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Nickel quer estar onde a “banca tradicional já não está” e admite concorrer no crédito

Há dois anos em Portugal, a Nickel está a crescer mais cá do que em Espanha ou Bélgica. Quer aumentar a rede de parceiros para conquistar mais clientes à banca, podendo entrar no crédito. As comissões baixas são vantagem, mas João Guerra, o CEO da Nickel Portugal, admite que vão subir.

A Nickel está a completar dois anos de crescimento no mercado nacional. Através dos cerca de 600 parceiros, a fintech de origem francesa quer combater a inércia e conquistar cada vez mais clientes portugueses, nomeadamente aqueles em locais onde os bancos têm vindo a encerrar balcões, mas também através de novos produtos como é o caso do crédito. Os custos baixos são uma das vantagens das contas, diz João Guerra, CEO da Nickel Portugal, em entrevista ao Jornal Económico, admitindo, no entanto, que as comissões vão subir, assim como poderão aumentar as dos bancos em resultado da revisão do modelo de funcionamento do MBWay.

Que balanço faz destes dois anos de atividade da Nickel em Portugal?

O balanço que fazemos é claramente muito positivo. Um estudo lançado recentemente pela Nickel mostra que há ainda muito espaço no mercado nacional para este tipo de novos players, novos modelos de negócio, alguns mais digitais, outros híbridos, como é o nosso caso. Isso vê-se não só pela adesão dos clientes, como pela adesão dos próprios pontos de venda.

Como funciona o modelo de negócio da Nickel?

Temos um modelo de negócio completamente diferente da banca tradicional. Não temos os tradicionais balcões. Temos uma rede de agentes que são tipicamente papelarias, tabacarias, lojas do comércio local que são nossos agentes, nossos parceiros e onde as pessoas podem abrir uma conta, fazer os pagamentos e levantar e depositar dinheiro. Temos hoje – e não contávamos com isso – cerca de 600 pontos de venda. 

Mantêm a meta de alcançar 2.500 pontos de venda até 2027 ou poderá ser revista?

Para já não a revimos. Quando lançámos já estávamos com 100 pontos de venda. Foi um trabalho feito no terreno e o comércio local percebeu as vantagens que isto tem para eles e para os consumidores. Hoje estamos satisfeitos por termos esta dimensão [600 pontos de venda]. Quando se compara com a dimensão da rede de balcões dos bancos tradicionais, a rede da Nickel é uma das maiores. Isso é muito significativo.

Mas os pontos de venda da Nickel não têm colaboradores especializados atrás do balcão como num banco tradicional…

Não é uma questão de ser especializado. Têm de ter formação, nomeadamente em termos de branqueamento de capitais e combate ao financiamento do terrorismo. O que as pessoas mais usam no dia-a-dia da sua conta são as transações do próprio dia-a-dia. Consigo ter este tipo de operações no ponto de venda. Para isso não preciso de ter pessoas muito especializadas. Consigo operar de uma forma muito mais simples, mais barata, muito mais descentralizada, com uma dimensão muito maior. E consigo estar onde a banca tradicional está a sair.

Têm parcerias em todo o país ou sobretudo nos centros urbanos?

Em valores absolutos, temos mais nos centros urbanos, mas também é onde temos mais população. O nosso objetivo, ao crescer dos 600 para os 2.500 pontos de vendas, é estar nesses locais onde a banca tradicional já não está, onde temos populações mais envelhecidas ou digitalmente menos aptas.

Queriam atingir 450 mil clientes até 2027. Quantos clientes conquistaram até agora?

Valorizamos mais a comparação com alguns benchmarks. Lançámos a Nickel na Bélgica, um ano antes de Portugal, naquele que é um país semelhante em termos de dimensão da população e tem uma proximidade de França muito maior. Estamos, em termos de ritmo de crescimento de clientes, bastante acima. Outro benchmark é Espanha. Também estamos com ritmos superiores.

A Nickel pode vir a oferecer outro tipo de serviços ou produtos em Portugal? Pode vir a apostar no crédito? 

Pode vir. A ideia é – também depende da nossa licença em termos de operação junto do Banco de Portugal – ir tornando a conta o mais completa possível. Hoje em dia responde às necessidades essenciais dos portugueses. Mais de 90% das vezes realizam levantamentos, depósitos, as transferências e os pagamentos. Em França já estamos mais avançados nesse estudo de avançar eventualmente com parceiros na oferta de outros produtos que possam complementar a oferta da Nickel.

