Desafiando algumas previsões mais radicais, os líderes do G20, reunidos em Nova Deli, Índia, conseguiram ‘costurar’ uma declaração final consensual. Como o fizeram? Sendo necessariamente vaga, deixando de lado alguns problemas (como a guerra) e preferindo temas onde a convergência é mais simples, como o clima, a luta contra as alterações climáticas e a versão costumeira da justiça para o globo.
Narendra Modi, o anfitrião, anunciou que os líderes mundiais concordavam com uma declaração conjunta, Moscovo saudou-a pelo seu "equilíbrio" e só o Ministério das Relações Exteriores da Ucrânia a criticou por não mencionar a invasão da Rússia.
Nova Deli tem andado na corda bamba diplomática entre o Ocidente e sua tradicional aliada, a Rússia, e tem resistido aos esforços dos Estados Unidos para condenar a invasão. Nada que não se tivesse passado antes – mas desta vez com o acrescento de um facto incontornável: a ausência de Xi Jinping, o presidente chinês, que nunca tinha falhado uma cimeira do G20.
O facto de a cimeira ter lugar na Índia – país que mantém um diferendo com a China – ajudou à ausência, mas não chega para a explicar: Pequim observa a plataforma dos 20 com cada vez maior distanciamento face às suas opções estratégicas. E sabe que o G20 sem a China não será a mesma coisa.
Mesmo assim, houve outras vitórias geopolíticas. Uma delas foi a entrada da União Africana no G20 como membro de pleno direito. A sua admissão "sinaliza um passo muito positivo para o tipo de reformas que sempre defendemos em relação à reforma do Conselho de Segurança das Nações Unidas, a reforma de várias instituições financeiras multilaterais globais", disse Anrtónio Guterres, o secretário-geral da ONU que também viajou para a Índia.
A declaração de Nova Deli anunciou a criação de um Centro de Inovação de Hidrogénio Verde, a triplicação das energias renováveis até 2030 e a criação de uma aliança global de biocombustíveis.
No domingo, o ministro das Relações Exteriores da Rússia, Sergey Lavrov, que substitui Putin na cimeira, declarou que o encontro “foi um sucesso" e agradeceu aos países do Sul Global por manterem uma posição consolidada sobre a Ucrânia. Mas a maioria dos analistas optou por considerar a cimeira pouco criativa em termos da luta contra as alterações climáticas e omissa em relação às desigualdades económicas – que em ocasiões anteriores mereceu destaque especial.
A próxima cimeira do G20 será no Rio de Janeiro em novembro de 2024, com o presidente Luiz Inácio Lula da Silva a assumir a presidência. Nesse papel, o Brasil terá alguma influência na agenda. E pela primeira vez, a União Africana terá assento na cimeira, representando 55 países, incluindo alguns dos mais pobres do mundo. As posições políticas de Lula da Silva são bem conhecidas, o que leva alguns analistas a anteciparem que talvez as questões de desigualdade, da pobreza e da reforma das finanças globais sejam ‘empurradas’ para a agendo do próximo ano.