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“Era melhor amortizar dívida e só depois baixar impostos, a começar pelas empresas”

O ex-secretário de Estado dos Assuntos Fiscais e sócio fundador do escritório RFF Advogados, Rogério Fernandes Ferreira, foi um dos oradores na conferência sobre o Orçamento do Estado para 2024, que o Jornal Económico e a EY promoveram na terça-feira (ver cobertura nesta edição). O fiscalista faz um balanço agridoce da proposta orçamental.

Este é o Orçamento de que o país precisa neste momento?
Do ponto de vista das empresas de rating e das instituições europeias e internacionais ficámos bem na fotografia, o que é importante por razões várias. Tem dívida pública abaixo dos 100% do PIB, melhor que noutros países europeus, como a França, a Itália, a Bélgica, ou a Grécia, tem excedente orçamental pela segunda vez, tem desemprego baixo, tem ainda algum crescimento na economia e tem investimento público maior que no ano passado, alegadamente sem cativações e uma inflação a desacelerar. Do ponto de vista político e nacional, é bem simpático desagravar o IRS nos primeiros cinco escalões. Mas a foto da dívida é à custa da inflação e o excedente orçamental à custa dos impostos indiretos, sobre o consumo, e que mais do que compensam a receita de IRS que diminui em apenas 0,1%. Num momento de desaceleração ainda da inflação e do aumento da dívida e, principalmente, dos juros, era prudente aproveitar o excedente para a amortização em vez de diminuir o IRS. Gostava que os meus filhos pagassem menos impostos no futuro e perdeu-se aqui mais uma oportunidade, tanto mais quando estamos ainda em situação inflacionária.
 
A receita fiscal aumentae a despesa também, o que pensa disso?
É um fado, a primeira aumenta por causa da segunda. Como dizia o professor Teixeira Ribeiro, nas finanças públicas são as despesas que determinam as receitas, o contrário é só para as finanças privadas. E os impostos aumentam pelo descontrolo da dívida, que gera despesas futuras, e das despesas correntes, que são bem menos virtuosas do que as de investimento ou de capital.
 
Era possível - e desejável - ir mais longe na redução do IRS, ou o Governo faz bem em manter um excedente desta dimensão, dado o contexto macroeconómico internacional?
Não era possível, política e socialmente, quando temos todos os partidos da oposição a exigir a baixa do IRS, ou a propor o aumento das pensões e dos salários na função pública, além dos sindicatos. Mas não era desejável, neste momento, diminuir o IRS, como se não houvesse dívida, nem inflação, ou amanhã.
 
A redução da dívida pode ser considerada o aspeto mais positivo deste Orçamento?
A dívida aumentou em termos absolutos e os juros também sobem, o que diminui é a percentagem da dívida em função do PIB, por causa da inflação.

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