A investidura do líder do Partido Popular espanhol, Alberto Núñes Feijóo, foi reprovada – sem qualquer surpresa – pelo parlamento saído das eleições de 23 de julho, por 178 votos contra e apenas 172 a favor. O líder do Junts per Catalunya – que nas últimas eleições se tornou apenas no terceiro partido na região onde atua – foi quem decidiu tudo. E Feijóo não se coibiu de o apresentar como alguém sem estatura política, uma vez que se ‘ofereceu’ tanto aos socialistas de Pedro Sánchez como ao próprio PP.
Mas, para o analista Francisco Seixas da Costa, talvez a estatura política de Puigdemont seja diferente quando observada da Catalunha. “Para ele, tanto o PP como o PSOE são ‘a’ Espanha” ou, dito de outra forma: é-lhe indiferente quem é que ‘na’ Espanha é o seu interlocutor, sendo certo que a sua preocupação é serviu a causa independentista catalã e não os socialistas espanhóis ou os conservadores igualmente espanhóis. Desse ponto de vista, Puigdemont fez o que devia ter feito, por muito que Madrid se possa queixar de maleabilidade dorsal a mais.
E escolheu o PSOE porque lhe dá aquilo que Puigdemont quer – e que Feijóo lhe recusou: livrar-se do ‘procés’ que lhe impede a entrada em Espanha e que o transforma, dependendo dos pontos de vista, num fator dos deveres constitucionais ou num possível preso político.
Mas, como o líder popular também deixou claro, o sucesso de Puigdemont junto dos socialistas pode vir a ser o seu tormento a prazo, dependendo da extensão das concessões que Sánchez terá inevitavelmente que lhe fazer. Para já, segundo os jornais, há a questão da lei da Amnistia – mas há também uma forma de promover um referendo à independência que não seja mero exercício de guerrilha política.
Neste particular, as teses avolumam-se. A primeira é que um referendo sobre esta matéria é inconstitucional, ponto. Para ser constitucional, há que mudar a Constituição – e com certeza Pedro Sánchez não estará disponível para ir tão longe. Mas há uma segunda tese: alguns constitucionalistas consideram que o atual texto fundamental permite uma aproximação séria a um referendo vinculativo. Mero exercício ficcional? Aparentemente sim.
No meio da refrega política, sobra ainda a figura de Filipe VI – a quem aparentemente todo este poder independentista desagrada. Os Bourbons estão muito familiarizados com a sucessão de secessões que avultam na história de Espanha - mas o atual rei tem legítimos pruridos (como tiveram os seus sucessores) em emprestar o seu nome a mais uma partição do território.
É neste quadro que Seixas da Costa considera que “ainda há o risco de o rei optar por marcar novas eleições”, o que seria uma derrota para Sánchez. O motivo do rei? “Obrigar o PSOE a explicar aos espanhóis até que ponto está disponível a ir com os independentistas”. Seja como for, os espanhóis não podem queixar-se de terem sido apanhados de surpresa: a verdade é que, desde que chegou ao poder em 2018, o líder socialista teve sempre de se apoiar no independentismo catalão e/ou basco para conseguir investiduras, para ver orçamentos de Estado aprovados ou para fazer passar um sem número de propostas. Nada de novo nesta frente, portanto.
Seja como for, e como diz Francisco Seixas da Costa, a “Espanha é neste momento um país muito dividido”, e com os nervos (políticos) à flor da pele. Nos próximos tempos nada desta tensão será reduzida, enquanto Pedro Sánchez espera ser convocado por Filipe VI para apresentar a sua própria candidatura à presidência do governo. Se isso suceder, o resultado já se sabe: 178 votos a favor e 172 contra.