O sector dos componentes automóveis e o cluster que se formou em seu torno é há muito um dos mais importantes segmentos da economia – nomeadamente em termos de captação de investimento direto estrangeiro, de exportações, mas também de produção de postos de trabalho diferenciados. O novo presidente da agência que lidera (também) o investimento estrangeiro, Filipe Santos Costa, que tomou posse há uma semana, disse, em entrevista ao JE, que uma das apostas mais fortes do organismo é a possibilidade de Portugal passar a produzir um veículo elétrico. E não necessariamente com o recurso às marcas que já se encontram em território nacional.
Até porque, recorda o novo líder da agência, as empresas oriundas dos Estados Unidos da América estão à frente do investimento direto estrangeiro captado por Portugal. Só em 2022, foi daquele lado do oceano Atlântico que vieram 19% de todo o IDE acantonado em Portugal.
Como avalia a captação de investimento direto estrangeiro (IDE)?
Estamos com uma grande dinâmica de atração de IDE, com particular destaque para os Estados Unidos.
Um novo mercado com grande potencial.
Sim, é verdade. Em 2022, os Estados Unidos foram o principal emissor de IDE para Portugal em termos de número de projetos: 19% do total, por país de origem dos investidores. A seguir surge um conjunto de países com 15% – o Reino Unido, a Suíça com 15%, o conjunto dos quatro países nórdicos com 15% e depois a Alemanha com 13%.
Em sete países de que me fala, quatro são exteriores à União Europeia. Como explica isso?
Portugal é um bom sítio para países terceiros investirem na União Europeia. É um país seguro, com boas infraestruturas de comunicações e de utilidades, é um país que desde cedo apostou na transição energética e na transformação digital, é um país com uma população cada vez mais capacitada com destaque para o talento e a proficiência de inglês e é um país que consegue já ter – fruto do investimento interno das empresas portuguesas – uma série de clusters que fazem com que a seguir surjam IDE nos sectores em que nós próprios apostámos e que o país promoveu.
Dos investimentos que a AICEP contratou, em termos de incentivos (financeiros e fiscais) com os Estados Unidos da América, 49% desse investimento (de 2015 a 2021) foram referentes à indústria automóvel e dos componentes para veículos.
O que é que se segue?
Desde logo há uma aposta que tem sido várias vezes expressa pelo ministro da Economia de termos em Portugal a cadeia dos veículos elétricos, da mobilidade elétrica. O investimento da BorgWarner vem muito ao encontro desse objetivo nacional, uma vez que, ao investir 90 milhões de euros, vem triplicar o investimento que já tinha consolidado em Viana do Castelo.
Em 2014, em 2016 e em 2018, em três investimentos distintos – um de 23 milhões de euros, outro de 12, outro de nove milhões, investiu um total de 45 milhões de euros e agora de uma vez investe mais 90 milhões. É um investimento inequivocamente inscrito na área da mobilidade elétrica: trata-se de componentes para motores elétricos.
Inscreve-se nas áreas prioritárias.
É uma das prioridades, vamos continuar a ter investimentos e toda a cadeia de produção da mobilidade elétrica. Com destaque, naturalmente, para as unidades de componentes e, esperemos nós, também de veículos acabados.
Há essa possibilidade real?
Temos essa possibilidade. Nas unidades já existentes em Portugal e que façam essa transição, seja em novas unidades que se venham a instalar em Portugal. Estamos a trabalhar em alguns leads de investimento de veículos acabados. Outra área que tem ganho muita proeminência no investimento norte-americano é a área dos centros de competência. Com uma crescente qualificação desses centros de competência e uma evolução do seu grau de complexidade para novas áreas que interessam muito à economia nacional.
Como sejam a área financeira ou a da investigação e desenvolvimento. Uma terceira área é habilitadora desta segunda, que é a das telecomunicações – também com grandes investimento oriundos dos Estados Unidos – tecnologias de informação e comunicação, nomeadamente cabos submarinos (comunicações, processamento e armazenamento de dados.
O ano de 2022 fechou com uma média mensal de 12 mil milhões de euros de exportações. É um ritmo que se mantém este ano?
Acho que vamos conseguir manter esse ritmo. A AICEP trabalha não só no apoio à promoção das exportações – com as diferentes associações setoriais, com associações de âmbito nacional ou regional, empresas. Apoiamos a internacionalização das empresas, promovemos as exportações nacionais e trabalhamos também muito afincadamente na atração e fixação de investimento produtivo – seja investimento nacional, seja estrangeiro. Os grandes projetos de investimento passam pela AICEP.
Queremos fixar mais investimento produtivo, gerador de riqueza, de bens transacionáveis, apreciador da qualificação e dos salários dos portugueses. É a melhor maneira de promover as exportações: é aumentar o investimento produtivo.
Portanto, o primeiro foco da agência é a atração de investimento produtivo, nacional e estrangeiro. Sem descurar, naturalmente, o papel da produção nas exportações. O primeiro passo para produzir exportações é aumentar o investimento produtivo.
Nesse quadro, a sua prestação à frente da AICEP será marcada pela continuidade? Preferiria produzir uma rutura?
Nenhuma rutura, absoluta continuidade. O desafio é continuar o legado deixado por Luís Castro Henriques, Pedro Reis, Miguel Frasquilho, Basílio Horta.