Após 10 anos de atividade no mercado da construção e engenharia portuguesa, a MAP encontra-se diversificada por todo o mercado imobiliário e onde tem atuado nos segmentos de construção e reabilitação para a classe alta, mas também no desenvolvimento e construção para a classe média.
Com uma faturação de 45 milhões de euros estimada para 2023 e uma carteira de projetos avaliada em 120 milhões de euros para os próximos dois anos, Diogo Abecasis, administrador da MAP Engenharia, traça em entrevista ao Jornal Económico (JE), um balanço dos primeiros 10 anos da empresa, as perspectivas para o próximo ano, bem como a análise do atual momento do sector da construção, onde cabem as medidas que deviam ter sido incorporadas no OE2024.
O responsável afasta um cenário de uma crise no sector imobiliário semelhante à que se viveu no passado, mas não deixa de alertar que medidas como o fim dos Residentes Não Habituais (RNH) e da não redução do IVA para 6% na construção nova vão "ter seguramente um impacto muito negativo na economia".
Que balanço dos primeiros 10 anos de atividade da MAP?
A MAP engenharia é uma empresa de construção que atua no mercado nacional praticamente direcionada para clientes particulares. Ou seja, construímos todo o tipo de edifícios, atuamos em todos os em todas as unidades de negócio, desde edifícios residenciais, edifícios de escritórios, edifícios de turísticos, comercial, de retalho, de logística, industriais. Atualmente estamos muito focados precisamente no mercado residencial porque sentimos que o mercado imobiliário também está preocupado e está a querer dar resposta a essa carência que existe de habitação.
Em que área têm sido mais requisitados e qual considera atualmente a mais desafiante?
Vamos trabalhando consoante as solicitações dos nossos clientes e com consoante as tendências do mercado imobiliário. Houve uma fase muito importante que tivemos um forte investimento em edifícios de escritórios, diria há meia dúzia de anos. Fizemos três, quatro projetos importantes do mercado de escritórios, um mercado que abrandou bastante depois da pandemia. Não vejo grande investimento em novos edifícios de escritórios, pelo contrário, até vejo edifícios em que estavam previstos fazer investimentos em escritórios e estão a transformá-los em edifícios residenciais.
É um sinal que ficou da pandemia?
É um sinal que ficou de pandemia e não me parece que tão cedo volte a existir um investimento em novos edifícios de escritórios. Há duas áreas que neste momento estão com maior força e que sempre fez parte do nosso core que é o mercado residencial e o mercado turístico. O mercado residencial teve uma transformação, começou a haver um forte investimento em mercados residencial, diria desde 2013, 2014 no pós crise de 2008, voltou em força com o mercado residencial mais ligado à reabilitação urbana, mais nos centros das cidades.
Para isso, obviamente contribui muito a questão do alojamento local que infelizmente terminou e também a questão dos vistos gold. Há cerca de dois anos os promotores imobiliários viraram completamente a agulha para a construção nova no mercado residencial e fora dos centros urbanos. Temos muitos projetos em curso de mercado residencial, de construção nova, na periferia da cidade, em áreas como a zona Alta de Lisboa, Loures e Marvila, essencialmente para a classe média.
No sector turístico também temos tido sempre uma presença muito forte. Estamos atualmente a construir a ampliação do ‘Sublime’ na Comporta num enorme projeto que é constituído por 43 moradias unifamiliares, um centro de eventos, um edifício Wellness Center Spa, uma praça central. Estamos a falar de uma obra de grandes dimensões que se desenvolve ao longo de 55 hectares.
Essa opção pela construção nas periferias e para a classe média é uma forma de responderem aquilo que o mercado pede, mas também pela concentração de procura nos centros urbanos?
Claramente. Acho que há duas grandes razões para este investimento neste tipo de projetos. Um claramente é para dar resposta a essa necessidade do mercado. Há uma carência de habitação em Portugal, e em Lisboa e no Porto ainda mais. No início dos anos 2000, quando a habitação teve um pico, construíam-se cerca de 130 mil casas novas por ano. Em 2022, construímos 22 mil casas novas.
O mercado sofreu muito com a crise, com a crise financeira de 2008, o mercado de habitação sofreu muito e obviamente que os promotores imobiliários estão atentos e querem dar resposta a essa necessidade do mercado. Verifica-se também outro motivo que é a burocracia dos processos de licenciamento, nomeadamente, vou falar agora aqui mais da Câmara de Lisboa e na Câmara do Porto que são câmaras com muito mais burocracia e em que os processos de licenciamento são muito mais morosos.
Houve promotores imobiliário que decidiram estrategicamente investir noutras autarquias e com isso, conseguem ter processos de licenciamento muito mais céleres e conseguem desenvolver os seus projetos de uma forma muito mais rápida como, por exemplo, em Loures em Odivelas em Almada, em Oeiras.
