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Lei laboral: Portugal deve olhar para modelo flexisegurança dos escandinavos, diz BRP

Associação Business Roundtable Portugal (BRP) defende que Portugal deve alargar horizontes na reforma laboral que está a iniciar e procurar seguir os regimes de países como a Suécia e a Dinamarca, que nas últimas décadas adotaram um modelo que combina flexibilidade com segurança no trabalho, mantendo um Estado Social "robusto". Pedro Ginjeira Nascimento, secretário-geral da associação, critica a "rigidez" da legislação portuguesa que protege quem está no mercado de trabalho mas que, ao mesmo tempo, se esquece dos que querem entrar, jovens e desempregados.

Pedro Ginjeira Nascimento, secretário-geral da associação Business Roundtable Portugal (BRP), concorda que a legislação laboral portuguesa precisa de ser "urgentemente" alterada mas defende que o país alargue os seus horizontes e estude os regimes aplicados pela Suécia e pela Dinamarca, países que adotaram ao longo das últimas décadas um modelo de trabalho conhecido como flexisegurança - um regime que equilibra flexibilidade no trabalho com a segurança do trabalhador. Conhecidos por terem um Estado Social "robusto", estes países escandinavos devem ser encarados como "bons exemplos" que Portugal devia procurar seguir na reforma do trabalho que está agora a iniciar, acredita.

O responsável da BRP, em declarações ao Jornal Económico (JE), utiliza as estatísticas da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Económico (OCDE) para sustentar a sua visão, lembrando que entre os 38 países, Portugal é um dos quatro com a legislação laboral mais rígida. Logo, protege o trabalhador mas, ao mesmo tempo que o faz, "desprotege quem não tem trabalho", ou seja os jovens e aqueles que não estão no mercado de trabalho por se encontrarem desempregados.

Os escandinavos "descobriram que era preciso encontrar algum equilíbrio e migraram para o sistema flexisegurança" e os resultados, sustenta Pedro Ginjeira Nascimento, estão à vista, deixando Portugal distante destes países em indicadores como o Produto Interno Bruto (PIB). "Entre 2000 e 2024 o PIB português cresceu 28,6%. O PIB dinamarquês neste período cresceu 129,5%, cresceu 4,5 vezes mais do que o nosso", enquanto que "na Dinamarca, no mesmo período, cresceu 129%", compara.

Há ainda outros dados a provar que a Dinamarca pode ser um exemplo a seguir no regime laboral, na ótica do secretário-geral da associação Business Roundtable Portugal. Enquanto por cá 40% dos jovens têm contratos de trabalho a prazo; neste país escandinavo apenas 25% dos jovens têm essa relação contratual. A média da OCDE é 32%. Nos adultos, em Portugal, 11,9% dos contratos são a prazo; na Dinamarca apenas 5%.

Pedro Ginjeira sublinha que o mercado de trabalho português está "dividido" entre uma parte da população tem acesso a contratos de trabalho sem termo  e a outra parte "está presa a contratos a prazo que se vão perpetuando", um problema do qual a BRP "fala há anos". Na realidade, acrescenta, "temos três regimes, um super restritivo e seguro para o trabalhador, que é o da administração pública, e os outros dois regimes no privado".

"A Suécia e a Dinamarca eram assim como nós....na década de 80"

Sem querer, para já, analisar se a reforma proposta pelo Governo vai no sentido certo ou não, Pedro Ginjeira saúda que, pelo menos, o executivo esteja a manifestar a intenção de querer mudar a legislação, o que "anteriormente não acontecia".

Questionado concretamente sobre a proposta de aumentar o limite dos contratos a prazo de dois para três anos, o responsável defende que o problema não tem a ver com a duração máxima deste tipo de relação contratual, mas sim com "todas as restrições que existem ao funcionamento do mercado de trabalho" que colocam os trabalhadores em barricadas diferentes.

"O problema dos contratos a prazo que se perpetuam não é se são dois ou três anos. O problema é que temos um sistema que leva a que as pessoas que têm um contrato a prazo não passam para um sem termo. O sistema é tão rígido, impõe tantas obrigações, que as empresas não querem contratar. E os desempregados não têm acesso a esses contratos, o que cria uma série de limitações, dificuldades no acesso a crédito a habitação, por exemplo", assinala. "Depois andamos sempre a falar das dificuldades dos jovens no acesso a todo esse tipo de coisas, quando um dos problemas está na nossa legislação laboral", acrescenta ainda.

É por isso que, insiste, "temos que olhar e estudar os regimes flexisegurança" e revisitar o Código do Trabalho por forma a reduzir restrições no nosso sistema, "mantendo os elementos de segurança que sejam importantes num Estado Social, que funcione e que promova a flexibilidade e a vontade de as pessoas quererem mudar de um sítio para outro".

"Muito mais do que andarmos aqui apaixonadamente a discutir se os contratos a prazo devem ter dois anos ou três, o importante é que para o trabalhador e para o empregador, ter um contrato sem prazo não tenha a ver com restrições legais que levam a que tenha de haver uma escolha ou outra. Isso é que está a criar um mercado dual, com pessoas de um lado e pessoas do outro. Precisamos que o mercado seja líquido, que todas as pessoas tenham acesso a tudo", reforça.

Pedro Ginjeira Nascimento diz ainda que a atual legislação faz com que haja "pessoas infelizes no seu posto de trabalho" mas que não o deixam por terem "muitos anos de atividade e se um dia vierem a ser despedidos, têm uma grande indemnização" ou "porque ali já têm determinados direitos". "Se a nossa legislação não fosse assim, essas pessoas provavelmente teriam uma iniciativa maior de procurarem coisas diferentes para fazerem", afirma.

Em síntese, e voltando aos exemplos escandinavos, o responsável esclarece que não se trata de aplicar "reformas super liberais que são contra o Estado Social ou contra os direitos dos trabalhadores, pelo contrário". O secretário-geral da BRP termina dizendo que a Suécia e a Dinamarca "eram assim como nós somos... na década de 80, mas entretanto evoluíram, está na altura de nós evoluirmos também".

O regime laboral defendido por Ginjeira - flexisegurança - não é uma novidade no discurso político. Em 2008, o então ministro do Trabalho e Solidariedade Social, Vieira da Silva, defendia um modelo semelhante ao da Dinamarca,  mas se compreendido como "um processo de mudança e não como uma norma".

O governante socialista justificava na altura, numa conferência sobre o tema, que a legislação portuguesa era a "mais rígida dos estados membros da OCDE" e assinalava concordar que a chave flexibilidade + segurança, se bem aplicada, poderia criar uma situação "ganhadora" para ambas as partes.