalhamos muito, esta é uma das grandes questões. E isto foi uma herança, não é algo que que foi só uma questão de incapacidade de gestão ou literacia. Claro que muitos outros casos também têm a ver com esses fatores.

Acha que essa problemática da dívida pode ser ultrapassada em 2025-2026?

Chegámos ao final deste primeiro semestre e as indicações parecem ser melhores, pelo menos no que diz respeito às taxas de juro, sinalizadas pelo Banco Central Europeu. Claro que isto também aumenta a confiança nas instituições bancárias e outros instrumentos de apoiar estas empresas. Como não existem instrumentos de reescalonamento, muitas vezes as entidades bancárias estão a promover novos financiamentos para colmatar este desfasamento de serviço de dívida que têm tem essa capacidade.

Nesse sentido, pode haver uma maior confiança de instituições bancárias de voltar a confiar nestas empresas e nos seus rácios e substituir as dívidas. Ou seja, haver uma substituição da dívida e isso promover naturalmente uma diminuição das insolvências. Acho que podemos prever esse comportamento se realmente começarmos a assistir a esta diminuição das taxas de juro de referência.