Olhando para a construção em si. Como foi o período de pandemia para a MAP?
Para a construção acabou por ser um enorme desafio. Seguramente que houve aqui algum abrandamento, mas conseguimos manter a nossa atividade e acabámos por ter um ano de 2020 bastante positivo. As consequências da pandemia e, posteriormente da guerra têm sido um dos nossos desafios atuais e tem sido verificado um aumento dos preços dos materiais, das matérias-primas e das energias.
Também se tem verificado ultimamente um enorme aumento do preço da mão-de-obra, quer da mão-de-obra qualificada, quer da mão-de-obra operacional. Tem sido um dos grandes desafios e problema que temos para resolver. É um facto que o preço médio da construção tem aumentado bastante nestes últimos dois anos.
Que balanço faz de 2023 e como perspetiva o sector imobiliário em 2024?
O ano de 2023 vai ser mais um ano positivo. Estamos a prever fechar o ano com uma faturação aproximada de 45 milhões de euros que se reflete num crescimento de cerca de 10% em relação ao ano anterior. Atualmente temos uma carteira contratada de cerca de 120 milhões de euros para desenvolvermos em 2024 e 2025. Ao dia de hoje, mesmo que não ganhássemos mais nenhuma obra já temos uma carteira para 2024 de 60 milhões de euros.
O segmento da reabilitação pode ser uma aposta para dar resposta a esta falta de oferta no mercado?
Com as medidas que estão a ser tomadas vejo os promotores imobiliários cada vez menos entusiasmados a investir na reabilitação urbana, inclusive obras que foram desenhadas e pensadas, por exemplo, para alojamento local em que a meio do caminho os nossos clientes e foram obrigados a mudar a utilização do edifício para em vez de ser meramente residencial para alojamento local tiveram que alterar o seu uso para apartamentos turísticos. Acho que a reabilitação vai existir sempre, mas com muito menor peso do que já existiu no passado.
Que análise faz ao OE2024?
Verificamos que é um Orçamento de Estado que não dá resposta às necessidades do sector imobiliário, do sector da construção e não dá resposta à necessidade dos portugueses, essencialmente porque não estimula a economia, não dá resposta à carência de habitação. A medida mais negativa de longe é o fim do regime dos residentes não habituais. É uma medida que vai ter seguramente um impacto muito negativo na economia.
Não só para os estrangeiros que querem vir residir ou investir em Portugal, mas também os para os emigrantes portugueses que tiveram necessidade de emigrar há uns anos, na sequência da crise financeira e que tinham um incentivo fiscal para regressar a Portugal, com uma isenção de 50% da tributação de impostos nos rendimentos.
Outra medida que não foi para a frente e que tinha sido muito discutida a previamente na apresentação do Orçamento de Estado, foi a questão da redução do IVA para 6% para construção nova. Pelo menos para habitação acho que tinha sido uma medida muito positiva e que iria seguramente fazer avançar vários projetos.
Voltaram a não existir à semelhança dos últimos anos deste Governo socialista a não existir quaisquer estímulos para as empresas. As empresas, mais uma vez, ficaram esquecidas e não há qualquer incentivo qualquer estímulo fiscal a uma redução do IRC não existe qualquer estímulo para dinamizar a economia e para as pequenas, médias empresas e para as grandes empresas.
Obviamente não vimos com bons olhos este Orçamento de Estado e o pacote ‘Mais Habitação, tudo espremido, verifica-se que não vai conseguir dar resposta às necessidades que existem para habitação. Dá uma imagem de instabilidade governativa e fiscal do nosso país. Existe um claramente um clima de desconfiança e isso é o pior que pode existir para investidores internacionais e fundos imobiliários.
Mas ainda assim estamos longe de poder perspetivar uma crise no sector?
Uma crise semelhante à que assistimos no passado, acho que estamos muito longe disso. Acredito que possa haver aqui algum arrefecimento no mercado. Existe capacidade de investimento e acho que o mercado vai continuar forte e em crescimento. Se os promotores com todas estas medidas negativas que estão a ser tomadas deixarem de investir e deixarem cair alguns projetos por terra, seguramente que este não é o caminho para o preço para das casas baixarem. O caminho era precisamente o inverso, era incentivar esses promotores e o investimento em grande escala no mercado residencial para criar um aumento bastante exponencial ma oferta e obviamente que naturalmente, aí sim teríamos uma redução do valor da habitação.
Em que situação fica a classe média portuguesa face a todas estas medidas?
Neste momento existe um forte investimento em habitação, apesar destas medidas que vão ser tomadas agora. Atualmente estamos a construir mais de 600 fogos. Se calhar a médio longo prazo a nossa oferta residencial será muito menor do que se fossem tomadas outras medidas. Infelizmente, o mercado imobiliário já está habituado a estas dificuldades, mas é um mercado muito resiliente.