Se representar a seleção é o ponto mais alto da carreira de um jogador e, na perspectiva do clube, um tremendo fator de valorização destes ativos, o "reverso da medalha" pode ser bem mais prejudicial: tanto para o futebolista como para o emblema com quem tem contrato. É aqui que entra a figura do "vírus FIFA": quando um futebolista de topo ou que atua por uma grande equipa europeia voltavam dos jogos da seleção com lesões, muitas vezes difíceis de debelar.
Há quem defenda que é redutor apelidar este "vírus" de FIFA, uma vez que tanto o organismo que rege o futebol mundial como a UEFA, que supervisiona o "desporto-rei" no continente que mais competições organiza, mostram uma tendência para, cada vez mais, transformar os modelos competitivos em formatos em que se disputem mais jogos e assim, mais receitas publicitárias.
Na última paragem das Ligas para a disputa de jogos da seleção (entre a qualificação para o Euro2024, passando pelas fases de apuramento sul-americano e africano para o Mundial 2026), vinte futebolistas que atuam em grandes equipas acabaram por lesionar, uns com lesões de menor gravidade e outros com quadros clínicos bem mais complicados e associados a tempos de paragem
Deste universo e usando como exemplo apenas três jogadores, é possível ter a noção do fator de preocupação que ter um futebolista nas seleções pode constituir (e que pode ser bem mais compensador que esse atleta nem sequer seja convocado para representar o seu país). O norueguês Erling Haaland, considerado o melhor ponta-de-lança da atualidade, lesionou-se ao serviço da sua seleção, apesar do quadro clínico não parecer preocupante (jogou e marcou pelo clube no passado fim-de-semana). O site "Transfermarkt", que avalia o valor de mercado dos futebolistas, coloca o goleador do Manchester City com uma avaliação de 180 milhões de euros e o site "Salary Sport" reporta que Haaland aufere 20,5 milhões de euros por ano.
Mais grave é o caso do médio Pablo Gavi, um dos jovens mais promissores do FC Barcelona e da seleção de Espanha. Avaliado em 90 milhões de euros e com um ordenado anual de 7,4 milhões de euros, Gavi encontrou o pesadelo na última paragem da UEFA: rotura total dos ligamentos cruzados do joelho direito associada a uma lesão no menisco lateral. O resultado é assustador: oito meses de paragem, pelo menos. Também Vinicius Jr., extremo do Real Madrid que vale 150 milhões e ganha mais de 20 milhões por ano, regressou lesionado do último compromisso pelo Brasil e deve mesmo parar até ao final do ano.
FIFA paga até 7,5 milhões
De forma a minimizar os prejuízos, o organismo que gere o futebol mundial implementou no início deste ano um Programa de Proteção aos Clubes que vai estar em vigor até 2026 e que prevê que os clubes sejam compensados caso os futebolistas se lesionem ao serviço das seleções e fiquem "fora de jogo" por um período longo.
Desde que um jogador fique fora por mais de 28 dias consecutivas, a compensação da FIFA vai até ao máximo de um ano de compensação. O que se sabe é que a FIFA alocou 80 milhões de euros a este programa e a compensação máxima que este organismo confere a um clube que se veja privado do seu ativo é de 7,5 milhões de euros (20 mil euros por dia).
"Deve haver uma reflexão"
Perante o atual cenário e com os jogadores de primeira linha a terem pela frente mais de 70 partidas (entre competições internas e provas internacionais), é necessário que exista uma reflexão por parte da FIFA e da UEFA. "Deve haver uma reflexão sobretudo no que diz respeito aos jogadores que jogam as competições europeias e que lutam por títulos nestas competições. Estamos a falar de muitos jogadores que facilmente farão 70 jogos esta temporada", realça Jorge Faria de Sousa, comentador do programa da plataforma multimédia JE TV "Jogo Económico, em declarações ao JE.
Olhando para a Liga portuguesa e para os clubes nacionais (que pela diferença de orçamentos para os emblemas dos 'Big5', têm mais dificuldade em substituir os melhores futebolistas), o comentador do "Jogo Económico" realça que "do lado da Liga portuguesa, temos os casos de Gonçalo Inácio, António Silva e João Neves, entre outros. Não esquecer também que vai haver Taça das Nações Africanas em janeiro e fevereiro do próximo ano e vai haver Taça Asiática. Quando estiver a decorrer o Europeu também haverá Copa América", recorda.
"A própria FIFA e os organismos de futebol devem mesmo fazer uma reflexão relativamente à densidade competitiva que é colocada aos jogadores, porque assim é normal que os jogadores sofram lesões. Esta é uma altura em que os jogadores não estão no pico de forma mas estão numa rota ascendente do seu momento", destaca. "Olhando para esta densidade competitiva, com o Europeu que terá o maior número de seleções de sempre, FIFA e UEFA devem refletir, até porque para o ano vamos ter uma Liga dos Campeões com mais jogos. Tudo englobado vai haver uma enorme sobrecarga", conclui o comentador.