Como o crédito?

Como o crédito, por exemplo. Foi uma das coisas que falámos no lançamento da Nickel. Em França essa análise está bastante mais evoluída.

Será algo para breve em Portugal?

Não será para este ano de certeza.

Pode ser lançado no próximo ano?

Se, por exemplo, em França avançar ainda no início do próximo ano, depois o escalar a Portugal ou aos outros países pode ser relativamente rápido.

Como compara as comissões cobradas para se ter uma conta na Nickel com as da chamada banca tradicional?

Queremos ter um preçário muito simples e que as pessoas conhecem. Praticamente, a única comissão que temos é a de manutenção de conta que é paga na abertura de conta que são 20 euros mais Imposto do Selo no plano standard. Depois há duas ou três operações que são também alvo de custo. Por exemplo, o depósito em numerário nos pontos de venda é pago. As transferências imediatas são pagas, mas o valor é inferior ao da banca.

A banca tradicional continua a ser mais segura aos olhos dos portugueses em comparação com a banca digital? 

A confiança sempre foi e sempre será um pilar fundamental em muitos sectores, mas claramente no sector financeiro porque é onde as pessoas têm o seu dinheiro. A Nickel tem por detrás o maior banco da Europa, o BNP Paribas. O que concluímos do estudo é que mais de 73% dos portugueses consideram vir a trabalhar com instituições financeiras digitais e 95% dizem já conhecer algumas dessas instituições. Mas também mostra que mais de metade trabalha só com um banco, mais de 45% dizem que a última vez que mudaram de banco foi há mais de cinco anos. O que se nota é que as pessoas demonstram que querem mudar. As razões da mudança são maioritariamente os custos. Mas depois mostram-se conformadas.

Apesar desta inércia, há espaço para fintechs como a Nickel crescerem em Portugal?

Acho que há espaço, claramente. Há espaço para novos modelos de negócio e novos players e para estimular a concorrência para que se possa adequar mais os serviços às necessidades dos consumidores. 

Como vê a alteração do modelo de negócio do MBWay da SIBS, passando a ser possível associar uma conta e não apenas um cartão a um número?

Países como França, Bélgica, Alemanha, alguns dos nórdicos, já adotaram uma ferramenta que se chama Wero que é uma espécie de MBWay para todos através da qual posso fazer transferências por telefone num segundo entre países. Portugal não aderiu porque tem o MBWay, que é forte, e tem a SIBS. O que faria sentido seria haver uma plataforma a nível europeu, pois iria beneficiar mais os consumidores. Já se está a fazer, há essas iniciativas, mas Portugal não está bem a caminhar por aí. 

Tendo em conta a polémica em torno do MBWay e possível aumento das comissões cobradas nestes serviços, teme que haja uma alteração legislativa que proíba a cobrança de uma comissão? 

Todas essas transferências entre telefones agora vão estar assentes nas transferências instantâneas. Diria que a maioria dos bancos cobra por isso, cerca de um, dois, três euros. Nós cobramos cerca de 80 cêntimos. Daqui a uns meses, essas mesmas transferências não vão poder ter um valor superior ao das transferências normais. Essas são, para a maior parte das contas pacote – e é o nosso caso também -, gratuitas. Ou os bancos as vão passar a cobrar ligeiramente ou vão ter obrigatoriamente que pôr as transferências imediatas a custo zero. Os bancos acabam por transferir todos esses custos para a comissão de manutenção de conta.

Isso pode impactar a Nickel?

Claro. Vamos ter de estar atentos a essas mudanças legislativas para decidirmos o que vamos fazer com essas cobranças. Queremos manter o nosso modelo de negócio em que as pessoas que precisam de realizar operações essenciais podem ter uma conta pagando o mínimo possível.

Podem ter de aumentar a comissão de manutenção?

Em breve iremos ajustar. França subiu este ano, ao fim de dez anos, para 25 euros. Tomámos a decisão, quando lançámos em Portugal, de arrancar com uma comissão de manutenção de conta anual de 20 euros. Mas é normal que, em breve, tenhamos de ajustar.