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Há três anos que não se renegociavam tantos créditos às empresas

A subida dos juros está a ter impacto no orçamento das famílias, mas não só. As empresas também estão a sentir o aumento de custos, tendo renegociado 485 milhões de euros apenas em janeiro. É o valor mais elevado desde dezembro de 2020.

As taxas de juro elevadas não deixaram apenas as famílias portuguesas em dificuldades financeiras, praticamente forçando-as a renegociar os empréstimos que lhes foram concedidos pela banca para evitarem situações de incumprimento. As empresas também estão a sentir o impacto da inversão da política monetária do Banco Central Europeu (BCE) para travar a escalada da inflação, dando os mesmos passos para tentar aliviar o “peso” do crédito. A renegociação entre os clientes empresariais alcançou máximos de três anos no início do ano.

O montante de novas operações de empréstimos concedidos às empresas cifrou-se em janeiro de 2024 em 1.915 milhões de euros, o que representou uma queda de 800 milhões de euros relativamente ao mês anterior, mostram os dados divulgados esta segunda-feira pelo Banco de Portugal sobre as taxas de juro e montantes de novos empréstimos e depósitos.

“Os montantes de novos empréstimos diminuíram relativamente ao mês anterior, ou seja, as empresas tendem a afastar-se de novos créditos diante das elevadas taxas de juro que comprometem a possibilidade de honrar os seus compromissos. Mas não só, também a incerteza geopolítica, a recessão alemã e as perspetivas de um fraco crescimento económico global inibem os empresários de tomar novos empréstimos”, afirma Paulo Rosa, economista sénior do Banco Carregosa, ao Jornal Económico (JE). 

A taxa de juro média das novas operações de empréstimos às empresas diminuiu 0,09 pontos percentuais, mas mantém-se elevada, nos 5,67%. 

As dificuldades provocadas pelos juros elevados estão visíveis na evolução da renegociação dos créditos concedidos pela banca aos seus clientes empresariais. Enquanto os novos contratos corresponderam a 75% do montante de novas operações de empréstimos às empresas, as renegociações dos créditos totalizaram 485 milhões de euros. 

Analisando os números do regulador, é o valor mais elevado desde dezembro de 2020, em plena pandemia de Covid-19, quando os juros estavam em níveis muito baixos. Nesse período, em resultado da crise sanitária, muitas empresas foram forçadas a renegociar os financiamentos contraídos, tendo o valor alcançado os 518 milhões de euros no final desse ano. “As taxas não descem e as empresas estão com dificuldades”, refere ao JE o economista João Duque, notando que estão a “perceber que não têm outra hipótese se não renegociar”.

Segundo Paulo Rosa, os “montantes renegociados ainda não são críticos, mantendo-se aquém dos valores quer do final de 2019 quer dos montantes verificados ao longo do confinamento global da primavera de 2020 ditado pela pandemia de Covid-19”. No entanto, frisa o economista sénior do Banco Carregosa, “representam uma crescente dificuldade das empresas em conseguirem honrar os seus compromissos, perante as elevadas taxas de juro e as incertezas geopolítica e económica”. Ao longo de 2023, foram renegociados perto de quatro mil milhões de euros, menos de metade das renegociações nos particulares.

Famílias renegoceiam 768 milhões de euros

As famílias portuguesas renegociaram mais de 8,8 mil milhões de euros de crédito à habitação ao longo do ano passado, um montante que supera em cinco vezes os 1,6 mil milhões de euros registados em 2022. Isto depois de o Governo ter aprovado uma medida, no final de 2022, que obriga as instituições financeiras a negociarem os créditos com os clientes em dificuldades.

Já em janeiro deste ano, as “renegociações de crédito aumentaram 95 milhões de euros em relação a dezembro de 2023, totalizando 768 milhões de euros em janeiro de 2024”, um valor que se mantém próximo daqueles que se têm registado nos últimos meses. O Banco de Portugal afirma que “esta evolução é quase totalmente explicada pelas renegociações de crédito à habitação, que, em janeiro, atingiram 716 milhões de euros”. 

Isto num período em que também se observa uma quebra na concessão de crédito, num cenário marcado por juros elevados e ainda sem uma perspetiva clara de quando é que as taxas vão começar a descer. As novas operações de empréstimos aos particulares totalizaram 2.555 milhões de euros em janeiro de 2024, menos 45 milhões do que em dezembro de 2023. Na habitação, a descida foi de 141 milhões de euros, com a taxa de juro média das novas operações de empréstimos para a compra de casa a situar-se nos 4,03%. 

Na última reunião do conselho de governadores, Christine Lagarde, presidente do BCE, disse ser “prematuro” falar sobre corte de juros e que serão os dados a definir o rumo da política monetária.