O confronto entre Israel e o Hezbollah, no sul do Líbano, assemelha-se, cada vez mais, à guerra que ali eclodiu em 2006 e os analistas têm cada vez menos dúvidas que a repetição desse cenário está para breve. O conflito militar de 12 julho de 2006 envolveu as Forças de Defesa de Israel (IFD), o braço armado do Hezbollah e o exército libanês. O Conselho de Segurança da ONU demorou um mês a observar os acontecimentos e só a 11 de agosto foi aprovada a Resolução 1701, que determinava, entre outros pontos, a cessação das hostilidades, a retirada das tropas israelitas do território libanês, o desarmamento do Hezbollah e o reforço das forças armadas libanesas por uma força armada internacional (UNIFIL). A resolução foi acatada por ambas as partes no que teve a ver com a retirada de Israel, mas o Hezbollah acabaria por ganhar ímpeto e o exército libanês nunca conseguiu a dimensão necessária para defender o país sem o auxílio do grupo xiita, auxiliado pelo Irão. O conflito durou 34 dias e resultou na morte de 1.200 pessoas no Líbano, a maioria civis, e 157 israelitas. No confronto atual, o número de mortes subiu esta segunda-feira aos 274, na sua maioria civis – entre eles, 21 crianças e 39 mulheres. Israel é especialista em invadir o Líbano e são já inúmeras as vezes que o fez. Para além de 2006, as invasões de 1978 e de 1984 foram das mais duras.
O confronto no Líbano desloca, segundo os analistas, o epicentro das movimentações das IFD da Faixa de Gaza para o sul do Líbano – algo que há semanas vem sendo evidenciado por muitos especialistas. Sami Nader, diretor do Instituto do Levante para Assuntos Estratégicos, diz, citado pela “Al Jezeera”, que o foco da guerra de Israel se afastou de Gaza, descrevendo a situação no Líbano como “uma guerra total". “Está claro que a arena número um desta guerra é o Líbano, já não é Gaza".
Em declaração conjunta, os ministros das Relações Exteriores do Egipto e do Líbano pediram a implementação da Resolução 1701, mas Israel deixou claro aquilo que procura: o ministro da Defesa, Yoav Gallant, anunciou que o exército israelita está a "expandir" os ataques contra as posições do Hezbollah libanês e que perseguirá o grupo xiita “em todo o Líbano” e não apenas na fronteira com Israel. A UNIFIL (Força de Manutenção da Paz das Nações Unidas no Líbano) expressou grande preocupação com a escalada da tensão na região e pediu às partes em conflito que tomem as medidas necessárias para proteger os civis. “Todas as partes são chamadas a priorizar a proteção de vidas civis e garantir que elas não sejam colocadas em risco", lembrou a UNIFIL, que também pediu uma solução diplomática urgente para acabar com o conflito. A coordenadora da ONU no Líbano, Jeanine Plasschaert, anunciou que a segurança dos civis e a estabilidade da região estão em risco e enfatizou que uma solução militar não oferece nenhuma hipótese de resolução do conflito.
Com Teerão a avisar que não tolerará a tentativa de Israel fazer desaparecer o Hezbollah, o auxílio ao grupo xiita pode chegar também do Iraque. Segundo a imprensa iraniana, líderes de grupos armados iraquianos (igualmente xiitas) fizeram saber da sua prontidão para se envolverem na guerra, se Israel continuar com os ataques ao Líbano. Essa prontidão já está, aliás, a surtir efeito: Um drone lançado contra Israel, por uma milícia apoiada pelo Irão no Iraque, nas primeiras horas da manhã de segunda-feira, foi abatido por caças israelitas, informaram as IDF. O drone teve como origem o Iraque e levada a direção de Israel, sobrevoando a Síria. O grupo iraquiano Resistência Islâmica assumiu a responsabilidade do disparo.
O Corpo da Guarda Revolucionária Islâmica (IRGC, um agrupamento paramilitar controlado pelo líder supremo do Irão) ordenou que todos os seus membros deixem de usar qualquer meio de comunicação, depois de milhares de pagers e walkie-talkies terem explodido na semana passada.
Este domingo, o ministro das Relações Exteriores do Egipto, Badr Abdelatty, que se encontra em Nova Iorque para tomar parte da 79ª Assembleia-Geral da ONU, disse que os ataques ao Líbano colocam em causa as negociações de cessar-fogo – e que e o risco de uma guerra regional total é cada vez mais evidente. “Há uma grande preocupação com a possibilidade de uma escalada na região, levando a uma guerra regional total", disse na sede da ONU. “Mas o Egipto, juntamente com o Qatar e os Estados Unidos, tem total determinação e compromisso de continuar" os esforços para mediar uma nova trégua – que nunca foi conseguida. “Todos os componentes do acordo estão prontos", disse Abdelatty. "O problema é a falta de vontade política do lado israelita", afirmou, apesar de os Estados Unidos colocarem a culpa diretamente no Hamas, recordou.