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Nova cimeira da EU volta a debater os ativos russos congelados na Bélgica

A utilização ou não de 140 mil milhões de euros de ativos russo congelados na união divide os 27 e estará, por isso, mais uma vez no centro do debate - que em Copenhaga não resultou em nada. Entretanto, a Ucrânia foi às compras na Suécia.

Na véspera de mais uma cimeira da União Europeia onde a guerra da Ucrânia voltará a ser abordada, aquele país invadido pela Rússia e a Suécia – um dos dois países que, juntamente com a Finlândia, solicitaram a sua adesão à NATO - assinaram um acordo para a compra de até 150 caças Gripen E, com as primeiras entregas previstas para 2026 e o acordo manter-se-á por uma década.

António Costa, presidente do Conselho Europeu, enviou uma convocatória aos chefes de Estado e de governo dos 27 em que explicava que a cimeira vai concentrar-se na estabilização do apoio à Ucrânia, nomeadamente através da utilização dos recursos financeiros russos congelados no interior da União Europeia. Até agora, e apesar de cada vez mais países estarem a aderir a esta possibilidade – a França foi o mais recente a ‘mudar de lado’ – ainda não foi possível ao bloco chegar a um entendimento final sobre a matéria.

Para além dos opositores do costume – desde logo a a Hungria – a Bélgica, onde está sediado o dinheiro congelado, não está nada entusiasmada com o plano, afirmando que pode servir de motivo para outros investidores deixarem de enviar dinheiro para a Europa. O assunto dominou a última cimeira informal de Copenhaga, no início de outubro, e ocupou praticamente a totalidade da discussão. Volodymyr Zelensky vai intervir no início da cimeira, certamente para pedir que os Estados-membros se coordenem para poder usufruir do financiamento.

O Euroclea é um depósito central de valores mobiliários com sede em Bruxelas, onde foram acantonados a grande maioria dos ativos russos congelados como parte das sanções impostas pela União Europeia depois da invasão da Ucrânia. São cerca de 176 mil milhões de euros, com 10 mil milhões adicionais previstos para os próximos anos – segundo dados da própria União. Esses dados indicam ainda que o total de ativos soberanos russos congelados fora das suas fronteiras ascendem aos 300 mil milhões de euros – dos quais 200 mil milhões estão na União Europeia e o restante na Austrália e em países do G7.

O plano de criação do fundo pressupõe que a Euroclear transfira os fundos russos para a Comissão, que os usaria para emitir um empréstimo sem juros à Ucrânia. Mas a Euroclear é uma infraestrutura financeira global que fornece serviços de pós-negociação para instituições financeiras de mais de 80 países – garantindo a liquidação e custódia seguras de títulos, ações, derivados e fundos de investimento. Ora, se aquela estrutura transferir estes fundos russos para a Comissão, está a violar as suas próprias regras – sendo precisamente por isso que o governo belga tem colocado sérios entraves ao plano. O mesmo se passa, aliás, com Christine Lagarde, governadora do Banco Central Europeu, que não se mostrou nada entusiasmada com a possibilidade de violação de uma regra central para o sistema financeiro global.

Também não está claro até que ponto cada Estado-membro é chamado a responsabilizar-se por todo o processo, nomeadamente no que tem a ver com as implicações financeiras decorrentes da forte possibilidade de a Rússia nunca vir a assumir – ao contrário do que a União espera – esse pagamento.

Na carta enviada para cada Estado-membro, o presidente do Conselho Europeu, dá conta, segundo a agência Lusa, de que o reforço da defesa e segurança do bloco político-económico europeu também vai fazer parte da discussão dos líderes. No final, é de esperar que haja resultados não só em termos do uso do dinheiro russo, mas também do reforço coletivo na área da defesa, especialmente, e a curto prazo, a chamada ‘muralha de drones’.

O objetivo é reforçar a área da defesa da UE até 2030, coincidindo com o que 23 dos 27 Estados-membros concordaram na cimeira de Haia, nos Países Baixos, no âmbito da NATO. Os presidentes do Banco Central Europeu, Christine Lagarde, e do Eurogrupo, Paschal Donohoe, também vão participar.

Não se confinando a questões sobre a Ucrânia, os líderes reunidos em Bruxelas deverão abordar também a crise na habitação que está a ser sentida em praticamente todos os países da UE. António Costa quer uma discussão sobre “habitação acessível” sobre esta “crescente preocupação social e económica, incluindo para cidadãos de rendimentos médios e as gerações mais jovens”.

O último tópico da discussão vai ser o Médio Oriente. O assunto já estava incluído na agenda da reunião, mas a atualidade impôs-se e a discussão já não será a perspetiva de um cessar-fogo entre Israel e o Hamas, mas como apoiá-lo depois de já ter entrado em vigor. Que papel poderá ter a União na reconstrução de Gaza e no apoio às autoridades palestinianas, também faz parte da cimeira.

Ainda no que tem a ver com a compra de aviões, o primeiro-ministro sueco Ulf Kristersson e o presidente da Ucrânia Volodymyr Zelensky encontraram-se em Linkoping, sede da empresa de defesa Saab, que produz os jatos. Kristersson esclareceu que o memorando não visava novos fornecimentos imediato: "este é o início de uma longa jornada de 10 a 15 anos", disse, citado pela agência Eurnews, salientando que o plano diz respeito à variante mais moderna do avião – que tem ainda uma capacidade de produção limitada. “Uma Ucrânia forte e capaz é uma prioridade fundamental para a Suécia, e continuaremos a garantir que o país possa lutar contra a agressão da Rússia”, disse Kristersson nas redes sociais.

Zelenskyy disse, citado pela mesma fonte, que as aeronaves JAS 39 Gripen são “um dos elementos mais eficazes” quando se trata de fortalecer as capacidades de defesa da Ucrânia. Este modelo foi usado em combate direto pela primeira vez neste ano, quando a Tailândia enviou caças em confrontos com o Camboja. Antes disso, estes caças eram usados ​​principalmente para policiamento aéreo. Foram enviados à Polónia em 2025 como parte de uma missão da NATO para patrulhar o espaço aéreo aliado – já depois de terem sido usados para reforçar a zona de exclusão aérea da organização atlântica na Líbia em 2014 – uma intervenção que continua a ser considerada como das mais desastradas da NATO. Curiosamente, refere a imprensa sueca, o Gripen E é equipado com um motor fabricado nos Estados Unidos, o General Electric F414-GE-39E.

“Contamos com as primeiras entregas dos Gripens já em 2026”, disse Zelensky, para confirmar que pilotos ucranianos já começaram o treino nos aviões suecos. “Também discutimos a situação com a defesa aérea. Foi dada atenção especial ao setor energético da Ucrânia, com necessidades urgentes decorrentes dos ataques contínuos da Rússia à nossa infraestrutura energética”, acrescentou. O presidente da Ucrânia também disse que Kiev e Estocolmo “coordenaram posições antes das reuniões desta semana na Europa, da sessão do Conselho Europeu em Bruxelas e da Coligação dos Dispostos, em Londres”.

“É crucial permanecermos unidos nas nossas decisões para alcançar os resultados que almejamos”, disse Zelensky um dia antes da cimeira da União, que se concentrará nas questões de defesa e segurança para a Ucrânia e para a Europa no seu conjunto.