A Chief Operations Officer do Intrum Group, a casa-mãe da Intrum Portugal, esteve em Lisboa. No meio das reuniões de trabalho com a equipa portuguesa, Annette Kumlien deu uma entrevista ao Jornal Económico (JE), onde revelou que a forma como a indústria está a abordar a Inteligência Artificial (IA), o servicing de crédito e como uma das áreas core da Intrum será muito mais digitalizado do que é hoje. Ou seja, os recursos de IA serão muito mais usados.
Não é o futuro, é o agora. A própria Intrum está a usar a IA para descobrir padrões de comportamento entre os seus clientes e a usar essa informação para lhes proporcionar um serviço mais adaptado, limitando as chamadas telefónicas e evitando – com isso – mais incumprimento. Um serviço que poderá pôr a Intrum, cada vez mais, como parceira privilegiada dos bancos.
O que está a Intrum a fazer com IA na área da recuperação de créditos? Como é que isto se tornou realidade?
Eu não venho do sector dos serviços financeiros, não é esse o meu background. Venho de indústrias totalmente diferentes: desde o fabrico de aço até aos cuidados de saúde. E você pode ver bastante nessas áreas… Quero dizer, a digitalização tem vindo a acontecer há muito tempo e nessas indústrias pode ver como realmente a digitalização os ajudou a tornarem-se mais eficientes e a oferecer melhor qualidade, mais apoio. Sou da Suécia e sempre trabalhei com multinacionais suecas, empresas conhecidas dos suecos como a Sandvik, na área siderúrgica do aço.
A Suécia é enorme na indústria do aço.
Isso. Mas você pode ver como esse tipo de indústria tem adotado novas técnicas. E quando a digitalização chegou, foram dos primeiros a adotar. E então, em 2007, entrei na sector dos cuidados de saúde. E essa área dos cuidados de saúde não estava assim tão digitalizada. Mas as pessoas começaram a compreender que, talvez, com a ajuda do tipo de digitalização que utiliza IA, esta seria capaz de prestar cuidados cada vez melhores aos pacientes e apoiar verdadeiramente os médicos para darem mesmo melhores diagnósticos [de saúde].
Mas de que maneira, compilando dados e assim?
Sim, olhando para dados estatísticos sobre o desempenho do paciente, os resultados do paciente. E encontrar, dentre dessas estatísticas, padrões que possam sugerir ideias sobre como tratar melhor o paciente. Então foi assim: eu e algumas outras pessoas fizemos muito trabalho de digitalização nesse sector. Juntei-me à Intrum há um ano, pelo menos oficialmente. E a digitalização no sector financeiro já vem acontecendo desde há algum tempo, mas o da Intrum está, de certa forma, bastante atrasado. No entanto, houve um programa, que foi criado há alguns anos, e que começou a mexer connosco no ano passado. E se olhar para ele é o mesmo tipo de ideias que, com a ajuda da tecnologia, você poderia realmente atender melhor, mais facilmente, o cliente. Isto de forma a obter um resultado final melhor, ajudá-lo mais rapidamente no seu processo de se tornar financeiramente saudável. E também certificando-nos de que ajudamos os clientes a atenderem melhor às suas necessidades.
Como é que passou disso para a recuperação de créditos?
Então, o que acontece é que, se vir bem, [a recuperação de créditos] é um negócio que exige muitos telefonemas. Ligar para os clientes e trabalhar muito com eles para que sigam os seus planos de pagamento, e depois receber os pagamentos. Em grande parte desse processo, se vir bem como as pessoas estão a evoluir, pode-se usar dados. Em muitas vezes também, se for um tipo de pagamento mais fácil que o cliente precisa fazer, talvez seja mais fácil apenas ter um portal de autoatendimento [site ou app] pelo qual eles podem navegar. Então, essas são as ideias nas quais estamos a trabalhar. E na verdade já implementamos um autoatendimento em dois países que vamos continuar a desenvolver durante este ano, isto antes de entrarmos em pleno funcionamento em todos os países, espero que durante o próximo ano.
Durante o próximo ano alarga-se a todos os países?
Sim, durante o próximo ano. Então, o que estamos a fazer agora é remodelar toda a “paisagem”, a olhar para a forma como digitalizamos, isto é garantir que convertemos dados analógicos em dados digitais. E como digitalizamos, termos uma plataforma melhor, uma estrutura de alicerces em redor de tudo, mas também como trabalhamos com a adição de recursos de IA, para garantir que podemos entender melhor como abordar os clientes. Só para ter certeza de que podemos ter uma recuperação melhor dos seus créditos.
