Com o Plano de Recuperação e Resiliência (PRR) a meio, a Goldman Sachs fala numa implementação mais avançada no Sul da Europa, onde o programa deve ter um impacto mais profundo, mas muito longe da ambição inicial. Para corrigir esta perda de eficiência e acelerar a implementação, o banco norte-americano aconselha os países a recorrerem a créditos fiscais, sobretudo dada a aceleração do investimento nos EUA.
Numa nota de pesquisa publicada esta terça-feira, a Goldman Sachs destaca que apenas os países do Sul da Europa e a França alcançaram já mais de metade das metas e alvos mais relevantes, com o resto do bloco com atrasos substanciais. Em particular, Espanha e Itália destacam-se no ritmo de implementação, embora com diferenças merecedoras de serem exploradas.
Em ambos os casos, o ritmo de implementação das reformas abrandou significativamente em 2023 comparado com o ano anterior, o que o banco atribui a fatores estruturais e à passagem das reformas necessárias para desbloquear fundos à aplicação dos investimentos, uma fase mais trabalhosa e lenta do plano. Por outro lado, Itália, ao contrário de Espanha, decidiu alocar uma boa parte do plano a créditos fiscais, por oposição ao investimento público predominante nos restantes países do Sul, e com bons resultados no que respeita ao nível de gastos.
Nestes casos, o banco avança com um impulso no crescimento de 0,2 pontos percentuais (p.p.) para Itália e 0,7 p.p. para Espanha nos próximos três anos. Ainda assim, para 2024, o impacto no crescimento não deve ultrapassar 0,2 p.p., uma “contribuição bem próxima da ambição inicial do programa”.
Como tal, a Goldman estima que “melhorar créditos fiscais no investimento pode fechar cerca de um terço do diferencial entre o nosso cenário base e o de implementação total, em que a totalidade dos recursos do PRR é mobilizada no final do programa, em 2026”.
Acresce a isto que o plano pode ajudar a diminuir a diferença no crescimento do investimento europeu face ao norte-americano, que tem acelerado a um ritmo muito acima do verificado na moeda única. Comparando com 2019, ano anterior à chegada da Covid-19 à Europa, o investimento europeu estava, em 2023, 2% acima, enquanto nos EUA o salto foi de 10%.
Em termos anuais, o gap de investimento para os EUA é, em média, de 1,5%. Apesar de ter subido na categoria de investimentos não imobiliários, o indicador europeu em função do PIB mantém-se em linha com o registado antes da pandemia, tendo mesmo recuado no sector da construção, mais sensível a subidas nas taxas de juro.
O banco de investimento norte-americano estima assim um impacto cumulativo do PRR de cerca de 0,8 p.p. no crescimento do investimento da zona euro, embora insuficiente para cobrir a diferença para o ritmo norte-americano nesta componente do PIB.
Costa otimista
Os avisos da Goldman Sachs surgem no mesmo dia em que o primeiro-ministro demissionário, António Costa, visitou, em Santa Maria da Feira, vários consórcios que irão receber verbas do PRR. O ainda líder do Executivo mostrou-se confiante na implementação atempada do plano, bem como no seu impacto transformador da economia nacional.
"Tenho a certeza que não é por haver uma mudança de Governo ou na maioria que o PRR vai sofrer qualquer tipo de sobressalto", afirmou, lembrando o "compromisso de agenda" feito com a Aliança Democrática (AD) neste capítulo.
Questionado sobre possíveis projetos atrasados com a mudança de Governo, Costa lembrou a discussão em torno do novo aeroporto de Lisboa, mas reforçou que o novo Governo terá toda a informação necessária para tomar a decisão mais acertada.
Já no último dia de campanha socialista, a 8 de março, o primeiro-ministro em funções havia garantido que apenas o PS "está em boas condições" para executar o programa de investimentos, lembrando a desconfiança inicial da direita face ao impacto na economia real.
Recorde-se que o PRR destina a Portugal um envelope de 22,2 mil milhões de euros, um acréscimo em relação aos 16,6 mil milhões iniciais, que se repartem entre 57 reformas e 284 investimentos. Dos 47 marcos associados à terceira e quarta fases, o país não cumpriu três, tendo de o fazer no prazo alargado definido pela Comissão.
A estimativa para o impacto do programa na economia nacional oscila entre 3% e 3,5%, num cenário de alta produtividade, ou 2% a 2,5% num cenário de produtividade mais baixa, o que faria de Portugal o quinto país com um avanço mais robusto dado pelo PRR.