A Fundação Francisco Manuel dos Santos (FFMS) divulgou o estudo “O impacto do IRC na economia portuguesa”, coordenado por Pedro Brinca, investigador da Nova SBE. Um estudo divulgado um mês depois de ter assumido funções o governo da coligação AD, que incluiu no seu programa de governo uma redução gradual (dois pontos por ano) da taxa geral do IRC para 15% (dos atuais 21%).
A investigação conclui, entre outros aspetos, que uma redução da taxa de IRC resultaria num crescimento do PIB no curto e no longo prazo, no crescimento do consumo, e no crescimento dos salários dos trabalhadores.
O estudo coordenado pelo economista Pedro Brinca simula uma redução de 7,5 pontos percentuais (p.p.) na taxa de IRC e conclui que levaria a um aumento do PIB de 1,44% no curto prazo (após dois anos) e 1,40% no longo prazo (após dez anos).
Além disso, os resultados indicam uma melhoria dos salários reais, que aumentam 1,8% no longo prazo de acordo com a simulação realizada.
“Este estudo procurou compreender de que forma as sucessivas alterações ao Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Coletivas (IRC) verificadas ao longo das últimas décadas, afetam as principais variáveis macroeconómicas, tais como o PIB e as decisões de consumo e de investimento dos agentes económicos”, revela a FFMS.
“Avaliaram-se os impactos de uma redução da taxa de IRC, de alterações na progressividade do IRC e da instabilidade legislativa relativamente a este imposto”, revela a Fundação que sublinha que este estudo “contribui para a discussão pública atual sobre a importância da política fiscal enquanto ferramenta de incentivo à produtividade e crescimento da economia portuguesa”.
A Fundação explica que o estudo utilizou um modelo macroeconómico de equilíbrio geral, trabalhado pela equipa de investigadores e calibrado para a economia portuguesa, para avaliar qual o impacto esperado na economia de uma redução da taxa de IRC; de alterações na progressividade do IRC; e da instabilidade legislativa relativa a este imposto. “Variantes deste quadro conceptual são frequentemente usadas pelas principais instâncias europeias, como a Comissão Europeia e o Banco Central Europeu, e pelos governos nacionais”, detalha a FFMS.
Os autores reforçam, no entanto, que a metodologia utilizada tem algumas limitações. Por isso, alertam para “a relevância de se aprofundar o estudo desta temática, analisando, por exemplo, de que forma as alterações de taxa induzem um reajustamento da estrutura de capital escolhida pelas empresas, e que impacto esse reajustamento teria na amplificação dos efeitos da reforma fiscal proposta na atividade económica”.
Além disso, e apesar de o estudo considerar empresas com diferentes níveis de lucro, os autores alertam para o facto de existirem diferenças que seria importante estudar, por exemplo, ao nível sectorial.
“Esta investigação procurou captar de forma isolada o impacto do IRC na competitividade fiscal da economia portuguesa ao longo dos anos, tendo em conta que Portugal não tem acompanhado, pelo menos ao mesmo ritmo, a tendência histórica da maioria dos países da Zona Euro e da OCDE de redução da carga fiscal das empresas”, refere a Fundação.
A estudo revela que simulando uma redução do IRC na Zona Euro e no resto mundo, não acompanhada por Portugal, os resultados apontam para uma diminuição do consumo agregado e do investimento privado, que impulsionam uma resposta negativa do PIB português.
Quadro fiscal tem sofrido alterações desde 1976
O quadro fiscal português criado no contexto da Constituição de 1976 tem sofrido inúmeras alterações ao longo dos anos, lembra a Fundação. Uma dessas alterações foi ter assumido a política fiscal como um instrumento para induzir a competitividade da economia e promover o investimento.
“Neste âmbito, importa compreender de que forma a evolução histórica da tributação do rendimento das empresas e o contexto internacional subjacente têm impactado a atividade económica em Portugal”, sublinha o estudo.
Em termos históricos o Código do IRC sofreu mais de 1.350 alterações desde a sua introdução, em 1989.
A Fundação diz que para analisar o efeito destas alterações legislativas sucessivas, simulou-se o impacto na economia de uma reforma do IRC em “V” (ou seja, uma reforma que é revertida num curto espaço de tempo), concluindo que este tipo de reforma acaba por diminuir ligeiramente o PIB no longo prazo e, consideravelmente, o consumo no longo prazo (0,03% e 1,01%, respetivamente).