O que é uma melhor abordagem a um cliente com crédito?
Se vir bem, é mais uma chamada de incentivo [ao pagamento]. Se você tiver uma dívida que precisa pagar e nós enviamos um link em que pode clicar e entrar numa app ou num portal onde se pode sugerir a melhor forma como pode pagar a dívida que tem… Pode ser-lhe mais fácil fazer isso a qualquer momento, em vez de ser contactado e realmente ter de esperar por instruções da nossa parte.
Qual é a parte seguinte deste caminho, informar a pessoa antecipadamente, ou seja mitigar antes que a pessoa comece a ter problemas para pagar sua dívida? A IA pode começar a prever quando é que o cliente terá de fazer ajustes à sua vida para pagar o crédito?
Poderia ser isso também. E é por isso que também estamos a analisar a entrada em serviços de lembrete, a ajudar as empresas a realmente assumirem os seus processos de cobrança e lembretes aos clientes para pagarem. E então, obviamente, quando fazemos isso também podemos facilmente passar para o lado da coleta. Se o serviço de lembrete da empresa não der o resultado que queria ou não ter sido possível ao cliente pagar.
Não é um passo lógico que todas as instituições bancárias comecem a fazer exatamente o mesmo, usando IA exatamente da mesma maneira que vocês?
Mas então a questão passa a ser: qual é realmente o foco deles? E qual é o seu negócio principal? E seu negócio principal pode não ser lidar com as dificuldades relacionadas com um cliente que não paga. Talvez seja mais fácil para eles ter uma empresa especializada a lidar com isso. E também podemos ver certas tendências. Isto porque, obviamente, se você, como banco, está a começar a ter clientes que não estão a pagar, então você precisa de começar a questionar o valor dos seus empréstimos nos seus balanços. Talvez seja mais fácil contratar um prestador de serviços, como nós, para realmente fazer os pagamentos e eles não precisam de fazer um “write off” e pode seguir em frente.
Está a defender uma especialização…
Isso. Acho que também é uma questão de se especializar naquilo que se é bom, no seu core. E acho que veremos parte disso a concretizar-se ainda mais. E isso também ocorre do ponto de vista da empresa – quando olhamos para o B2B. Uma empresa deveria estar a trabalhar em serviços de lembrete ou deveria estar a garantir que vende os seus produtos ou serviços, que são a razão da sua existência? E depois tem uma empresa como nós a ajudá-los a recuperar o dinheiro que os clientes realmente lhes devem.
Se um banco tiver mais e mais pessoas a não pagar os créditos, se calhar tem de olhar para o seu departamento de gestão de risco, porque pode ter aí um problema…
Sim, o negócio dos bancos é gerir risco. É por isso que empresas como nós podem entrar e ajudá-las a gerir o risco. Temos muitos dados de consumidores, de anos e anos, que podemos analisar. Mais uma vez, podemos se há algum padrão nesses dados que nos possa ajudar a entender como resolver os problemas de forma precoce.
Consultoria de risco para bancos, graças à imensa base de dados que vocês têm e as vossas competências para descobrir padrões nos clientes.
Aí passa a ser uma questão de: vendemos [essa tecnologia ou informação] ou fazemos nós, que é que obviamente fazemos. E depois, obviamente, quando analisamos a forma como gerimos os dados, você devemos ter em consideração o RGPD (proteção dos dados).
Consegue ver essa tecnologia ou semelhantes a ser utilizada de forma alargada nos próximos anos?
Acho que sim. Acho que a maneira como a indústria está a abordar [a IA] o servicing de crédito será muito mais digitalizado, muito mais digitalizado do que é hoje. E está a avançar rapidamente.
E como vêm este sector em Portugal?
Quando entrou estávamos mesmo a discutir isso, em que níveis é que Portugal está. Quero dizer, se olharmos para os países escandinavos, já estamos digitalizados há muito tempo. Portanto, talvez lá seja mais fácil usar este tipo de portais de autoatendimento em que os clientes poderão pagar.A própria Intrum está a usar a IA para descobrir padrões de comportamento entre os seus clientes e a usar essa informação para lhes proporcionar um serviço mais adaptado, limitando as chamadas telefónicas e evitando – com isso – mais incumprimento.z