A nebulosa em torno do Grupo Wagner mantém-se densa, mas algumas decisões do Kremlin parecem ir no sentido de emprestar a toda encenação algum grau de normalização. Assim se compreende que o governo de Vladimir Putin tenha decidido que o grupo deve entregar ao exército o material de guerra pesado que tinha em mãos e que as chefias devem ficar acantonadas na Bielorrússia – aparentemente em instalações militares cedidas pelo governo ‘amigo’ de Aleksandr Lukashenko.
Mas tudo é feito para encobrir as movimentações. A meio do dia de ontem, o Ministério da Defesa russo disse não ter a certeza do paradeiro do líder do Grupo Wagner, Yevgeny Prigozhin. Foi precisa a intervenção do governo bielorrusso para haver notícia desse paradeiro: o seu líder já se encontrava em território do país que lhe concedeu asilo.
Por explicar está, entre muitas outras coisas, o que sucederá com os elementos do grupo Wagner que se encontram envolvidos em frentes de combate que não a Ucrânia – nomeadamente na Síria, onde desempenham um papel que o regime de Bashar al-Assad considera essencial. Segundo uma nota do Ministério dos Negócios Estrangeiros russo, esses militares vão continuar no ativo – continuando, salvo melhor explicação, a soldo do governo de Vladimir Putin.
Ou seja, aparentemente dá-se uma situação em que uma parte dos combatentes e o comando do grupo está acantonada na Bielorrússia (sendo incerto que tenham liberdade de mobilidade) e outra parte continua a operar em cenários de guerra, como se nada se tivesse passado.
Outra dúvida que sobrevive entre os analistas é a de perceber-se o que quererá a Bielorrússia fazer com os seus novos ‘hóspedes’. Lukashenko disse que não há planos para abrir nenhum centro de recrutamento do Grupo Wagner no país. Prigozhin estará portanto exilado numa base militar desativada na Bielorrússia? Ou poderá voltar a vestir o fato de homem de negócios e partir à procura de novos clientes nos seus serviços – que em alguns lugares da Ucrânia mostraram ser capazes de ganhar um selo de qualidade?
Quem não gostou da mudança foi o presidente da Polónia, Andrej Duda, que disse que a transferência do Grupo Wagner para a Bielorrússia envia um sinal negativo ao seu país. “Vemos o que está a acontecer: a realocação de forças russas sob a forma do Grupo Wagner na Bielorrússia, e o chefe do Grupo Wagner lá instalado.
Tudo isso são sinais muito negativos para nós que queremos apoiar fortemente os nossos aliados” ucranianos, disse antes de uma reunião de líderes da NATO na Holanda. Ou seja, o presidente da Polónia coloca a hipótese de, a partir das instalações militares bielorrussas – e apesar do que disse Lukashenko – estar ali em formação um novo exército que posteriormente será encaminhado (sobre isso não haveria quaisquer dúvidas) para a Ucrânia.
Entretanto, a Rússia iniciou exercícios táticos com aviões de guerra sobre o Mar Báltico com o objetivo de testar a prontidão para realizar combates e outras operações especiais, disse o Ministério da Defesa do país. “O principal objetivo do exercício é testar a prontidão da tripulação de voo para realizar tarefas de combate", disse o ministério.
Para os analistas, esta é mais uma forma de o Kremlin dar a entender a Kiev e aos países que apoiam a Ucrânia que acreditar que a Rússia viu o seu poder militar diminuído com as performances do Grupo Wagner é um erro que não vale a pena ser cometido. Por estes dias, o Mar Báltico parece ser o sítio certo para os exercícios dos pilotos de caça russos: é o mar que banha a Lituânia, país onde se realizará a próxima cimeira da NATO e a Suécia, candidato à entrada na aliança, mas ainda sem conseguir a necessária confirmação da Turquia e da Hungria.