A reunião desta semana do Banco Central Europeu (BCE) deve trazer o primeiro dos tão aguardados cortes de juros, isto apesar de a inflação ter subido, a atividade dar sinais de recuperação e o mercado laboral permanecer com uma rigidez histórica. Os comentários do economista-chefe do banco ao ‘Financial Times’ esta semana reforçam esta noção, embora permaneça a interrogação sobre o rumo da política monetária após junho.
Com as taxas em níveis máximos na história da moeda única há cinco reuniões consecutivas, investidores e analistas têm-se focado no arranque da normalização monetária, algo que deverá acontecer esta quinta-feira. A tendência decrescente da inflação nominal no último ano (com um pequeno percalço apenas em dezembro) já deixava adivinhar esta possibilidade e a entrevista de Philip Lane, economista-chefe do BCE, ao ‘Financial Times’ esta semana, veio dar mais indícios nesse sentido.
“Excluindo quaisquer surpresas de maior, nesta altura existem indícios suficientes para retirarmos os níveis mais altos de restritividade”, afirmou o responsável do banco central, uma declaração vista pelos mercados como um sinal claro de que os juros diretores deverão descer, já em junho, dos atuais 4% a 4,5%, arrancando com uma redução de 25 pontos base (25 p.b.).
Esta ideia foi reforçada no mesmo dia pelo governador do banco central finlandês, Olli Rehn, um dos membros vistos como mais neutros do Conselho do BCE. Rehn falou numa “descida sustentada” da inflação de volta ao objetivo de 2%, abrindo a porta a cortes em junho, “assumindo que a tendência de desinflação continua e não haverá mais percalços com a situação geopolítica e os preços da energia”.
A inflação de maio até registou uma pequena subida em termos homólogos, chegando a 2,6%, muito longe de qualquer “surpresa de maior”, consideram os especialistas, que até já antecipavam uma leitura marginalmente acima dos 2,4% de abril.
“Um pequeno aumento da inflação nominal era largamente esperado, mas teria de ser extremamente grande para demover o BCE de um corte em junho”, argumenta Felix Feather, economista da abrdn. O ponto-chave agora está, aponta, no rumo da política monetária após a reunião desta semana – e o elemento determinante aí é a inflação subjacente, particularmente do lado dos serviços.
“A inflação nos serviços ainda não está num ponto normal e isso está ligado ao facto de a inflação nos salários ainda ter muito para recuperar, dada a forma desfasada como os salários são redefinidos”, sublinhou Philip Lane, ressalvando que a pressão do lado dos serviços já vinha descendo em abril.
Em maio, a inflação core ficou em 2,9%, voltando a subir após mais de meio ano em queda. Do lado dos serviços, a inflação subiu ainda mais, 0,4 pontos percentuais (p.p.), chegando a 4,1% e deixando sérias dúvidas sobre a possibilidade de mais cortes após a reunião de junho.
"Estes dados matam por completo qualquer esperança de um segundo corte ainda durante o verão, em julho. Também vamos remover a nossa projeção de um corte em outubro, dado que o salto na inflação nos serviços aponta para uma core mais persistente do que esperávamos", escrevem os analistas da Pantheon Macro.
Do lado do mercado de trabalho, a taxa de desemprego na moeda única voltou a cair em abril, ficando em 6,4%. Com a recuperação da atividade na zona euro (o índice de gestores de compras composto está em zona de expansão da economia há três meses e os dois subíndices estão numa tendência crescente), a Pantheon projeta que a taxa de desemprego se mantenha estável até ao final do ano com o emprego a continuar a subir.
No entanto, há o risco de a procura das empresas por trabalho crescer mais rápido do que a oferta de trabalhadores, “fazendo o desemprego descer ainda mais” e tornando “uma aterragem perfeita de volta aos 2% de inflação cada vez mais improvável”.
“Isso quer dizer que as previsões de taxas de 2,5%, ou abaixo disso, no próximo ano terão de ser revistas em alta em breve. Não esperamos os juros diretores do BCE abaixo de 3%”, lê-se na nota da Pantheon.