Matoaka. Era assim conhecida a famosa indígena americana Pocahontas durante a infância. Mais de quatrocentos anos depois, este é o nome da consultora – ainda que os fundadores não gostem da designação "consultoria" – portuguesa que chegou ao mercado em setembro com o objetivo de apoiar os pequenos empresários como se fossem membros da mesma tribo.
“Ao princípio estranha-se e depois entranha-se. Queríamos transmitir uma mensagem de espírito tribal. As tribos dão uma noção união e cooperação, que é muito mais do que uma simples parceria. Gostamos de ser chamados ecossistema”, explica Paulo Lima, sócio e co-CEO da Matoaka, ao Jornal Económico (JE).
Paulo Lima, Miguel Marecos (co-CEO e sócio) e Margarida Xavier de Basto (COO), com a acionista Sara do Ó (chairman da Ó Capital e CEO do grupo Your) são os três empreendedores por detrás desta nova startup de assessoria a empresas que pretendem crescer, mudar ou ser compradas. Num investimento inicial de 100 mil euros, lançaram uma plataforma digital de M&A (Mergers & Acquisitions) que funciona como uma espécie de OLX mais profissional ou Standvirtual de compra e venda de micro e pequenas empresas.
Há duas unidades de negócio: o Energize (“Energização”) de consultoria e o Transfer (“Transferência”) para as fusões e aquisições. “Identificámos que não havia em Portugal uma plataforma credível com informação transparente para os investidores conseguirem fazer os seus investimentos e procurarem boas oportunidades de negócio entre as micro e pequenas empresas”, começa por contar Paulo Lima.
“Queríamos uma montra credível que fizesse os investidores começarem a olhar para a compra de empresas como o melhor investimento. Quem compra uma empresa tem um ROI [Retorno sobre O Investimento] superior a qualquer outro tipo de investimento, embora acarrete outras responsabilidades, como fazer parte dessa estrutura ou encontrar alguém para executar, por exemplo”, detalha.
Neste marketplace composto por anúncios de empresas que estão à venda, os algoritmos desenvolvidos pela Matoaka apresentam logo aos investidores a informação dos últimos três anos de cada organização, nomeadamente balanços financeiros.
A partir daí, é gerada uma avaliação imediata da empresa. A tribo (nada indígena e bastante tecnológica) elabora um benchmark – através de duas bases de dados de transações internacionais – e compara o retorno que essa empresa está a gerar para os acionistas e cria um intervalo de valor.
O que é que fica a faltar? O valor, dentro desse intervalo, em que a empresa realmente se insere. Então, de forma também automática, a Matoaka faz uma avaliação – por um scorecard que abrange seis parâmetros da empresa – e reduz esse intervalo até encontrar aquele que considera ser o ideal para valor da empresa conforme as suas características.
“Ao fazermos tudo isto estamos a mostrar ao investidor a informação verdadeira da empresa em termos de resultados e também que, mesmo que ele não conheça determinada área de negócio, está a fazer uma transação alinhada com transações realizadas em indústrias e tamanho semelhantes”, afirma Paulo Lima ao JE.
Como não queremos mercados especulativos de venda de empresas, só aceitamos empresas que entrem na plataforma e que coloquem um preço dentro do intervalo da nossa avaliação. Pode ser limitativo? É verdade. Mas o nosso objetivo é transacionar negócios reais
Para quem quer pôr a empresa à venda, teoricamente, o processo é semelhante a se for vender um par de calças – e a ideia é mesmo essa. A Matoaka até aconselha os utilizadores que vão publicar anúncios a juntarem um pitch em vídeo.
As pessoas que querem, efetivamente, vender o negócio têm de dar a cara e deixar o discurso de «ponha-me à venda, mas por favor não diga que estou à venda, porque tenho medo que as pessoas deixem de aparecer»
“Em Portugal, a venda de micro e pequenas empresas está mal conotada. Se forem as maiores bate-se palmas e parece que são sempre boas notícias, porque cresceram e estão a ser transacionadas. Nas pequenas, tipicamente, há a ideia de que a transação ocorreu porque a empresa não estava assim tão bem”, lamenta o co-CEO da Matoaka.
Paulo Lima começou a carreira na Deloitte e depois esteve por trás da fundação de uma startup que se dedicava a ajudar marcas na expansão, onde trabalhou com a Fitness Hut ou a Prego Gourmet. Mais tarde, em 2015, lançou-se no ramo da restauração e por lá acabou por ficar, enquanto managing partner do grupo NovaCasta, que explora em Portugal insígnias como 100 Montaditos, Pomodoro e Red - We like it raw.
Para a Matoaka, onde trabalham mais cinco pessoas, os planos no curto-prazo também foram elaborados como se de um empratamento se tratasse: ter uma “tribo” de 15-25 empresas no Energize (atualmente, contam-se seis contínuas e 14 projetos), 40-60 anúncios de empresas no Transfer e 25-35 transações de M&A anuais.
“Não gostamos da palavra consultoria. Sabemos que é relevante, mas a forma como está conceptualizada hoje em dia acaba por funcionar só para médias e grandes empresas. Para quase 99% das empresas é impensável ligar a uma Big Four ou para uma BCG para temas do dia a dia. Temos de ser muito criativos na maneira como queremos monetizar”, diz Paulo Lima.
É aí que entra o programa Energize, cujo início implica uma experiência imersiva durante 48 horas, em que a Matoaka vai com os empresários para uma sala de hotel, vestem todos a camisola (tribo) e começam a trabalhar no diagnóstico à empresa e aos seus processos/operações.
Cinco ou seis dias depois, recebem um relatório com o ‘Estado da Arte’ da organização e as recomendações de iniciativas para os próximos anos. A partir daí, existem dois caminhos possíveis para os empresários: ou fazem essas alterações internamente, “sozinhos”, ou prosseguem o processo de transformação e tentativa de crescimento com a Matoaka.
“Apesar de falarmos muito de crescimento, já tivemos processos em que não é só crescimento. Basta resolver apenas questões do dia a dia, porque os empresários estão «debaixo de água» ou não têm o know-how necessário. Já ajudámos um cliente a decidir se seguia para PER ou insolvência”, exemplifica.