“Neste caso, observa-se que o possível ganho resultante de uma redução do IRC é eliminado posteriormente pela reversão dessa medida, criando-se perdas permanentes na atividade económica do país, que se devem, sobretudo, aos custos de ajustamento das decisões de investimento das empresas”, acrescenta o estudo.
O estudo centrou-se na diminuição da progressividade do IRC, simulada através da redução da taxa média nos escalões superiores, indicando que esta medida permite um aumento do PIB.
“O exercício utilizado neste caso simula uma redução da taxa nominal de 10,5 p.p. para o escalão superior; de 7,5 p.p. para o 3º escalão; e de 6,5 pontos para o 2º escalão; mantendo inalterada a taxa nominal do escalão inferior”, revela a Fundação.
Aqui os resultados apontam para um aumento do PIB de 0,7% no curto prazo e de 0,2% no longo prazo. Ou seja, o estudo aponta para impactos positivos de uma diminuição da progressividade do imposto.
“Quer na simulação da descida generalizada da taxa de IRC, quer na simulação da diminuição da progressividade deste imposto, estima-se que os salários dos trabalhadores aumentem”, esta é uma das conclusões da equipa de investigadores da Nova SBE liderada pelo economista Pedro Brinca,
Este aumento dos salários fruto da descida da taxa de IRC para as empresas e da diminuição da progressividade deste imposto “é generalizado a todas as famílias, apesar de ser expectável que os trabalhadores com mais poder negocial beneficiem de um maior aumento”.
Como evoluiu o IRC?
Importa destacar que em 1989 a taxa de IRC era de 36,5% e que em 2024 está em 21%.
“Portugal inverteu, nos últimos anos, de forma consistente, a tendência de descida das taxas de IRC que se vinha a verificar globalmente desde o final do século XX”, destaca a análise da Fundação. Essa inversão, explica, “deu-se no seguimento da crise financeira mundial, a partir da qual o país se distanciou bastante das taxas praticadas noutros países europeus.
Em 2010, como medida excecional para responder à crise económica e financeira, foi introduzida a Derrama Estadual, uma taxa adicional que incide sobre a parte do lucro das empresas que exceda um determinado valor de referência.
Esta taxa passou a estar integrada em permanência no Código do IRC, e verificou-se também um agravamento da progressividade do imposto, por via da introdução de novos escalões e de taxas agravadas na Derrama Estadual.
Que conclusões deixa o estudo sobre o impacto do IRC na economia?
A partir destas conclusões, e de forma a reforçar o papel do IRC enquanto instrumento de estímulo ao crescimento económico, a equipa de investigadores lista um conjunto de vias pelas quais o decisor político poderia optar para reduzir este imposto.
Uma delas é a redução da taxa nominal de IRC; o regresso à estrutura originária puramente proporcional deste imposto, abolindo-se a Derrama Estadual. Noutro cenário, a equipa liderada por Pedro Brinca aponta que poderia ser ponderada a eliminação da Derrama Municipal, “por força da complexidade que introduz e pela inexistência de pressupostos jurídicos ou económicos que a justifiquem”.
A Derrama Municipal é um adicionamento ao IRC que incide sobre o lucro tributável sujeito e não isento desse imposto, em função da proporção do rendimento gerado na área geográfica de cada município.
O estudo da Fundação Francisco Manuel dos Santos também sugere que poderiam ser introduzidas regras que disciplinem a produção de leis fiscais.
Os autores do estudo ressalvam que o modelo utilizado procura apreender o quadro conceptual de equilíbrio orçamental exigido pela União Europeia. “Nestes termos, o mesmo determina que a diminuição da receita fiscal por via da redução do IRC é financiada através de um de vários instrumentos de compensação orçamental, designadamente impostos sobre o consumo, impostos sobre o trabalho, despesa pública e transferências sociais”.
Pelo que, o impacto desta compensação sobre as decisões dos agentes económicos e consequentes dinâmicas agregadas da economia é considerado pelo autores “reduzido, no curto e no longo prazo, em todas as experiências realizadas”.
A opção por um dos mecanismos de compensação identificados deverá revestir natureza política, pelo que o estudo “não expressa uma preferência sobre qualquer um deles”.