Para quem exerce funções de liderança, o tempo é um recurso importante e escasso. Tão escasso que algumas lideranças não têm “vida própria”. Tão importante que as organizações instituem mecanismos de uso eficiente desse tempo.
Quando Jeff Immelt, ex-líder da General Electric (GE), se deslocava em jato executivo, era secundado por outro jato, para a eventualidade de o primeiro ficar inoperável. Revelado o caso, Immelt alegou desconhecer o arranjo. Desconhecesse-o ou não, o argumento é inexplicável num líder com a responsabilidade e o colossal poder de quem liderava a GE.
O caso ajuda a compreender como algumas lideranças de topo passam a viver numa bolha que as torna imunes à realidade do comum dos mortais. Com o decurso do tempo, o desvio torna-se a norma – e o discernimento para compreender a realidade empobrece. O caso é ainda emblemático de uma doutrina empresarial pregada pelo outrora “messias da gestão” Jack Welch, assente na maximização do valor para o acionista (a qualquer preço) e na remuneração faustosa das lideranças. Que os alicerces dessa cultura eram problemáticos é agora visível no declínio da GE.
Jack Welch, cuja doutrina inspirou numerosas lideranças (com as consequências nefastas agora visíveis em empresas como a Boeing), é hoje encarado como “o homem que quebrou o capitalismo” – título de um livro de David Gelles (Simon & Schuster, 2022), cuja leitura deveria ser “obrigatória” em qualquer curso de gestão.
Antes que me acusem de demagogia, cito Lars Sorenson, em entrevista à “Harvard Business Review”, em 2015, enquanto CEO da multinacional Novo Nordisk. Sorenson, então nomeado CEO do ano, afirmou: “Quando tomamos decisões, os empregados devem fazer parte da jornada e saber que não estão apenas a encher os meus bolsos. E mesmo que eu seja um dos menos bem pagos (…), ganho mais num ano do que um operário durante toda a sua vida”.
E acrescentou: “Há outras coisas que distanciam os executivos dos empregados, como o uso de aviões privados. Na Novo Nordisk não os usamos, ainda que sejamos uma grande empresa. Isso enviaria um sinal aos meus empregados de que o meu tempo é mais valioso do que o deles. Poder-se-ia argumentar que é, em certa medida. Mas, filosoficamente, isso criaria distância entre nós. Não sou adepto disso”.
Sejamos claros: as lideranças devem ser justamente compensadas. Merecem ser premiadas pelo valor que acrescentam às empresas. Mas, ao longo das últimas décadas, algumas discrepâncias entre a compensação das lideranças de topo e a dos restantes trabalhadores tornaram-se indecorosas. Criam indignação e alienação. São perversas para a conduta responsável e o desempenho sustentável das empresas.
Segundo investigação publicada num artigo da “Harvard Business Review” (julho-gosto de 2022), há três sinais de alerta que as empresas deveriam considerar antes de contratar lideranças de topo. Essas pessoas são propensas a gastos exorbitantes? Estão especialmente focadas em ganhos pessoais? Revelam um certo desprezo pelas regras e políticas de despesas da empresa? Quando estas três condutas (i.e., sinais de ganância) estão presentes, a probabilidade de condutas de liderança problemáticas é maior. Daí a ilação contemplada no título do artigo: “Quando contratar CEOs, foque-se no caráter”.